Personalidade e refinamento: como Rodrygo virou o xodó de Tite na Copa
Treinador se derrete em elogios ao jovem revelado pelo Santos, o mais habilitado a cumprir as funções de Neymar; hoje o "Rayo" será titular contra Camarões
DOHA – “A bola fala, o campo fala. Alguém de vocês entendia que o Rodrygo pudesse ser tão utilizado quanto foi?” Foi assim, em puro “Titês”, que o técnico da seleção brasileira explicou como o atacante de 21 anos passou em poucas semanas de nome incerto na convocação a uma espécie de 12º jogador do Brasil na Copa do Mundo. Depois de entrar bem no segundo tempo das vitórias contra Sérvia e Suíça, Rodrygo iniciará nesta sexta-feira, 2, a partir das 16h (de Brasília), o duelo com Camarões, no Lusail. Com a equipe classificada, Tite quer descansar titulares e dar ritmo aos reservas. No caso do atacante do Real Madrid, pode ser uma senha para não sair mais do time.
Durante suas entrevistas no Catar, Tite tem citado Rodrygo espontaneamente. “A bola parece que cola no pé dele. Ele vai correndo e reprogramando a jogada no meio do caminho, é impressionante”, disse, depois da estreia contra a Sérvia, na qual o garoto atuou por 25 minutos com a desenvoltura de um veterano. Contra a Suíça, entrou no intervalo e foi ainda melhor. A personalidade forte, de quem não sente diferença entre um jogo de Estadual, Champions League ou Copa do Mundo, e a extrema qualidade técnica são as marcas do atacante revelado pelo Santos.
Rodrygo Silva de Goes nasceu em 9 de janeiro de 2001, em Osasco (SP), curiosamente a cidade com mais representantes na seleção de 2022. Se destacou ainda criança no time de futsal do São Paulo e chegou ao Santos aos 11 anos. Aos 16, já foi promovido ao time profissional por outro ídolo santista, Elano, então técnico interino. Tão logo foi vendido por 45 milhões de reais ao Real Madrid, chegou à seleção, e o resto é história.
O “Rayo”, como é apelidado desde a adolescência — uma brincadeira com a letra Y de seu nome e a ideia de ser mais um raio a cair na Vila Belmiro, depois de Pelé, Robinho, Neymar e companhia —, é apontado internamente na CBF como o mais refinado, o “mais craque”, da nova geração. Na segunda partida contra a Suíça, essa classe foi especialmente exibida na assistência de primeira para o gol de Casemiro que garantiu o triunfo por 1 a 0. “São poucos jogadores que têm esse dom que Deus deu de jogar futebol. Sempre que o Rodrygo toca na bola acontece alguma coisa bonita, é bonito de assistir”, afirmou o próprio Casemiro, seu ex-colega de Real Madrid e um dos líderes da seleção.
O fato de ser um jogador versátil, que pode atuar tanto nas duas pontas como mais centralizado, um meia ou “falso 9”, que organiza as jogadas e entra na área para definir, também pesa a seu favor. É justamente de um jogador assim que Tite precisava para suprir a ausência de Neymar, que sofreu lesão no tornozelo e pode demorar a retornar. “Se eu puder fazer metade do que o Neymar faz já vai estar de bom tamanho. Ele é o nosso melhor jogador. Como falei sempre, não quero me comparar a ele, mas se me cabe fazer essa função espero fazer da melhor forma”, afirmou Rodrygo, que sempre teve Neymar como ídolo, fato comprovado por fotos de infância nos corredores da Vila Belmiro.
Se demonstra cautela nas comparações com Neymar, Rodrygo sempre esbanjou confiança em seu futebol, tanto no campo quanto fora. Meses antes do Mundial, o jovem participou de diversas entrevistas em podcasts e canais tradicionais e sempre tratou de sua presença na Copa do Mundo como algo concreto, ainda que enfrentasse forte concorrência. “Jogo no maior clube do mundo, decidi jogos lá, então pelo momento que estou vivendo acho que tenho muita chance sim”, disse no canal PodPah, em junho. Na mesma entrevista, contou uma profecia que ouviu de seus lendários treinadores na Espanha. “Zidane disse que um dia eu vou ser o melhor do mundo. O Ancelotti também.”
Rodrygo tinha apenas seis jogos pela seleção antes do Mundial, mas começou a virar presença obrigatória depois de brilhar na conquista da 14ª taça da Liga dos Campeões pelo Real Madrid. Na semifinal, ele entrou no fim da partida contra o poderoso Manchester City, de Pep Guardiola, e marcou dois gols nos acréscimos que levaram o duelo para a prorrogação no Santiago Bernabéu. A partir daí, passou a ser visto como uma estrela emergente do futebol europeu e, para entrar na lista de 26, venceu a concorrência de Roberto Firmino, do Liverpool, jogador com características semelhantes e mais experiência, aos 30 anos.
Rodrygo curte, portanto, sua meteórica ascensão e nesta tarde tem mais uma chance no Estádio Lusail, o palco da final, para convencer Tite de que pode fazer parte do time inicial. Sua história no Mundial faz lembrar a de jovens campeões que se tornaram talismãs da seleção. Em 1962, aos 22 anos, o atacante Amarildo entrou na vaga do lesionado Pelé e foi importantíssimo na conquista do bi no Chile. Já no penta, em 2002, foi Kleberson, de 23, quem entrou na vaga de Juninho e não saiu mais do time de Felipão.
O Brasil precisa de apenas um empate para garantir o primeiro lugar do Grupo G. Nesse caso, enfrentaria nas oitavas, no dia 5, o segundo colocado do Grupo H, que tem Portugal, Gana, Uruguai e Coreia do Sul, que será definido também nesta sexta. Com o empate conquistado contra a Sérvia, Camarões encara o Brasil ainda com chances de classificação, mas para isso precisa de uma vitória.
Prováveis escalações:
Brasil: Ederson; Daniel Alves, Militão, Bremer e Alex Telles; Fabinho, Fred e Rodrygo; Antony, Gabriel Jesus e Martinelli.
Camarões: Epassy, Fai, Castelletto, N’Koulou e Tolo; Hongla, Anguissa e Kunde; Mbeumo (Aboubakar), Choupo-Moting e Ekambi.