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Fim da utopia: França adota mudança de postura com grupos anticapitalistas

Governo francês era tradicionalmente tolerante com ocupações de movimentos de esquerda; campos de refugiados também vêm sendo desmantelados

Por Julia Braun e Solly Boussidan
Atualizado em 14 jun 2018, 10h49 - Publicado em 14 jun 2018, 10h48

A eleição de Emmanuel Macron para a Presidência francesa em 2017 deu ao país um líder carismático e midiático, colocando o país em maior evidência. No entanto, um lado menos evidente do novo Governo, especialmente no exterior, parece ser a decisão de eliminar acampamentos de manifestantes que tentam impedir novas construções “capitalistas” e que existem no país há anos, os chamados ZADs.

Operações de reintegração de posse de um dos principais acampamentos de ativistas em Notre-Dame-des-Landes, cerca de 20 km a noroeste de Nantes, na França, por exemplo, acabaram em violência nos últimos meses e são emblemáticas das novas diretrizes de Paris.

A ocupação conhecida como ZAD de Notre-Dame-des-Landes estava em vigor desde 2008, quando um eclético grupo formado por anticapitalistas, ativistas ecológicos, invasores e agricultores ocuparam uma área onde um novo aeroporto deveria ser construído. O projeto foi cancelado, mas mesmo assim, o Governo francês decidiu eliminar essa ZAD.

A primeira operação de evacuação aconteceu no último mês de abril. Participaram 2.500 policias na desocupação de 250 ativistas do local. Os agentes usaram bombas de gás lacrimogêneo e os manifestantes responderam jogando bombas de coquetel motolov, queimando pneus e construindo barricadas.

Em maio, uma segunda operação foi necessária. Os agentes invadiram o local antes das 6 horas da manhã do dia 18 de maio. Um helicóptero foi visto sobrevoando a área. Entre 1.500 e 1.700 agentes foram mobilizados para despejar uma dúzia de cabanas e casas de árvore.

Novamente houve violência e uso de gás lacrimogêneo. Uma pessoa ficou gravemente ferida.

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Nesta segunda-feira (12), uma última casa onde oito pessoas viviam foi desocupada e destruída, desobstruindo uma estrada na região.

Entendendo as ZADs

ZAD significa “zone à defendre”, ou zona à defender, em português. A sigla é usada para designar casos de ocupação militante com o objetivo de bloquear fisicamente novos empreendimentos e construções na França.

O caso mais conhecido destes tipos de acampamento era justamente o de Notre-Dame-des-Landes. O local ocupado seria utilizado para a construção do Aéroport du Grand Ouest, que deveria servir a região oeste da França.

O projeto do aeroporto começou há 50 anos e foi aprovado em 2008 com orçamento de 580 milhões de euros e sua construção deveria começar em 2014. O empreendimento, contudo, encontrou muita resistência de grupos políticos no país, como o partido que luta por causas ecológicas The Greens, além de membros do Partido Socialista. Os oponentes afirmavam que o projeto era muito caro, desnecessário e prejudicial para a fauna e flora da região.

Para impedir a construção, os “zadistas”, como ficaram conhecidos, invadiram o local e montaram um acampamento. A ocupação se desenvolveu tanto que, segundo o jornal britânico The Guardian, no final havia uma padaria que produzia pães com trigo e grãos cultivados no local, uma cervejaria, uma rádio pirada, um jornal online, uma feira semanal de vegetais e vários rebanhos de vacas, cabras e ovelhas. Todos os alimentos e bens produzidos ali eram compartilhados ou vendidos a preços acessíveis para os moradores.

Em janeiro deste ano, o presidente Emmanuel Macron ordenou o cancelamento do projeto de construção do aeroporto, que nunca havia sido iniciado. Apesar disso, anunciou a desocupação do local, pois os ativistas se recusavam a deixar o local.

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O grupo argumentava que havia desenvolvido um novo estilo de vida no acampamento, uma forma simples e utópica de sociedade.

Outras desocupações

O governo francês já vem lidando com críticas sobre a desocupação de acampamentos de refugiados e imigrantes.

Na semana passada, a polícia desmontou duas ocupações nos píeres dos canais Saint Martin e Porta de La Chapelle. Cerca de 1.000 pessoas viviam no local.

Esta foi a operação número 35 de evacuação de um campo de refugiados na capital francesa desde junho de 2015. No final de maio, o maior acampamento da cidade, com mais de 1.500 pessoas, foi esvaziado.

Os imigrantes do campo chamado de Millenaire, no nordeste de Paris, foram levados para vários centros de acomodação ao redor da capital. A mais famosa ocupação de imigrantes, chamada de “Jungle”, no porto de Calais, ao norte do país, foi desmantelada pelas autoridades no final de 2016.

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