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Luis Enrique, o excêntrico ‘técnico-streamer’ da seleção espanhola

Técnico inovou ao divertir seguidores em transmissões ao vivo e "sem filtro" na Twitch durante o Mundial. No contato com a imprensa, o bom humor diminui

Por Mariáh Magalhães e Luiz Felipe Castro
Atualizado em 5 dez 2022, 10h58 - Publicado em 5 dez 2022, 10h46

DOHA – Os mais antigos diriam que o técnico da Espanha, Luis Enrique, é uma pessoa “prafrentex”. Sim, o ex-atacante de 52 anos sempre mira adiante, inclusive no que diz respeito ao estilo de jogo ofensivo do time, mas é por outra faceta que vem chamando a atenção na Copa do Mundo do Catar. Desde o início do Mundial, ele tem promovido lives diárias na plataforma de streaming Twitch com o intuito de “estar mais próximo do torcedor”, segundo ele mesmo. É ali onde Luis Enrique exibe seu humor ácido e autenticidade.

Os números impressionam tanto quando a goleada por 7 a 0 na estreia diante da Costa Rica: o canal de Luis Enrique já acumula mais de 800.000 seguidores e atingiu mais de 1 milhão de visualizações na estreia do canal. “É muita gente! Ou vocês não tem nada para fazer, o que acho ótimo, ou estão mesmo interessados na seleção”, disse ele em tom de piada durante sua primeira transmissão.

Apesar de ser ele quem comanda as lives, o treinador conta com uma ajudinha por trás da tela e da câmera do computador. Os funcionários da federação espanhola de futebol selecionam as perguntas e leem as mensagens dos torcedores, que chegam a lotar o chat, com cerca de dez mensagens por segundo. “Eu tento ler o que vocês escrevem, mas esse chat vai mais rápido que o Nico Williams”, brincou o técnico referindo-se a velocidade de seu jogador, que atua pelo Athletic Bilbao.

Apesar do ambiente das lives ser mais comum a pessoas mais jovens, o espanhol se mostra bem à vontade quando está ao vivo e se sai muito bem frente aos questionamentos. Sem formalidade alguma, tira dúvidas e dá detalhes relacionados aos jogos, treinamentos e do dia a dia dos atletas da seleção espanhola. Ele já contou por exemplo, sobre sua paixão pela Copa do Mundo e que, na concentração, os jogadores assistem junto com a comissão técnica a todas as partidas, com direito a bolão de apostas.

Luis Enrique já ganhou um título de Liga dos Campeões como treinador -
Ex-jogador do Barcelona, também já ganhou um título de Liga dos Campeões como treinador do clube – (Javier Soriano/AFP)
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“Quando eu era jogador, eu sempre organizava o bolão da Copa. É legal, porque todo mundo assiste aos jogos juntos, ficamos torcendo pelos resultados. Na Eurocopa, quem venceu foi o Pablo, da equipe de segurança”, contou Luis Enrique, que foi um jogador igualmente excêntrico. Ele protagonizou uma das cenas mais recordadas da Copa de 1994, ao sair ensaguentado depois de receber uma cotovelada do italiano Mauro Tassotti, ignorada pelas câmeras. Dois anos depois, ele chocou a Espanha ao trocar o Real Madrid pelo eterno rival Barcelona, pelo qual brilhou também como técnico na conquista da Liga dos Campeões de 2015.

Luis Enrique não escapou de gafes, como quando tratou a Costa Rica, país da América Central, como uma “boa seleção sul-americana”. O treinador divertiu seus seguidores ao comentar o namoro de sua filha, Sira, com Ferrán Torres, um dos 26 convocados da Espanha para jogar no Catar. Um fã perguntou sobre qual jogador era o representante do treinador em campo. “Ferrán Tores, claro. Se falar outro, a minha filha me bate”. Em outro momento, ele contou o que faria caso o atacante comemorasse seus gols com gesto de chupeta, como quem vai ser pai. “Eu me alegraria demais com um gol dele. Mas, se ele fizer esse gesto, o mandaria embora e não volta a pisar no gramado.”

 

Os momentos de descontração com os fãs aliviam um coração machucado por um enorme drama familiar. Em 2019, o ex-técnico do Barça perdeu a filha Xana, de apenas nove anos, morta vítima de um osteosarcoma, um câncer ósseo maligno. A garota passou por um tratamento de cinco meses, mas não resistiu. Na época, já no comando da seleção da Espanha, o técnico ficou afastado dos trabalhos por um tempo para poder acompanhar a filha durante o tratamento.

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Luis Henrique disputou as Copas de 1994, 1998 e 2002 como atleta está no comando da seleção desde 2018 -
Luis Enrique disputou as Copas de 1994, 1998 e 2002 como atleta está no comando da seleção desde 2018 – (Javier Soriano/AFP)

No Catar, Luis Enrique prestou uma homenagem à filha por meio de uma publicação em uma rede social horas antes do empate em 1 a 1 com a Alemanha, pela segunda rodada da fase de grupos do Mundial. Enquanto andava de bicicleta, ele gravou um vídeo recordando que aquele seria o dia do 13º aniversário de Xana. “Já estamos no 14º dia de concentração. Hoje não apenas enfrentamos a Alemanha, como também é um dia muito especial, porque Xanita faria 13 anos. Amor, onde quer que esteja, tenha um bom dia, muitos beijos. Nós te amamos! Tchau”, disse emocionado.

Luis Enrique, o excêntrico ‘técnico-streamer’ da seleção espanhola
Luis Enrique e sua filha Xana comemorando o título do Barcelona pela Champions League, em 2015 – Ina Fassbender/AFP ()
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Menos humor com a imprensa

Se na rede social, onde o ambiente é mais controlado e as perguntas selecionadas, Luis Enrique esbanja bom humor, fora dela é conhecido também por dar respostas atravessadas aos jornalistas. Nesta segunda-feira, 5, véspera do duelo contra Marrocos pelas oitavas de final, Luis Enrique se irritou com perguntas relacionadas à surpreendente derrota para o Japão que por pouco não eliminou a Espanha. Questionado sobre por que sua equipe não dava chutões (o primeiro gol japonês se originou de uma jogada errada), o técnico foi duro.

“Vejo que já muita desinformação no mundo do futebol. Nós temos o objetivo de levar a bola ao ataque em melhores condições. O jogador escolhe, se tem que dar um chutão, ele dá. Tudo está permitido, mas eu compro o pacote completo. Vamos a jogar igual, como sempre, não vamos mudar.”

Em outro momento, questionado se sua equipe demora a assimilar golpes, como a virada japonesa, se irritou ainda mais. “Outro grande assunto. A resposta é simples. Você se refere a dez minutos, fomos inferiores em dez minutos de quase 300 que jogamos. Não jogamos sozinhos. Eu foco no lado positivo, já vocês no negativo.”

Um dia antes, em seu canal na Twitch, o treinador havia sido mais específico sobre seu estilo, do qual não abre mão. “Há 50.000 ou 100.000 pessoas te vendo no estádio. Em casa, milhões de pessoas. É como ir ver uma peça de teatro, se esta for chata, no final não haverá ninguém no teatro . Neste Mundial, vemos times que só atacam quando já está perdido. Eu vejo o jogo de outra maneira, penso em mostrar às pessoas a vontade de jogar um bom jogo.” Espanha e Marrocos jogam na terça-feira, 6, a partir das 12h (de Brasília), no estádio City Education.

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