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‘Quero cativar o público conservador’, diz novo protagonista de ‘Malhação’

Estreante na televisão, Pedro Alves vai interpretar o primeiro personagem principal homossexual da história da novela da Globo

Por Ana Carolina Avólio Atualizado em 8 abr 2019, 16h23 - Publicado em 8 abr 2019, 08h00

Em um importante passo rumo à diversidade, o folhetim adolescente Malhação, da Globo, terá pela primeira vez em sua história um protagonista homossexual, a partir de 16 de abril – e depois de 24 anos no ar. Temporadas anteriores da novela já acenaram à comunidade LGBT, mostrando uma protagonista que se descobriu bissexual e beijos entre pessoas do mesmo sexo, mas é a primeira vez que um dos personagens principais da trama é apresentado logo de cara, inclusive pelo material de divulgação da emissora, como alguém que vai começar a questionar sua orientação sexual. Na dianteira desse momento está Pedro Alves, 26 anos, ator escalado para viver o personagem Guga, que terminará o namoro com uma menina após perceber que só sente amizade por ela e vai, depois de conhecer Serginho (João Pedro Oliveira), passar a entender melhor seus sentimentos, originando uma série de conflitos pessoais e familiares.

Em entrevista a VEJA, o ator, que viveu por onze anos na Bélgica e encara seu primeiro papel na TV – ele já gravou também a minissérie Santos Dumont: Mais Leve que o Ar, do canal pago HBO, ainda sem previsão de estreia – reflete sobre a responsabilidade de representar o primeiro protagonista gay da novela, o papel educador da televisão e a recepção que espera ter do público conservador – diz que quer conquistar justamente as pessoas que podem vir a criticá-lo. Quando o assunto é sua própria sexualidade, porém, foge de rótulos. “O sexo da pessoa com quem me relaciono nunca foi um problema para mim. Cresci em um país que foi um dos primeiros a aceitar o casamento LGBT”, afirma. “Namorar um homem ou uma mulher não tem relevância, o importante é namorar um ser humano que eu ame. Para mim, o sexo vai além do físico, independentemente de ser homem ou mulher.”

Malhação está no ar desde 1995 e, apesar de já ter mostrado beijos entre casais homoafetivos, é a primeira vez que o protagonista será um personagem gay. Qual a importância disso? Há uma importância muito grande, pelo momento que a gente está vivendo politicamente. Os artistas e a televisão têm esse papel também de informar – o que traz o ódio e preconceito é justamente a desinformação. Se naturalizarmos isso com a TV, creio que vamos conseguir combater o preconceito. É nisso que a televisão está investindo: uma linguagem nova, que possa mostrar as diferentes formas de amar para as pessoas.

Por que você acha que demoramos a ver um protagonista gay em Malhação? É natural. A senhora que está assistindo à televisão não aprendeu dessa forma, então, para ela, seria um pouco pesado ver de cara um casal homossexual, sem ninguém ter explicado que aquilo era simplesmente amor. A televisão pode injetar isso de forma homeopática, ensinando que é só uma forma de amar como tantas outras. A demora se deu pelo atraso da sociedade, pela desinformação, pelo governo que nos desinforma o tempo todo. A gente acha que o Brasil é só Rio de Janeiro, São Paulo, mas o país é muito vasto, o que a gente vive aqui não é a mesma coisa que o pessoal vive no Nordeste, no Norte ou no Sul. Mas acredito que chegou o momento de abordar isso com mais clareza, firmeza e naturalidade.

A novela já foi elogiada em anos anteriores por sua representatividade. Acha que é papel da TV colocar discussões como essa? Com certeza. Como as pessoas não têm informação, a TV acaba ganhando esse papel de educar e informar. (A Globo é) uma emissora que tem um alcance enorme, o poder de mudar. É isso que eu gostaria de fazer, de tocar qualquer família pelo Brasil. Se eu mudar a realidade de uma família que tem um filho gay, um tio gay, um pai gay, para eles conseguirem se entender entre eles, vou estar muito feliz.

Sente o peso da responsabilidade por causa desse papel? É uma responsabilidade enorme. De um lado, há pessoas que não vão gostar do que vou fazer, por preconceito ou desinformação, e, de outro, há pessoas que batalham pela causa. Quem luta contra o preconceito, a homofobia, sabe muito bem o que quer e o que não quer ver. Estou me preparando para mostrar um relacionamento homossexual sem estereótipo, sem apelação, da forma mais natural possível, e o Guga como um ser humano qualquer. A orientação sexual é só uma parte do que ele é como humano.

Temos visto um discurso conservador vindo de pessoas que inclusive se opõem, muitas vezes, a cenas de beijo entre casais homossexuais na televisão. Tem medo de sofrer ataques por causa do papel? Não tenho medo, não. Quando há uma mudança, sempre vai ter gente que vai ser contra. É normal, vai acontecer com certeza. Se acontecer, é porque estarei fazendo a coisa certa. Os conservadores vão estranhar de início, mas estamos encaminhando o enredo para atingir as pessoas sem agredi-las, sem chegar diretamente, escancarar e mostrar o casal gay. Estamos tentando justamente conquistar esse público. A direção da novela está propondo um jeito de tentar envolver e cativar (essa parcela conservadora), para depois mostrar que não é esse bicho de sete cabeças que as pessoas imaginam que seja.

Como você acha que será a recepção entre os jovens, o público-alvo da novela? Acredito que eles vão gostar bastante. A juventude não tem problema com isso, as pessoas mais velhas têm. (O Guga) vai ser um personagem pelo qual eles vão torcer muito. Eles vão ficar animados e contentes com essa representatividade.

O que você espera ouvir da comunidade LGBT? Gostaria de ouvir que estou fazendo um trabalho bem feito. Não adianta a gente mostrar o estereótipo, qual seria o estereótipo? Não existem dois gays iguais entre si, assim como não existem dois héteros e dois bissexuais iguais. Existem gays mais afetados, gays mais femininos, mais masculinos, uma possibilidade gigantesca. Espero que eles aceitem a homossexualidade do Guga, que é particular dele e não é igual à de ninguém.

Qual mensagem você quer passar para pessoas que vivem o mesmo dilema que seu personagem? Espero que eles vejam no Guga um apoio, um espelho. Que com isso eles tenham força para caminhar contra o preconceito, que esses jovens assistam à novela junto com seus pais, para provocar um entendimento maior entre eles. Não posso dizer que está errado uma senhorinha ter preconceito se é uma coisa que ela nunca viveu, nunca viu – a novela pode ajudá-la a enxergar seu neto, seu filho, na televisão e aprender a amá-lo como ele é.

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