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‘Mundinho complicado’: Adriel Oliveira conta como o racismo mudou sua vida

Apoiado por celebridades, como Gisele Bündchen, garoto tem recebido a ajuda de seguidores e editoras para manter de pé o sonho de levar a leitura a todos

Por Eduardo F. Filho 5 jun 2020, 11h36

Depoimento de Adriel Oliveira, 12, sobre o episódio de racismo sofrido por ele nas redes sociais:

“Eu nunca imaginei que a cor da minha pele despertaria o ódio em outra pessoa. Mas infelizmente o racismo se encontra nessa sociedade e eu fui uma das vítimas. Na última semana, uma pessoa anônima escreveu um comentário em um dos vídeos de resenhas de livros que eu faço, dizendo que eu deveria estar trabalhando em uma mina de carvão por ser negro e não lendo livros. Mas quer saber? Eu tenho orgulho de ser negro. Minha mãe pediu para eu apagar o comentário, porque o homem não me conhecia, não iria me agregar em nada, mas eu fiquei triste. Pensei em outros episódios de racismo que minha mãe, Daisy, sofreu, e também minha prima, Bruna, 27 anos. Decidi que não vou me calar. Acredito que todas as pessoas de pele escura já sofreram discriminação e isso não está certo. Tirei print, apaguei o nome do racista e publiquei a imagem com o comentário. Mas nunca imaginei que minha vida mudaria por causa disso. Em menos de dois dias, eu consegui mais de 700.000 seguidores nas minhas redes sociais. Não param de chegar livros para mim. Uma pessoa está pagando a reforma da minha casa. Nossa vida realmente está mudando para melhor, quem diria, graças a um doloroso episódio de racismo.

Eu acredito que os livros tragam conhecimento e como diz o ditado: conhecimento nunca é demais. A paixão pela leitura começou aos 5 anos. Minha mãe me inscreveu em um concurso para conseguir uma bolsa integral em uma escola particular de Salvador, mas para isso eu precisava saber ler. Minha madrinha se mudou para minha casa e todos os dias ela me ensinava um pouco a arte da leitura. Em dois meses eu aprendi a ler. Consegui a bolsa, mas estudei neste colégio apenas por um ano. A equipe filantrópica saiu da escola, e apesar da bolsa continuar, minha mãe teria que pagar pelo material e uniforme e não tínhamos condições para isso. Mas continuo estudando em um colégio estadual, o que não é a mesma coisa, mas não posso parar de estudar.

“Quer saber? Eu tenho orgulho de ser negro”, Adriel Oliveira, 12 anos, sobre o episódio de racismo sofrido nas redes

Eu decidi fazer um Instagram literário incentivado pela minha prima, Bruna, que, assim como eu, adora ler e escrever. Ela é meu orgulho sem dúvidas. A Bruna começou a me dar dicas de livros que ela achava interessante, e minha mãe comprava com o dinheiro que sobrava das compras do mercado em um sebo. Os lançamentos que são mais caros, nunca os tive. Os vídeos na minha conta eram para compartilhar o que eu achava dos livros com meus amigos que sempre me perguntavam sobre a obra que eu estava lendo.

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Porém, em 2019, interrompi por um tempo a produção de vídeos e vendi meus livros para ajudar em casa, quando meu padrasto sofreu um AVC hemorrágico. Foram mais de 200 livros vendidos – entre 20 e 50 reais cada. Meu padrasto está em casa agora, mas de cama. Não consegue andar ou comer sem ajuda. Tem pressão alta e se irrita fácil. Aqui em casa é uma batalha imensa diariamente. Minha mãe recebe um auxílio doença do governo de 1.000 reais, mas desse dinheiro quase 500 reais são gastos com o plano de saúde do meu padrasto. Nós sobrevivemos com a ajuda de amigos da família que muitas vezes fazem a compra do mês pra gente. O auxílio emergencial da pandemia só disponibilizou 600 reais para a minha mãe, mesmo sendo chefe de família e podendo receber 1.200 reais.

Sobre o episódio de racismo, eu resolvi, junto com minha mãe, fazer um B.O. para mostrar às pessoas que elas não podem se abalar com a discriminação e com o racismo, não podemos nos calar. Estou com um acompanhamento psicológico, para lidar com toda essa situação. Fiquei muito emotivo, não estou conseguindo responder todas as pessoas e acho que mexeu um pouco com a minha cabeça. Nós temos que estar bem para passar coisas boas ao meu padrasto. Apesar de ter expandido meu alcance para o Brasil, continuo vivendo o dia a dia do meu mundinho complicado, mas fantasioso.”

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