Acusado de tráfico de drogas, jornalista é libertado na Rússia
A defesa diz que foi perseguição política devido ao seu trabalho em expor casos de corrupção na esfera pública
O jornalista investigativo russo Ivan Golunov foi indiciado por tráfico de drogas pela polícia da Rússia na semana passada. Segundo as autoridades, Golunov foi preso com “grande quantidade” de drogas. Apoiadores do jornalista, porém, dizem que ele sofreu perseguição política. Nesta segunda-feira, 11, as acusações foram retiradas.
Golunov, repórter do veículo online independente Meduza, que tem sua sede na Letônia, foi detido na última quinta-feira, em Moscou. Segundo a polícia, no momento de sua detenção, no dia 6 de junho, carregava em sua mochila cinco envelopes de mefedrona, uma droga sintética.
Pavel Chikov, advogado de direitos humanos, exibiu um documento policial que mostra a acusação contra o jornalista por tentativa de vender uma “grande quantidade” de cocaína e de mefedrona. Se fosse considerado culpado, poderia ser condenado a uma dura pena de prisão.
Segundo a defesa, a prisão do jornalista é uma forma de represália por ele ter investigado esquemas de corrupção nas mais altas esferas políticas. Golunov publicou matérias investigativas sobre fraudes no setor de microcréditos e na gestão de coleta de lixo na capital russa.
Após a prisão, a polícia russa soltou uma nota dizendo que o jornalista foi internado após se sentir mal. “Tomou-se a decisão de enviar o detido para um estabelecimento médico para avaliação”, diz a nota, sem mais detalhes sobre sua condição de saúde.
Seu advogado, entretanto, havia escrito em um aplicativo de mensagens de texto que os médicos suspeitavam que seu cliente teve as costelas quebradas, contusões e traumatismo craniano.
Na sexta-feira, 7, Golunov informou ao representante do Conselho Presidencial dos Direitos da Rússia que foi agredido no momento de sua detenção. Segundo ele, os policiais lhe deram dois socos na cabeça e pressionaram seu peito com os pés.
No sábado ocorreu seu julgamento, que iria decidir pela manutenção da prisão ou pela absolvição.
Quando Golunov foi apresentado para ser julgado no tribunal, a diretora-geral do Meduza, Galina Timchenko, disse que o jornalista recebeu diversas ameaças.
“Ivan recebeu ameaças. Há dois meses elas se tornaram quase diárias”, denunciou Galina, acrescentando que não conseguiu convencê-lo a falar com a polícia.
“Diziam ‘vamos te enterrar para sempre'”, completou.
A sentença foi dada pela manutenção da prisão, porém, em regime domiciliar e pelo período de 2 meses, o que foi recebido com gritos de alegria por centenas de pessoas presentes no tribunal em Moscou.
Apoio da sociedade
Porém, mesmo com a pena sendo muito mais branda do que se esperava, nesta segunda-feira, 10, jornais independentes, meios de comunicação estatais e até mesmo alguns políticos de destaque, começaram um movimento de apoio ao jornalista.
“Eu sou, nós somos Ivan Golounov”. A manchete era a mesma para os jornais mais influentes do país, RBK, Vedomosti e Kommersant.
Nas matérias conjuntas, os jornais se manifestaram a favor de Golunov dizendo que as provas “fornecidas pelos investigadores não são convincentes e que as circunstâncias de sua prisão nos fazem pensar que ocorreu em violação da lei”.
O porta-voz do Kremlin Dmitri Peskov reagiu ao caso, afirmando que “acompanha atentamente” e reconhecendo que “este caso desperta muitas questões”.
Após a pressão da sociedade civil, jornais independentes, mídia estatal e políticos influentes, a Justiça russa decidiu retirar as acusações de tráfico de drogas contra o jornalista investigativo Ivan Golunov nesta terça-feira, 11.
“Golunov será solto hoje de sua prisão domiciliar, e as acusações serão retiradas”, disse o ministro do Interior, Vladimir Kolokoltsev, citado em um comunicado.
A Justiça terá agora de avaliar “a legalidade das ações dos policiais que prenderam” o jornalista na quinta-feira passada, em Moscou, e que disseram ter encontrado uma grande quantidade de drogas em sua mochila e durante uma busca em seu apartamento.
De acordo com Kolokoltsev, os policiais que fizeram a prisão foram suspensos de suas funções durante a investigação.
Ainda segundo a mesma fonte, duas autoridades policiais serão demitidas: o general da Polícia Andrei Puchkov, chefe das forças de ordem no distrito oeste da capital russa, e o general Yuri Deviatkin, chefe em Moscou do Departamento de Combate a Narcóticos.
“Vou pedir ao presidente russo”, Vladimir Putin, para removê-los do cargo, declarou Vladimir Kolokoltsev.
A decisão de retirar as acusações não tem precedentes na Rússia, onde os serviços de segurança e a polícia são acusados com frequência de fabricar casos de drogas para silenciar opositores e onde as absolvições são poucos frequentes.
“É uma grande notícia. É um exemplo inspirador e motivador do que a solidariedade pode fazer em favor de pessoas que são perseguidas”, comemorou o opositor Alexei Navalni, ele mesmo alvo de vários processos judiciais nos últimos anos.
A organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) saudou no Twitter uma “mobilização histórica da sociedade civil” na Rússia. “Agora, aqueles que tentaram montar esse caso devem ser julgados”, apontou.
(Com AFP)