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‘Electric Dreams’: quando ‘Black Mirror’ encontra Philip K. Dick

Adaptações de contos do autor de ‘Blade Runner’ chegam ao Brasil pela Amazon

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Meire Kusumoto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 12 jan 2018, 14h32 - Publicado em 12 jan 2018, 12h22

Philip K. Dick é conhecido como o autor de Blade Runner ou de Minority Report, dois filmes inspirados em obras assinadas por ele. O escritor americano, contudo, é mais, bem mais, do que a dupla de títulos citada. Prolífico, criativo e transtornado, K. Dick criou uma grande quantidade de mundos, personagens e desfechos, difíceis de serem listados. Falou sobre realidades paralelas, viagens no tempo (e entre planetas), consumismo, paranoias de guerra e tecnologias inimagináveis entre os anos 1950 e 70, quando atingiu seu auge na escrita.

Tamanha variedade foi abraçada pela série Philip K. Dick’s Electric Dreams, que chega ao Brasil nesta sexta-feira pelo serviço de streaming Amazon Prime Video. Em formato antológico, em que os episódios são independentes entre si, o seriado adapta dez contos do autor, em tramas de 50 minutos de duração cada.

Um time de atores, diretores e roteiristas de peso foi convocado pela produção, que teve total liberdade na adaptação dos textos do escritor, atualizando algumas tramas ou viajando na “moral da história”. Estão no elenco nomes como Bryan Cranston (Breaking Bad), Timothy Spall (Harry Potter), Greg Kinnear (Pequena Miss Sunshine), Liam Cunningham (Game of Thrones), Anna Paquin (X-Men), entre outros.

E sim, é difícil não comparar Electric Dreams com Black Mirror, da concorrente Netflix. Além do formato parecido e de temáticas futuristas, os seriados dividem entre si o nascimento – ambos foram concebidos inicialmente pelo canal britânico Channel 4 antes de encontrarem um lar no streaming. Na série inspirada em K. Dick, contudo, os roteiros dos episódios são mais irregulares do que o programa tecnológico da Netflix. Em contrapartida, Electric Dreams se diverte sem amarras na vasta e interessante imaginação do autor.

A seguir, VEJA apresenta os episódios e propõe comparações com outros títulos da ficção científica. Confira:

 

Real Life

Anna Paquin
Anna Paquin na série ‘Electric Dreams’ (//Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Black Mirror, Minority Report, A Origem e Vanilla Sky 

A vida real e o mundo virtual se confundem no episódio estrelado por Anna Paquin (de X-Men e True Blood), Terrence Howard (Empire) e Rachelle Lefevre (Saga Crepúsculo). Após um trauma, a policial Sarah (Anna) ganha da esposa (Rachelle) um dispositivo de realidade virtual para tirar férias de sua vida durante algumas horas por noite. Do outro lado, ela é George (Terrence), um empresário que lida com o luto da perda da mulher (também vivida por Rachelle). Começa então a dúvida: qual dos dois mundos é o verdadeiro e qual é simulação? A trama é inspirada no conto Exhibit Piece, de 1954, em que George é um homem que transita entre duas vidas, uma no passado e outra no futuro. Confuso, ele precisa decidir qual dos dois tempos é o real, para se estabelecer.

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Autofac 

Janelle Monáe na série ‘Electric Dreams’ (Amazon/Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Westworld, Blade Runner, Ex Machina: Instinto Artificial e Mad Max

Após uma guerra que destruiu quase todo o mundo como conhecemos, um grupo de pessoas tenta resistir contra uma grande fábrica que é operada apenas por máquinas e que envia produtos constantemente à população, mesmo que ela não queira ou não precise deles. Preocupados com o consumismo e a poluição causada pela fábrica, os ativistas armam um plano para acabar com o lugar, mas antes precisam lidar com o androide Alice (Janelle Monáe, de Estrelas Além do Tempo e Moonlight: Sob a Luz do Luar), porta-voz da empresa. A premissa é bastante parecida com a história criada pelo escritor em 1955, mas o final vai por um caminho novo, explorando mais a questão robótica e o que significa ser humano.

