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Na era politicamente correta, campanha propõe rebatizar o tomara que caia

A ideia é chamar de “blusa sem alça” a icônica peça feminina consagrada há quase oitenta anos; motivo: seu apelido original seria “sexista”

Por Mariana Rosário Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 14h35 - Publicado em 6 mar 2020, 06h00

Os seguidores — em especial as seguidoras — do “politicamente correto” advertem: o “tomara que caia”, por assim dizer, caiu em desgraça. Não, não é que a peça sem alças do vestuário feminino tenha saído de moda. O que está atualmente no alvo da correção política é o próprio termo “tomara que caia”. O acerto de contas com a expressão é encabeçado pela marca de roupas Hering, que propõe o uso de “blusa sem alça” para se referir ao modelo, a exemplo do que ocorre na língua inglesa, que adota uma palavra precisa: strapless. A estrela da campanha é a atriz Mariana Ximenes. “Acho que a gente tem de procurar ter uma sociedade mais igualitária, com mais respeito pela diversidade”, disse ela à edição brasileira da Harper’s Bazaar, revista americana de moda e comportamento feminino fundada em 1867.

Ancorado no avanço dos debates ligados à libertação da mulher, o movimento reflete uma tendência que se espalha por empresas de variados setores: a necessidade de conexão com as causas sociais da contemporaneidade. “É algo que não impacta absolutamente nada nos dias de hoje, mas pode se tornar um legado para as próximas gerações”, diz Carla Cristina Garcia, professora do departamento de pós-graduação em psicologia social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Algo parecido se deu com as piadas sobre loiras, que não são mais ouvidas por aí”, completa.

GILDA
OMBROS À MOSTRA – Rita Hayworth em Gilda (1946): a personagem popularizou o modelo (Gamma-Keystone/Getty Images)

A bem da verdade, não é possível identificar com segurança a origem do termo “tomara que caia”. “Imagino que seja fruto de um olhar cúpido, de desejo”, arrisca o professor de língua portuguesa Pasquale Cipro Neto. Especialistas em moda lembram que, ao menos no idioma português, a conotação algo machista da expressão não se restringe ao Brasil. Em Portugal, a peça tem também um nome insinuante, ainda que mais leve: caicai. Não se pode deixar de reconhecer, entretanto, que os apelidos tenham lá um lado técnico. “Como não existia o elastano na época da consagração da peça (na década de 40), ela poderia mesmo escorregar pelo corpo, caso não fosse bem estruturada”, explica a editora de moda Lilian Pacce, autora do livro O Biquíni Made in Brazil. Há quem atribua a sua chegada à moda contemporânea ao reconhecido estilista espanhol Cristóbal Balenciaga (1895-1972). Contudo, o modelo caiu mesmo no gosto popular ao vestir a atriz americana Rita Hayworth (1918-1987) no filme Gilda (1946). Desde então, tornou-­se símbolo de elegância e sensualidade, além de ser figurinha carimbada em tapetes vermelhos de premiações.

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No Brasil, a celebração do tomara que caia veio cedo, ainda nos anos 1950, quando ele se irradiou por vestidos, maiôs e biquínis. Durante muito tempo, o apelido não provocava nenhuma celeuma. E por que tanto alarde hoje? “No início era só uma piada, não tinha maldade. O que estamos vendo agora é mais um exagero da patrulha do politicamente correto”, critica Marco Sabino, autor de Dicionário da Moda.

Publicado em VEJA de 11 de março de 2020, edição nº 2677

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