À sombra de Trump, europeus fazem cúpula emergencial sobre plano de defesa de R$ 4,5 tri
Líderes se reúnem em Bruxelas para discutir como apoiar a Ucrânia e ter mais autonomia militar, em meio a ameaças de que não podem contar com os EUA

Mergulhados em uma nova era incerta de afastamento dos Estados Unidos, ameaças da Rússia e uma perspectiva cada vez mais incerta para a Ucrânia, líderes europeus se reuniram em Bruxelas para uma cúpula nesta quinta-feira, 6, para discutir garantias de segurança para os ucranianos e um plano de defesa de 800 bilhões de euros (quase R$ 4,5 trilhões) para o continente.
Eles precisarão caminhar uma linha tênue: descobrir como apoiar a Ucrânia e reforçar suas próprias defesas, evitando alienar ainda mais os Estados Unidos do presidente Donald Trump.
O chanceler alemão, Olaf Scholz, ao chegar em Bruxelas, afirmou que a reunião desta quinta é sobre garantir apoio contínuo à Ucrânia, mas também enfatizou a importância de manter boas relações com Washington. Prestes a ser substituído pelo vencedor das eleições no país, o direitista Friedrich Merz, acrescentou que a União Europeia precisa mudar suas regras sobre dívida e financiamento para aumentar gastos com defesa e garantir que possa enfrentar o desafio, mas mantendo um olho em “soluções de longo prazo”.
Entre outras coisas, espera-se que os líderes falem sobre um novo plano revelado na terça-feira por Ursula von der Leyen, chefe do ramo executivo da União Europeia. A proposta para “rearmar” a Europa criaria um programa de empréstimo de 150 bilhões de euros (R$ 931,8) para investimento em defesa, ao mesmo tempo em que tornaria as regras de orçamento do bloco mais flexíveis para permitir que os países gastem mais sem violar os rígidos freios de déficit. No total, as autoridades estimam que isso poderia ajudar a aumentar os gastos com segurança em até 800 bilhões de euros. “Estamos vivendo nos tempos mais importantes e perigosos”, disse von der Leyen.
Aliança transatlântica em crise
A reunião, mais recente de uma série de cúpulas convocadas em caráter emergencial com foco em defesa, inclui os chefes de Estado dos 27 países-membros da União Europeia. Na pauta, estão discussões sobre como financiar um aumento nos gastos militares europeus, na esperança de tornar o continente mais bem armado para lidar com a Rússia sem tanto apoio do outro lado do Atlântico. Eles também devem debater os contornos de um plano de paz para a Ucrânia e como podem apoiar o país de Volodymyr Zelensky, que perdeu Washington como corda salva-vidas após o retorno de Trump à Casa Branca.
De certa forma, o encontro marca o início de um novo capítulo para a União Europeia. Em Bruxelas, o primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, afirmou que este “é um dia em que tudo pode mudar e provavelmente mudará, no que diz respeito à determinação da Europa em se rearmar, à indústria de defesa e nossa prontidão para enfrentar o desafio russo ao mundo”.
Criado para promover a cooperação e a paz, o bloco está sendo forçado a rever seu papel em um mundo dilacerado por conflitos e animosidade, mesmo entre aliados. A questão urgente é se o grupo pode se adaptar rápido o suficiente para garantir que a Europa não fique para trás enquanto Trump vira a ordem mundial de cabeça para baixo.
Em menos de dois meses, o presidente americano mudou o jogo quando se trata de segurança na Europa. Ele exige um fim rápido (se não imediato) para a guerra na Ucrânia e incitou Zelensky a negociar, ensaiando uma humilhação pública durante encontro na Casa Branca e suspendendo a assistência militar a Kiev – além de abrir negociações com a Rússia sem envolver diretamente a União Europeia ou os ucranianos.
Ao mesmo tempo, insiste que as nações do velho continente invistam mais em sua própria defesa, atacando os membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) por “dependerem” dos Estados Unidos na área de segurança e contribuírem pouco com a aliança militar ocidental.
Garantias para a Ucrânia e dissuasão
O Reino Unido e a França indicaram a disposição de enviar soldados para compor uma força de manutenção da paz em solo ucraniano caso um acordo com a Rússia seja alcançado, mas é uma questão em aberto exatamente quantas nações podem se juntar ao que o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, chamou de “coalizão dos dispostos”. Também não é claro como a União Europeia apoiaria tal coalizão.
Na quarta-feira, o presidente francês, Emmanuel Macron, disse que falaria com aliados europeus sobre a possibilidade de usar a dissuasão nuclear de seu país para proteger o continente após as ameaças da Rússia.
Em um sinal de que a Europa parece estar se unindo mais, vários países que não estão no bloco — incluindo o Reino Unido, a Noruega e a Turquia — devem entrar em contado com oficiais da União Europeia após a reunião desta quinta. Ao mesmo tempo, há dissonâncias: Viktor Orban, o primeiro-ministro húngaro, tem sido vocal em seu apoio a Trump e em sua discordância com seus colegas europeus sobre a Ucrânia.
Convidado para o encontro, Zelensky, ao chegar em Bruxelas, agradeceu aos líderes europeus por seu “forte apoio”, que ele diz ter visto “desde o início da guerra”.
“Estamos muito gratos por não estarmos sozinhos. E essas não são apenas palavras. Nós sentimos isso”, afirmou a repórteres. “É muito importante que vocês [enviem] um sinal forte ao povo ucraniano, aos guerreiros ucranianos, aos civis, a todas as nossas famílias. E é ótimo que não estejamos sozinhos”, completou.
Sobre o fim da guerra, Scholz, da Alemanha, disse que “é muito importante que garantamos que a Ucrânia não tenha que aceitar uma paz ditada, mas que tenhamos uma paz justa e equitativa que garanta a soberania e a independência da Ucrânia”. Autoridades da União Europeia também têm discutido um novo pacote de assistência para Kiev, mas planos provavelmente não serão finalizados nesta quinta-feira.