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A ordem é atacar: ao ocupar a Cidade de Gaza, Israel se distancia ainda mais da paz

Enquanto as negociações para uma trégua seguem emperradas, as chances de os reféns retornarem sabidamente diminuem

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 16 ago 2025, 08h00

Em meio ao clamor internacional por um cessar-fogo na castigada Faixa de Gaza, bandeira também agitada pela maioria da população em Israel, o governo capitaneado pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu enveredou por direção oposta, escalando um perigoso degrau no conflito que já se arrasta há quase dois anos. Ele anunciou que assumiria o controle da Cidade de Gaza, a mais densa do enclave palestino — plano que começou a executar na quarta 13, por via aérea e terrestre, com saldo de mais de 120 mortes em 24 horas. É ação de elevado grau de periculosidade, tanto assim que o próprio chefe do estado-­maior das Forças de Defesa de Israel (IDF), Eyal Zamir, publicamente rechaçou a ideia, alertando que a operação poderia manchar ainda mais a imagem do país e traria riscos adicionais aos reféns, nas mãos do Hamas desde 7 de outubro de 2023, quando o grupo terrorista empreendeu o bárbaro ataque que levou 1 200 pessoas à morte. Estima-se que, dos cinquenta que ainda não voltaram para casa, vinte estejam vivos — e em péssimas condições, conforme revelou vídeo que o próprio Hamas fez circular, exibindo um dos sequestrados visivelmente debilitado.

Enquanto as negociações para uma trégua seguem emperradas, as chances de os reféns retornarem sabidamente diminuem e a situação em Gaza, onde a fome se alastra, vai ganhando a cada dia contornos mais dramáticos. As tratativas para uma pausa no conflito não cessaram de todo — uns dias atrás, líderes do Hamas estiveram no Egito, o mediador nas conversas ao lado do Catar. Na ocasião, foi mais uma vez posta à mesa a necessidade de o grupo abrir mão do governo em Gaza e entregar suas armas em prol de um cessar-fogo duradouro. O Hamas até já sinalizou que deixaria o comando da estreita faixa de terra espremida entre o Mar Mediterrâneo e Israel, mas essa é só uma fração de um enrosco bem maior: não há plano concreto para o dia seguinte a uma eventual saída de cena israelense — esta, aliás, uma contenda à parte, já que Netanyahu fala em permanência do IDF em nacos do território que chama de “bolsões de resistência”. E isso o Hamas não aceita.

NA PRESSÃO - Netanyahu: alvo de críticas dentro e fora do país
NA PRESSÃO - Netanyahu: alvo de críticas dentro e fora do país (Ohad Zwigenberg/AFP)

Nos pontos que elencou para selar a trégua, Israel deixou claro que nem mesmo a Autoridade Palestina, à frente da Cisjordânia, sobre a qual vem avançando sob o repúdio da comunidade internacional, estaria habilitada para a missão. A sugestão é transferir a gestão de Gaza a “uma junta de países árabes”, proposta que frequentemente vem à tona, porém é ainda bastante vaga em um cenário que pede celeridade. Mesmo com a pressão interna e externa nas alturas, Netanyahu justifica sua estratégia dizendo que a tomada da Cidade de Gaza sufocará de vez o Hamas, o que contraria o que quase todos os observadores ressaltam: segundo eles, o grupo terrorista já está fraco o suficiente e varrê-lo 100% do mapa do Oriente Médio é uma ambição inexequível, dada sua capacidade de cooptar novos integrantes. O quadro atual, portanto, não exigiria mais bombas nem tanques, mas uma conversa objetiva na direção de um desfecho. “Erradicar o Hamas por meios militares é uma fantasia em nome da qual civis continuam a sofrer em Gaza. Falta a Israel um propósito estratégico”, avalia o cientista político Robert Pape, da Universidade de Chicago.

As reações à ofensiva de Israel foram instantâneas e tomadas de indignação. Entre seus maiores aliados, a Alemanha avisou que vai suspender a exportação de artefatos militares que possam vir a ser usados em Gaza. Também aumentou o número de países que externaram a intenção de reconhecer o Estado Palestino: França, Reino Unido, Canadá e Austrália podem se somar aos 147 que já o fizeram.

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As críticas ao governo Netanyahu subiram ainda mais de tom após a morte pelo IDF, no domingo 10, de quatro jornalistas da rede Al Jazeera, entre eles Anas al-Sharif, um correspondente de 28 anos que fazia frequentes aparições na TV, acusado por Israel de pertencer ao Hamas. Organizações independentes e a própria ONU categoricamente afirmam que ele não mantinha qualquer laço com a célula terrorista. Ao todo, 192 profissionais da imprensa morreram desde o início do conflito, segundo o Comitê para a Proteção dos Jornalistas, quase o triplo do registrado nas duas grandes guerras mundiais.

COMOÇÃO - Enterro de jornalistas: quase 200 já perderam a vida
COMOÇÃO - Enterro de jornalistas: quase 200 já perderam a vida (Mohammed Saber/EFE)

Repórteres estrangeiros não podem pisar em Gaza, o que limita o olhar sobre o que se passa por lá, mas não impede que o cenário de terra arrasada se projete mundo afora, com imagens de casas em ruínas — 90% delas estão severamente danificadas, obrigando uma imensa fatia da população a viver debaixo de tendas. A classificação IPC, o mais confiável termômetro sobre a fome, recentemente enfatizou que o enclave sofre “o pior cenário possível”, com rápido crescimento na curva da desnutrição e um de cada três moradores passando dias seguidos sem ingerir nada. Em março, Netanyahu rompeu um cessar-fogo, vetando ali o ingresso de medicamentos e comida. A promessa era destruir o Hamas e pôr fim à batalha. Ocorreu o contrário. O quadro piorou, com mais baixas humanas e o fim da possibilidade de um acordo a curto prazo.

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A tática dos bombardeios em série não tem servido para emparedar o Hamas e mudar as exigências do grupo para a devolução dos reféns, o que alimenta a revolta entre os israelenses, cada vez mais na oposição ao governo e prontos para ir às ruas protestar. Do lado de Gaza, os habitantes foram sendo deslocados até se concentrarem em um mínimo naco de 12% do território. Em entrevista, Netanyahu reiterou a ideia, abraçada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que os palestinos deveriam ir embora, posição vista como o prenúncio de uma limpeza étnica. “Todos os países que se preocupam com os palestinos e dizem que querem ajudá-los precisam abrir seus portões e parar de nos dar sermão”, disparou o isolado premiê, tentando passar a responsabilidade adiante. “A decisão de ocupar a Cidade de Gaza é uma aposta arriscada do ponto de vista político e humano e só vai botar mais combustível no conflito”, afirma Alex Plitsas, especialista do think tank Atlantic Council. É tudo o que as vítimas dessa guerra interminável não precisam.

Publicado em VEJA de 15 de agosto de 2025, edição nº 2957

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