A retaliação dos democratas contra o perdão de Biden ao filho Hunter
Decisão polêmica do presidente dos Estados Unidos, às vésperas de deixar o cargo, alimentou tensões dentro do partido

O perdão concedido pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, a seu filho, Hunter, trouxe à tona tensões dentro do Partido Democrata. O que muitos enxergaram como uma violação de um princípio ético virou alvo de retaliação, e agora diversos líderes da legenda expressaram intenção de boicotar doações para a futura biblioteca presidencial em Delaware.
O indulto presidencial, que anulou as condenações de Hunter por crimes fiscais e posse ilegal de arma, bem como efetivamente proibiu a investigação de quaisquer crimes cometidos por ele nos últimos 10 anos, foi criticada internamente, sendo vista como um gesto de nepotismo que compromete a credibilidade do partido.
Anteriormente, Biden havia dito com todas as letras que não estenderia um perdão ao próprio filho. O cálculo ocorreu em um momento em que Donald Trump, agora presidente eleito dos Estados Unidos, acusava o Departamento de Justiça de conduzir uma caça às bruxas contra sua pessoa. A ideia por trás do posicionamento da Casa Branca de Biden era mostrar que, já que o órgão investigava tanto Hunter quanto Trump, ele era independente. O indulto, segundo analistas, abriu caminho para uma maior desconfiança dos americanos em relação ao sistema de justiça.
O boicote à biblioteca em homenagem a Biden, que deve ser inaugurada no estado natal do presidente, virou símbolo da indignação entre membros do Partido Democrata com o giro de 180 graus da Casa Branca em relação ao indulto. Lideranças da legenda estariam considerando “descontar sua raiva” no projeto, de acordo com o portal de notícias americano Axios. Apesar disso, fontes ligadas ao planejamento minimizaram o impacto, afirmando que “o trabalho segue bem encaminhado”.
Perdão presidencial
O líder americano interveio no caso do filho após meses de resistência pública. Biden justificou a decisão dizendo que Hunter foi tratado de forma diferente pelos investigadores devido ao seu vício em álcool e drogas. Mas o perdão por todas as possíveis ofensas cometidas entre 2013 e 2024 – excluindo a possibilidade de o novo governo Trump reabrir um caso contra ele como forma de retaliação política – indica que a medida pode ter sido tomada no intuito de protegê-lo.
A controvérsia alcançou até aliados leais, como Chuck Schumer, líder democrata no Senado, que evitou defender o presidente abertamente. “Não tenho nada para vocês sobre isso”, disse ele a jornalistas.
O perdão presidencial intensificou as insatisfações no partido já abalado pelas derrotas eleitorais e pela relutância de Biden em desistir da campanha de reeleição (embora o tenha feito, eventualmente). Lideranças como a ex-presidente da Câmara Nancy Pelosi pensam que o fato dele ter deixado a corrida a apenas 105 dias do pleito prejudicou a construção de uma base sólida para a vice-presidente Kama Harris concorrer, além de retirar a possibilidade da realização de primárias para que os eleitores escolhessem qual candidato representaria o Partido Democrata na eleição presidencial.
As bibliotecas presidenciais, tradição iniciada por Franklin D. Roosevelt, são financiadas por doações privadas e parcerias locais, abrigando os arquivos dos presidentes. A questão agora é se a biblioteca de Biden conseguirá escapar da turbulência que domina seu legado político.