Drinques famosos passam a ser vendidos em lata no Brasil
Isso sem a aura de elegância com a qual ingressaram na cultura etílica. Para surpresa geral, o resultado tem agradado
O afã de dar graça a bebidas alcoólicas misturando-as a outros ingredientes acompanha a história da humanidade desde os gregos. Mas o embrião da coquetelaria tal qual a conhecemos só começou a germinar mesmo no século XVIII, quando os americanos passaram a cultivar o hábito de bebericar licores como aperitivo. Abriu-se aí um mundo de experimentações, freado pela Lei Seca nos anos 1920, porém logo reanimado pelo icônico bloody mary e, mais tarde, pelo dry martini, que encontrou nas mãos do James Bond de Sean Connery um charme todo especial. A partir da frenética década de 80, contudo, os drinques ficaram circunscritos à velha guarda — até que, nos anos 2000, entrou em cena o mixologista, profissional que junta o mais improvável em uma taça (e dá certo). Pois esse universo está sendo sacudido por uma nova onda que faz torcer o nariz dos mais puristas: a dos drinques na latinha.
Coquetéis prontos para o consumo embalados em lata de alumínio são comuns nos Estados Unidos e na Europa, mas só de um ano para cá vêm sendo assimilados pela cultura etílica brasileira. Essas versões ganham espaço em festas ao ar livre e na praia, lugares onde o vidro não orna tão bem, e se alastram especialmente na faixa dos 25 aos 40 anos, estimuladas pelo preço: os drinques enlatados custam em média metade do valor cobrado no bar. “São bebidas que pouca gente sabe fazer, daí a alta procura”, diz Ricardo Petrus, o autor das criações da gaúcha Le Mule, uma das empresas desse mercado em franca expansão: deverá responder por 10% de todos os líquidos vendidos em lata no país até o fim de 2020.
O frescor, evidentemente, se perde em certa medida, mas a qualidade da bebida é preservada graças ao avanço da embalagem laminada, feita para não oxidar. Também os ingredientes podem não ser aquilo que parecem ao primeiro gole. A Ambev, por exemplo, entrou no jogo com o GT, um gim-tônica de sabor puxado para a carambola que não leva nem gim nem tônica, mas álcool de cereais e aromatizantes. “A tecnologia nos permite reproduzir sabores cada vez mais próximos dos originais”, avalia o mixologista carioca Michell Agues. Ele e outros mestres da coquetelaria dão uma dica para que a magia seja preservada: entornar o drinque na taça, enfeitar com uma rodela de limão e tim-tim.
Publicado em VEJA de 25 de março de 2020, edição nº 2679