 

Human Is 

Philip K. Dick’s Electric Dreams
Bryan Cranston e Essie Davis na série ‘Electric Dreams’ (//Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Interestelar, A Chegada e Star Trek

Em 2520, quando o planeta oferece cada vez menos condições para a sobrevivência humana, Silas (Bryan Cranston, de Breaking Bad) é um militar de alta patente muito competente em seu trabalho como líder de missões pela galáxia na busca por suprimentos. Em casa, porém, é rude e abusivo com a mulher, Vera (Essie Davis, de O Babadook e Assassin’s Creed). Silas parte em uma missão para obter hidrogênio em outro planeta e, quando volta, como um dos únicos sobreviventes após um ataque sofrido por sua nave, está completamente diferente: torna-se gentil, dedicado e amoroso com a mulher, que estranha o comportamento do marido. A história contada no episódio é muito parecida com aquela idealizada por Philip K. Dick em 1955, com apenas alguns detalhes diferentes – no conto, o militar volta para casa empregando uma linguagem arcaica para falar e o final é um pouco mais simples.

 

Crazy Diamond

CRAZY DIAMOND EPISODE 105
Steve Buscemi e Julia Davis na série ‘Electric Dreams’ (//Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Westworld, O Preço do Amanhã, Ela e O Show de Truman

Em um futuro bastante organizado, os humanos enfrentam adversidades juntamente com avanços tecnológicos variados. Os continentes sofrem com constantes erosões, que impedem a agricultura e causam devastação, derrubando vilas inteiras mar adentro. Mulheres lidam com problemas de fertilidade. E manipulações genéticas são capazes de criar seres híbridos, entre eles, humanos sintéticos, apelidados de Jack (homens) e Jill (mulheres), que, assim como os androides de Blade Runner, possuem prazo de validade. Ed Morris (Steve Buscemi, de Cães de Aluguel) e a esposa Sally (Julia Davis, de Nighty Night) vivem neste cenário, enquanto ele almeja entrar em seu barco e viver no mar. Tudo muda com a chegada de uma Jill (Sidse Babett Knudsen, de Westworld), que precisa de ajuda. Pouco restou do conto original de 1954, Sales Pitch, na melancólica trama da TV. Na literatura, Morris e Sally vivem em um mundo com viagens interplanetárias tomadas por propagandas invasivas. Ele sonha em se mudar para outro planeta, menos habitado, para viver em paz.

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The Hood Maker 

Holliday Grainger e Richard Madden em 'Electric Dreams'
Holliday Grainger e Richard Madden em ‘Electric Dreams’ (Amazon)

Episódio sugerido para fãs de: X-Men, Heroes, O Exterminador do Futuro e Blade Runner

O episódio se passa em um futuro distópico em que os computadores já não existem mais e a tecnologia, em vez de avançar, parece ter regredido. Para controlar a parcela da população que se levanta contra o governo totalitário e suas medidas que ameaçam a privacidade, a polícia recruta mutantes que são capazes de ler a mente das pessoas – e portanto, determinar quem são os insurgentes. O agente Ross (Richard Madden, de Game of Thrones) trabalha junto com a mutante Honor (Holliday Grainger, de The Borgias), mas as coisas começam a ficar complicadas quando eles veem circulando na cidade uma touca capaz de bloquear a leitura dos pensamentos. No conto original de 1955, a história é contada pela perspectiva de outro personagem e o tom é diferente – na trama de Philip K. Dick, há menos sutileza em relação a quem é o mocinho e quem é o vilão da história.

 

Safe and Sound

Episode #8 Safe & Sound
Maura Tierney e Annalise Basso no episódio ‘Safe and Sound’, da série ‘Electric Dreams’ (Amazon/Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Jogos Vorazes, 1984, Ela e Gattaca

No conto satírico Foster, You’re Dead! (1955), pai e filho lidam com a paranoia do início da Guerra Fria, imaginando um futuro em que todo americano teria o próprio abrigo antibomba. Após muita insistência do adolescente, eles compram um e, em seguida, descobrem que o modelo está desatualizado — já que a União Soviética criou bombas que podem destruí-lo. Na adaptação para a TV, o medo é voltado para ataques terroristas, que seriam promovidos entre os próprios cidadãos americanos em um rearranjo geográfico. Uma capital, fechada e superprotegida, vive em função de ter medo do que existe fora de seus limites, estados chamados de bolhas. É neste cenário que entra Foster Lee (Annalise Basso, de Capitão Fantástico), uma adolescente que vai passar um tempo na capital com a mãe e coloca em xeque tudo que sabe até então.

