Último Mês: Veja por apenas 4,00/mês
Continua após publicidade

Dugin, o guru do Kremlin, acumula seguidores no Brasil e já esteve no país

Chamado de 'Olavo de Carvalho russo', apesar de suas várias divergências, Dugin fala português, escuta MPB, foi a botecos no Rio e lê Ariano Suassuna

Por Amanda Péchy
23 ago 2022, 10h36

O nome de Alexander Dugin estampou manchetes ao redor do mundo após o atentado que matou sua filha, Darya Dugina, perto de Moscou na noite de sábado 20 – ataque que, segundo serviços de segurança russos, visava, na verdade, seu pai. No entanto, no Brasil, a figura está longe de ser desconhecida. Apontado como o “guru ideológico” do presidente Vladimir Putin, e comparado em influência ao brasileiro Olavo de Carvalho, Dugin tem ligações com o Brasil e um número notável de seguidores no país.

O filósofo e cientista político já viajou duas vezes para o Brasil, tendo fundado, inclusive, um centro de estudos em São Paulo em parceria com uma de suas seguidoras. Mais que isso, fala português, escuta MPB, bossa nova e consome literatura brasileira – seus favoritos são Vinícius de Morais e Ariano Suassuna.

A primeira vez que visitou o Brasil foi em 2012, quando participou de eventos em pelo menos quatro capitais e foi fotografado em um boteco do Rio de Janeiro e tomou chimarrão em Curitiba. Um ano antes, participou de um debate com sua versão brasileira, Olavo de Carvalho, que depois virou livro: “Os EUA e a nova ordem global”.

Uma de suas obras de referência, compartilha semelhanças com o pensamento do brasileiro, incluindo a aversão ao chamado “globalismo”, teoria ultranacionalista (que beira à conspiração) de que haveria uma espécie de complô de organizações supranacionais para subjugar o poder dos estados.

Continua após a publicidade

No entanto, os dois divergem em muitos pontos, como a posição da China na nova ordem mundial. O discurso anti-Pequim conhecido de Olavo – ainda mais evidenciado durante a pandemia da Covid-19 – bate de frente com a visão de Dugin de que a China é parte da construção de uma resposta aos Estados Unidos. Para o russo, a chamada “Nova Rota da Seda”, um dos pilares da diplomacia chinesa, seria um caminho para garantir a independência de Moscou e Pequim.

A segunda visita de Dugin ao Brasil ocorreu em 2014, quando atendeu um seminário sobre as ideias do filósofo Julius Evola (1898-1974), considerado um dos teóricos do neofascismo italiano. (Naquele mesmo ano, a Rússia invadiu a Crimeia, algo defendido pelo filósofo russo. Durante uma palestra, na Rússia, disse que os ucranianos “deveriam ser mortos”. Pouco depois, foi demitido da Universidade Estatal de Moscou.)

+ Quem matou a filha do mentor intelectual da política imperialista de Putin

Continua após a publicidade

Na época, o russo já tinha seguidores no Brasil e, com uma delas, a filósofa Flávia Virgínia, criou o Centro de Estudos da Multipolaridade, um think tank cuja ideia principal é que polos alternativos de poder para além do Ocidente são necessários.

O centro, atualmente, está desativado. Virginia, que é filha do cantor Djavan, tocou o projeto com a participação de alguns acadêmicos da Universidade de São Paulo em eventos até, pelo menos, 2019.

O trabalho que impulsionou Dugin à proeminência foi os “Fundamentos da Geopolítica”, de 1997, no qual ele expôs sua visão de um império eurasiano, estendendo-se de Dublin a Vladivostok. O livro defendia semear a instabilidade e a dissidência nos Estados Unidos – espécie de prévia da campanha de desinformação que manchou as eleições presidenciais de 2016 no país.

Continua após a publicidade

Em uma passagem, ele escreveu: “É especialmente importante introduzir desordem geopolítica na atividade interna americana, incentivando todos os tipos de separatismo e conflitos étnicos, sociais e raciais, apoiando ativamente todos os movimentos dissidentes – grupos extremistas, racistas e sectários, desestabilizando, assim, os processos políticos internos nos Estados Unidos”.

No Brasil, a quantidade de discípulos do russo não chega perto dos admiradores de Olavo de Carvalho, mas o duguinismo brasileiro é notável. Uma das principais organizações é a Nova Resistência (NR), criada em 2015 no Rio de Janeiro, que reúne cerca de 250 militantes em células espalhadas por 20 estados.

+ Rússia culpa oficial ucraniana por assassinato de filha do ‘guru’ de Putin

Continua após a publicidade

Em um post do NR sobre o atentado à filha de Dugin, um de seus membros, Felipe Quintas, escreveu: “Manifesto toda a minha solidariedade ao Dugin e sua família. Por mais que eles padeçam nesse momento, estão eternizados na contribuição decisiva que deram para um mundo liberto do imperialismo e do colonialismo.”

O centro dedica-se à propagação das ideias de Dugin e da sua “Quarta Teoria Política”, em que o filósofo defende uma alternativa às três ideologias que dominaram o século 20: liberalismo, comunismo e fascismo. Segundo a proposta, o sujeito principal da história não é o indivíduo ou o Estado, mas o povo em conjunto. A teoria se traduz no “eurasianismo” no contexto europeu – a expansão de Moscou para todas as regiões de influência histórica do “mundo russo”, mesmo as pertencentes a outros países, como a Ucrânia.

Outro expoente do duguinismo no Brasil é o movimento Frente Sol da Pátria, criado por dissidentes da NR. Na página de Facebook do grupo, o atentado contra Dugina também suscitou reações.

Continua após a publicidade

“Independentemente de quaisquer críticas justas que possam ser feitas a algumas de suas teorias e a seus posicionamentos mais recentes, as ideias de Dugin sobre a multipolaridade e a Quarta Teoria Política bem como sua crítica ao racismo ocidental têm influenciado acadêmicos, patriotas e revolucionários no mundo inteiro”, publicou o movimento.

Neste ano, no final de abril, também foi anunciada uma palestra de Alexander Dugin no Brasil, com a participação de membros da Escola Superior de Guerra (ESG). Com a guerra já a todo vapor, o evento foi cancelado depois, mas o filósofo acabou participando de uma live em em canal brasileiro, o Arte da Guerra.

+ Vlad, o conquistador: o que vai na cabeça de Putin para lançar guerra

Vindo de uma família de oficiais militares russos, Dugin foi de ideólogo marginal a líder de uma corrente proeminente de pensamento na Rússia, fundando o termo “o mundo russo”. Essa vertente de pensamento incorporou uma profunda aversão à identidade da Ucrânia fora da Rússia.

Dugin também ajudou a reviver a expressão Nova Rússia – que incluía territórios de partes da Ucrânia – antes da anexação russa da Crimeia em 2014. Putin, inclusive, usou a palavra ao declarar a Crimeia parte da Rússia em março daquele ano. O filósofo também trabalhou o conceito do “espaço pós-soviético”, que foi absorvido pelo presidente russo.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Veja e Vote.

A síntese sempre atualizada de tudo que acontece nas Eleições 2024.

OFERTA
VEJA E VOTE

Digital Veja e Vote
Digital Veja e Vote

Acesso ilimitado aos sites, apps, edições digitais e acervos de todas as marcas Abril

1 Mês por 4,00

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 12,50 por revista)

a partir de 49,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.