Como sistema antiterremoto de Taiwan poderia evitar desastres como o do RS
Chegou a 100 o número de mortos em decorrência das chuvas e enchentes no estado gaúcho, cenário que poderia ter sido parcialmente prevenido
Na primeira semana de abril, um poderoso terremoto atingiu Taiwan, ilha pouco maior que o estado de Alagoas aninhada no Oceano Pacífico. Com magnitude de 7,4, foi o tremor mais forte a chacoalhar o território asiático em 25 anos, mas provou que os taiwaneses estavam bem preparados para uma catástrofe sísmica. Foram dez mortos e cerca de mil feridos, a maioria sem gravidade – qualquer vida perdida é uma tragédia, mas poderia ter sido muito pior. Quase exatamente um mês depois, chuvas intensas atingiram o Rio Grande do Sul. O desastre no estado brasileiro provocou cenas apocalípticas, com enchentes que afetaram quase 1,5 milhões de pessoas. Nesta quarta-feira, 8, chegou a 100 o número de mortos em decorrência das chuvas, além de 372 feridos e 128 desaparecidos.
São dois eventos catastróficos muito diferentes, mas autoridades taiwanesas podem nos ensinar muito a respeito de sistemas bem-sucedidos de prevenção e resposta a desastres. Inclusive, elas vêm aplicando seus modelos em alguns países aliados – aquele punhado que reconhece a ilha como um país independente, e não como parte da China. Entre eles, estão a Guatemala e Belize, ambos na América Central, que também lidam frequentemente com inundações.
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Sistema antiterremoto
Não é por acaso que Taiwan driblou o que poderia ter sido uma catástrofe após o sismo de magnitude 7,4 no mês passado. Em primeiro lugar, a ilha utiliza um método robusto de alerta precoce. Embora terremotos não possam ser previstos, o território insular possui um sistema detecta tremores de solo que ocorrem na região do epicentro. Imediatamente, envia um alerta que viaja mais rápido do que a energia sísmica. O governo instalou estações sismológicas em toda a ilha para melhorar a detecção, além de ter intensificado a educação pública sobre segurança sísmica. No fatídico 3 de abril, isso provavelmente ganhou segundos cruciais para a população se proteger.
Além disso, os taiwaneses possuem leis de construção modernas, voltadas para abalos sísmicos. Após um devastador terremoto de magnitude 7,6 em 1999, que tomou a vida de 2,4 mil pessoas, a ilha melhorou significativamente grande parte da sua infraestrutura, além de revisar códigos de construção e aplicá-los com mais vigor. Os edifícios mais novos foram construídos com padrão ouro, enquanto os mais antigos foram reforçados.
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O que isso tem a ver com o Rio Grande do Sul?
O governo gaúcho foi criticado por não ter implementado mais medidas de segurança e prevenção após as chuvas que assolaram o Rio Grande do Sul em setembro e novembro do ano passado. Pode não ter havido tempo o suficiente para fazê-lo, mas o sistema antiterremoto taiwanês pode servir de inspiração para, por exemplo, a instalação de estações climáticas para detecção de chuvas, a construção de infraestruturas mais resilientes e a educação da população para lidar com enchentes.
Fora que Taiwan já exporta seus modelos inteligentes. Na Guatemala, o “Projeto de Sistema de Alerta Precoce e Gestão de Desastres” tem como objetivo evitar catástrofes ligadas a inundações no rio Cahabón, reduzindo em 30% o tempo de resposta das autoridades no departamento de Alta Verapaz. O plano inclui:
- Criar uma plataforma de alerta precoce para desastres contra enchentes e deslizamentos de terra;
- Estabelecer quatro comunidades de prevenção de desastres;
- Melhorar o sistema de monitoramento ambiental.
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“A cooperação com a Guatemala é ambiciosa, porque também prevê a prevenção de outros tipos de catástrofes, incluindo a redução de danos por terremotos e furacões”, disse a VEJA Julie Wu, chefe do departamento de assistência humanitária do Fundo Internacional de Cooperação e Desenvolvimento de Taiwan.
Em Belize, Taiwan anunciou em 2022 um projeto de US$ 1,6 milhões, chamado “Melhoria da Capacidade de Alerta de Inundações para a Bacia do Rio Belize”, parte de um programa mais amplo entre os aliados para prevenir desastres e ampliar a resiliência das cidades na nação centro-americana. O objetivo do plano é ampliar uma colaboração anterior, estabelecida em 2019, que resultou na melhoria da drenagem no distrito de Cayo, a produção de mapas atualizados de potencial de inundação, bem como a instalação de quatro estações hidrometeorológicas para obter dados sobre chuvas em tempo real.
Por enquanto, porém, uma cooperação Brasil-Taiwan ainda é muito difícil, se não impossível.
“A implementação de sistemas de prevenção e resposta a desastres é muito complexa, e requer o envolvimento de autoridades tanto a nível regional quanto nacional. Ou seja, por enquanto, só conseguimos realizar projetos do tipo em países aliados, que têm relações diplomáticas com Taiwan”, explicou Wu.
São apenas 11 as nações que tem laços oficiais com a ilha. Mas Wu ressalta: “Isso não significa que não podemos servir de inspiração para o resto do mundo.”