 

Father Thing

EPISODE 102
Greg Kinnear na série ‘Electric Dreams’ (Amazon/Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Stranger Things, ET, Alien e Super 8

Um dos episódios mais fiéis ao conto original, de 1954, a trama acompanha as tensões entre pai e filho apimentadas, por assim dizer, por um ingrediente extraterrestre. Charlie (Jack Gore, de Roda Gigante) tem um bom relacionamento com o pai, vivido por Greg Kinnear (de Pequena Missa Sunshine). Tudo muda quando ele testemunha uma possessão do progenitor por um ser misterioso. Logo, Charlie percebe que o homem em casa não é mais seu pai e ele tenta, com dificuldade, salvar sua mãe (Mireille Enos, de Guerra Mundial Z).

 

Impossible Planet

Impossible Planet
Jack Reynor e Geraldine Chaplin na série ‘Electric Dreams’ (//Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Battlestar Galactica, Doctor Who e Star Trek

No ano de 2673, o planeta Terra implodiu. Duzentos anos antes, já não era habitado. Sendo assim, a dupla de guias turísticos interstelares Andrews (Benedict Wong, de Doutor Estranho) e Norton (Jack Reynor, de Transformers: A Era da Extinção) fica espantada com o pedido de Irma (Geraldine Chaplin, de O Orfanato). A mulher de mais de 300 anos quer conhecer o planeta natal de seus antepassados antes de morrer. Acompanhada de um robô, ela oferece uma grande quantia em dinheiro aos guias, que, apesar de saberem que a Terra não existe mais, aceitam o pagamento e a levam a um planeta parecido. Bem próximo do conto de 1953, o roteiro da trama, que apostou em uma estética exagerada na TV, fala sobre raízes, envelhecer e a passagem para morte – ou um novo recomeço. O final surpreende.

 

Commuter

Timothy Spall
Timothy Spall na série ‘Electric Dreams’ (//Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Melancolia, Efeito Borboleta, A Casa do Lago e Doctor Who

Um dos melhores episódios da série, Commuter acompanha a vida ordinária de Ed Jacobson (Timothy Spall, Harry Potter), funcionário da estação de trem que, em casa, lida com o filho violento Sam (Anthony Boyle, de Z: A Cidade Perdida). Certo dia uma mulher pede passagem para uma estação que não existe. A personagem misteriosa desaparece do nada, para voltar em outra ocasião e continuar pedindo pela viagem impossível. Curioso, Jacobson segue a trilha deixada por ela e descobre uma cidade que não existe no mapa, onde todos parecem felizes e sem problemas. Quando volta para casa, uma realidade paralela se instaurou, e ele vive feliz com a esposa, enquanto seu filho problemático nunca existiu. O conto de mesmo nome foi lançado por Philip K. Dick em 1953 e segue roteiro parecido, com a distinção de separar as realidades alternativas com viagem no tempo.

 

Kill All Others

Louis Herthum e Mel Rodriguez em 'Kill All Others'
Louis Herthum e Mel Rodriguez em ‘Kill All Others’ (Amazon/Divulgação)

Episódio sugerido para fãs de: Black Mirror, The Handmaid’s Tale, 1984 e Admirável Mundo Novo

Philbert Noyce (Mel Rodriguez, de Getting On e The Last Man on Earth) é um homem que não se sente muito confortável no mundo em que vive, dominado pela tecnologia. Odeia os anúncios holográficos invasivos – que aparecem até no banheiro – e prefere ir de transporte público a utilizar um carro automatizado. Na política, também não vê muita esperança, principalmente depois de ver a única candidata a presidente (Vera Farmiga, de Amor Sem Escalas e Bates Motel) dizer durante um programa de TV que durante sua gestão vai “matar todos os outros”. Philbert fica atônito: como pode a candidata dizer uma barbaridade dessas para todos verem e por que ninguém mais parece preocupado com essa afirmação? O episódio é inspirado no conto The Hanging Stranger, de 1953, que também trata da indiferença das pessoas diante de absurdos impostos por um cenário político pouco democrático, mas as duas histórias têm detalhes diferentes, apesar de chegarem a conclusões similares.

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