Brasileiros lançam filme em realidade virtual no Festival de Veneza
Evento criou um espaço online para exibir os projetos no formato durante a pandemia
Enquanto o Festival Internacional de Cinema de Veneza enche as vielas da cidade italiana de visitantes, uma segunda curadoria do evento acontece no mundo virtual. O Venice VR Expanded, uma seção da mostra exclusiva para produções em realidade virtual, foi montada para que os visitantes pudessem fazer um passeio de gôndola e assistir aos filmes de qualquer lugar do mundo, com um computador ou óculos apropriados.
O festival já exibe produções em realidade virtual desde 2016. Nos anos anteriores, a ilha Lazzaretto Vecchio (que já abrigou um hospital em períodos de peste e um posto militar), se transformava na VR Island, um espaço exclusivo para o público aproveitar as exibições com o equipamento adequado.
Este ano, no entanto, Veneza é anfitriã do primeiro festival de cinema presencial desde o início da pandemia e decidiu manter o braço de realidade virtual no mundo online. Entre os títulos selecionados, está Gravidade VR, dirigido pelos brasileiros Amir Admoni e Fabito Rychter.
Baseado em um curta de animação desenvolvido pela dupla em 2018, a produção acompanha os últimos momentos de dois irmãos em uma queda livre durante quinze minutos. Sem qualquer visão de uma linha do horizonte ou um chão, o expectador é colocado na queda junto com objetos de uma casa, como uma geladeira e um tabuleiro de xadrez, e os personagens, que estão conectados por uma corda.
Os diretores são amigos de longa data e lançaram o curta de animação Linear, em 2012. Admoni é mestre em design e trabalhou em canais como MTV e Disney Channel. Já Rychter é roteirista há cerca de vinte anos e colaborou em projetos como Entre Tapas E Beijos e Casseta & Planeta.
Natural do Rio de Janeiro, o roteirista se mudou para o Peru em 2016 (em razão de uma proposta de emprego recebida pela esposa), mas manteve o vínculo empregatício com a Rede Globo, em um trabalho à distância. Durante um passeio ao shopping na cidade de Lima, ele teve o primeiro contato com a realidade virtual.
“Tinha uma experiência boba para os visitantes, com dinossauros e coisas assim. Fiquei impressionado do quão imerso estava naquele mundo. Peguei a fila três vezes para participar e comprei todo o equipamento necessário”, ele relembra. “Depois do shopping, já liguei para a Globo, avisando que não renovaria o contrato.”
Os últimos três meses trabalhando na emissora e outros dois, que conseguiria viver com o valor da rescisão do emprego, foi o tempo que teve para estudar mais sobre o mundo do VR (sigla para realidade virtual, em inglês). “Comecei a estudar de dez a doze horas por dia e logo passei a entrar em contato com agências de publicidade, oferecendo experiências em eventos para marcas”, ele explica. Foi assim que conheceu novos clientes, de médicos, a bancos e até colégios, que começaram a fornecer aulas virtuais aos alunos.
Rychter foi quem apresentou o mundo do VR para Amir. “Na primeira vez que experimentei o equipamento, além de ficar encantado, também fiquei um pouco assombrado, porque vi o potencial que aquilo tinha”, relembra Admoni. “Imagine quando não pudermos distinguir entre o que chamamos de realidade e essa que chamamos de virtual.”
Além de Veneza, Gravidade foi selecionado para o Festival de Cannes (que precisou ser cancelado, devido à pandemia), o Tribeca (festival que acontece em Nova York), entre outras mostras com espaço para projetos em realidade virtual. “Vejo as láureas no pôster do filme e tenho vontade de chorar”, comenta Rychter.
Os diretores não conseguiram comparecer a nenhum dos eventos que foram realizados neste ano, por causa das medidas de segurança. “Esperávamos conseguir investimentos para próximos projetos”, o roteirista explica. Gravidade VR foi feito com o financiamento do edital Rumos, do Itaú Cultural.
No ano passado, Veneza já havia recebido um outro projeto em VR brasileiro, o curta A Linha, de Ricardo Laganaro, que venceu recentemente um Emmy. “Ter projetos em Veneza um ano após o outro com certeza traz relevância para o Brasil”, comenta Amir Admoni. “Mas sabemos que na realidade o que chamamos de Brasil são iniciativas muito pontuais e ainda carecemos de estímulos para que essa onda tenha continuidade.”