De Menudo a ativista: “Vamos tirar o ódio da nossa vida”, diz Ricky Martin
Dez anos após se revelar homossexual, o cantor lança disco que reflete sua vida em família bem resolvida e abraça causas como a luta pelos direitos LGBTQI+
Em julho do ano passado, uma manifestação popular tomou conta de San Juan, a capital de Porto Rico. Ricky Martin, um dos mais ilustres filhos da ilha caribenha, foi para as ruas e, em cima de um caminhão, exigiu a renúncia do governador Ricardo Rosselló, flagrado em diversos casos de corrupção e também proferindo mensagens homofóbicas contra Martin. Deu certo. O político cedeu às pressões e renunciou. Do protesto, surgiu a música Tiburones, em que ele canta em espanhol: “Por você cruzo a Terra e luto com mil leões / Eu faço qualquer coisa por você, nado até com tubarões”. No clipe, gravado antes da pandemia, o cantor está nas ruas, em meio aos manifestantes, brandindo que o amor vai acabar com a violência.
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A faixa se tornou a primeira a ser lançada de seu novo EP, Pausa, disponível em streaming. Quase todas as seis canções foram compostas e produzidas durante o confinamento. Simple, que abre o trabalho, foi gravada em parceria com o britânico Sting, notório artista-ativista. “Ele despertou em mim a necessidade de fazer coisas pelos outros”, afirmou Martin em entrevista por vídeo a VEJA, em português fluente. “Eu disse a Sting que quero ser parte do movimento musical que vai nascer desta pandemia. Brasil, o mundo está vendo o que está bom e o que está ruim. Vai tudo ficar bem.” Quando a pandemia passar, Martin pretende lançar outro EP, Play, com faixas mais animadas.
Longe de ser fabricado, seu ativismo foi moldado a partir das dificuldades que ele enfrentou no preconceituoso mundo artístico em que foi jogado aos 12 anos, quando entrou para a boy band Menudo — na qual ficaria até os 17. “Trabalhei e aprendi muito naquela época”, relembra. O preço cobrado pela fama foi alto. Ao encarnar a persona de galã latino, já na carreira-solo, ele precisou esconder a homossexualidade. Foi só aos 38, após ter os filhos gêmeos Valentino e Matteo, que finalmente se assumiu gay (alguns, de forma antagônica, vivem a mentira uma vida inteira). Ao contrário das previsões pessimistas, a atitude não prejudicou sua carreira, e ainda angariou mais fãs. Desde então, Martin criou uma fundação que luta contra a exploração infantil e o tráfico humano. “Todos os problemas estão conectados. Temos de falar do racismo, do tráfico humano, da luta da comunidade LGBTQI+. São bandeiras que carrego comigo”, afirma. “Recebo muitas mensagens de ódio, mas tenho 48 anos e sei o que eu quero. Muitos jovens que ainda estão tentando aceitar sua natureza também são ofendidos. Vamos tirar o ódio da nossa vida.”
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Há dois anos, ele deu outro passo importante na vida pessoal ao se casar com o artista plástico Jwan Yosef. Foi só recentemente, no entanto, que se sentiu à vontade para divulgar um vídeo em que beijava o marido — com quem tem mais outros dois filhos, Lucía e Renn. “Para muitos, ainda não é normal que um homem beije outro homem. Para mim, é importante normalizar o jeito que eu amo. Quero que o público veja que minha família é amorosa e que nossos filhos estão crescendo em um ambiente saudável”, diz. Em casa, Martin buscou forças para enfrentar o isolamento social. “Foi especial passar esses últimos 110 dias com meus filhos. Eles estão ótimos, bem melhores do que nós”, conta. O mundo também fica melhor com astros tão conscientes e bem resolvidos.
Publicado em VEJA de 22 de julho de 2020, edição nº 2696
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