Recomendados por influenciadores, livros sobre ciência fazem sucesso com a geração Z
Em interessante e saudável onda, as informações científicas para jovens divulgadas por youtubers saem do meio eletrônico para virar obras em papel

Parece ter sido na pré-história, e foi na pré-história. Nos anos 1960 e 1970, os jovens buscavam o conhecimento científico, para além da rigidez da sala de aula, nas enciclopédias. Uma unanimidade internacional era a Britannica. A Barsa, brasileiríssima, teve como editores o filólogo Antônio Houaiss, o escritor Antonio Callado e o arquiteto Oscar Niemeyer. A Editora Abril, que publica VEJA, pôs no mercado o charme das ilustrações inigualáveis dos fascículos semanais da Conhecer e o tom lúdico da coleção Os Cientistas, que vinha com experiências dentro de um estojinho de isopor. Às favas o saudosismo tolo, mas eram bons tempos, que a avalanche da internet associada às redes sociais tratou de apagar. Há agora, contudo, um saudável renascimento da ciência entregue à chamada geração Z, de até 20 e poucos anos, por meio de livros. Milagre? Não exatamente.
Há, no mercado, uma série de publicações de evangelização científica para a petizada e os mais grandinhos — e deu-se o empurrão por meio da divulgação em programas de vídeos no YouTube e cortes no Instagram, no Facebook e no X. Dito de outro modo: uma leva de influenciadores alimenta o interesse, em movimento para lá de saudável e um tanto inesperado. Nada se compara ao estrondoso sucesso do canal Manual do Mundo, criado em 2008 pelo jornalista Iberê Thenório e pela monitora de museus Mari Fulfaro. Eles atraem a atenção de mais de 19 milhões de fiéis inscritos. A dupla é uma versão em português de um extraordinário sucesso da televisão nos anos 1990, O Mundo de Beakman, divertida coleção de experimentos químicos bizarros. E, então, há pouco menos de dez anos, deu-se o rastilho da transformação de bits e bytes em papel, que agora chegou a seu apogeu, com mais de vinte volumes lançados e pelo menos 700 000 unidades vendidas. Apenas O Grande Livro de Ciências, traduzido do inglês e lançado em 2019, bateu na casa dos 140 000 exemplares e seguindo.

A novidade de agora: a Enciclopédia Britânica para Curiosos, da Editora Sextante, com o carimbo e aval da dupla do Manual do Mundo, e não se surpreenda se seus filhos deixarem um pouquinho de lado o smartphone nessas férias de 2025, entre um reels e outro, para folhearem as páginas da caprichada edição, que não por acaso, talvez como inspiração, bebe de uma outra série aplaudida nos últimos anos, O Guia dos Curiosos e derivados, do jornalista Marcelo Duarte. Os lançamentos brotam e crescem como feijão em um punhado de algodão. A franquia Universidade dos Bebês, da Editora Blucher, por exemplo, oferece livros ilustrados que abordam engenharia espacial, robótica e mudanças climáticas (um tema de evidente predileção) para crianças a partir dos primeiros meses de idade, porque é de pequenino que se torce o pepino, como manda a perene máxima.
Tem funcionado, embora pareça espantoso. A pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil”, lançada no fim de 2024, mostrou que o país perdeu leitores de quatro anos para cá. Eram 100 milhões, e agora são 93 milhões. O aspecto positivo, por assim dizer: entre as faixas de “11 e 13 anos” e “70 anos ou mais” não houve queda. Quem lê diz fazê-lo por “gosto pessoal” (24%), “distração” (15%) e “atualização cultural ou conhecimento geral” (15%). Nesse escaninho, portanto, entram os trabalhos de informação científica que vieram dos meios eletrônicos. “Nós buscamos por livros que sejam divertidos e informativos, com dados corretos e acessíveis a qualquer pessoa, independentemente da idade”, disse Thenório a VEJA. A virada de caminho das prateleiras pode ser atribuída ao filho, então um pré-adolescente, de Tomás Pereira, editor da Sextante, apaixonado pelo Manual do Mundo. “Ele me mostrou um dos vídeos do canal e fiquei encantado. Eu os contatei para pensarmos em um projeto que pudéssemos desenvolver juntos”, relembra Pereira.

O universo virtual ainda manda e desmanda, ninguém sai dos smartphones, e convém deixar de lado as ilusões. Mas há, sim, uma pequena retomada iluminista, um olhar para os primórdios da sapiência impressa, por meio dos volumes de Jean le Rond D’Alembert e Denis Diderot na França do século XVIII. Os tempos estão mudando, ainda que não tanto assim.
Publicado em VEJA de 3 de janeiro de 2025, edição nº 2925