Morre o cantor Luiz Melodia, de câncer, aos 66 anos
Compositor de clássicos como 'Magrelinha' e 'Ébano', o carioca lutava contra um tumor na medula
Morreu na madrugada desta sexta-feira, aos 66 anos, o cantor e compositor Luiz Melodia, de clássicos da música nacional como Pérola Negra, Magrelinha e Ébano. Melodia lutava contra um câncer na medula. Ele chegou a ser submetido a um transplante, mas não resistiu ao tratamento pós-cirúrgico.
Didu Nogueira, diretor do Clube do Samba do Rio, confirma e lamenta a morte de Melodia em sua página no Facebook. “Enquanto o céu vai se enfeitando, a gente vai se f*** por aqui”, escreveu Nogueira, que lembrou no post como conheceu Melodia, em 1987, em um show na extinta boite Tiger na Barra da Tijuca. “Foi tudo muito bom, mermão.”
Luiz Melodia nasceu em 7 de janeiro de 1951 no Morro do Estácio, que homenageou na melancólica e dolorida Estácio Holly Estácio, uma das suas principais composições. “Se alguém quer matar-me de amor / Que me mate no Estácio / Bem no compasso, bem junto ao passo / Do passista da escola de samba / Do Largo do Estácio”, diz a letra da música. “O Estácio acalma o sentido dos erros que eu faço / Trago, não traço, faço, não caço / O amor da morena maldita /Domingo no espaço.”
Filho único de Oswaldo e Eurídice, foi influenciado pelo pai, que tocava dentro de casa. “Fui pegando a viola dele, tirando uns acordes, observando. Ele não deixava eu pegar a viola de 4 cordas que era um relíquia, muito bonita, onde eu aprendi a tocar umas coisas”, contou certa vez. Acabou por contrariar Oswaldo, que queria vê-lo “doutor” apesar da afinidade musical entre os dois, e abandonou a escola ainda no ginásio para se dedicar à música, a princípio influenciado pela jovem guarda, de onde tirou Negro Gato, um de seus maiores sucessos (“Sou um negro gato de arrepiar / E essa minha vida / É mesmo de amargar / Só mesmo de um telhado / Aos outros desacato /Eu sou um negro gato!”).
A mistura de referências — iê- iê-iê, samba, jazz — deu origem a um estilo particular que despertou a atenção dos poetas baianos Waly Salomão e Torquato Neto, que frequentavam o Morro do Estácio e levaram composições de Melodia para Gal Costa ouvir. Então a principal representante do tropicalismo no país, já que Caetano e Gil estavam exilados em Londres, Gal foi a melhor plataforma que Luiz Melodia poderia ter.
Incluiu a bela Pérola Negra em Fa-Tal, o show histórico e antológico de 1972 em que, no melhor estilo hippie, a cantora se sentava no chão para dedilhar o violão, o cabelão cacheado caindo por sobre as cordas. Pérola Negra logo se tornaria uma das faixas mais reproduzidas do disco gravado durante uma apresentação de Gal, ao lado de A Todo Vapor (de Jards Macalé e Waly Salomão) o subtítulo do álbum.
https://www.youtube.com/watch?v=6Y1k9XwDJyo
Também em 1972, participou do show A Fina Flor do Samba, e Maria Bethânia gravou Estácio Holly Estácio, consagrando o jovem compositor que aos poucos amadurecia.
O primeiro disco de Luiz Melodia, que emprestou o sobrenome artístico ao pai, que já o usava no Estácio, saiu no ano seguinte, batizado com o nome da faixa lançada por Gal. Excelente do começo ao fim, com canções como Vale Quanto Pesa, Magrelinha e Farrapo Humano. Pérola Negra é considerado um dos maiores álbuns da história da MPB.
Ouça abaixo Magrelinha:
Seu segundo disco foi Maravilhas Contemporâneas, de 1976, relançado neste ano pela Som Livre. O álbum reúne faixas como Juventude Transviada (aquela dos versos “Lava roupa todo dia/ que agonia/ Na quebrada da soleira/ que chovia/ Até sonhar, de madrugada/ Uma moça sem mancada/ Uma mulher não deve vacilar”). A música estourou ao entrar para a trilha da novela Pecado Capital.
Fadas, outro sucesso, saiu em Mico de Circo, o terceiro disco, de 1978.
Mais de uma dezena de discos se seguiram até o último, Zerima, de 2014, que lhe rendeu o Prêmio Música Popular Brasileira na categoria melhor cantor de MPB. Ele deixa a esposa, também cantora e compositora, Jane Reis, e dois filhos, Mahal e Hiran.