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A coleção monumental de revistas do britânico James Hyman

Atualmente, o acervo contempla 150 000 itens de cerca de 5 000 títulos — inclusive VEJA. O plano é torná-lo mais acessível

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h52 - Publicado em 7 Maio 2021, 06h00

Aos 50 anos, James Hyman é de uma geração que viveu o melhor de dois mundos. Na década de 90, o jornalista britânico presenciou o ápice do mercado de publicações impressas, quando havia uma vastidão de títulos nas bancas, e também a ascensão da internet, que estava apenas começando a se popularizar. Zeloso de seu trabalho como assessor de imprensa da MTV Europa, Hyman orgulhava-se de transmitir informações de qualidade nos comunicados que redigia. Mais tarde, como roteirista dos programas da emissora, tinha o cuidado de elaborar perguntas mais interessantes do que “qual é seu prato de comida preferido?” para que os apresentadores fizessem aos convidados, gente como os cantores David Bowie ou Bono Vox. As revistas de cultura pop, suas preferidas desde sempre, eram uma espécie de porto seguro, um lugar para buscar notícias abrangentes e confiáveis. Era tão cuidadoso com elas que comprava duas de cada vez — uma para manusear, outra para guardar. Em mais de trinta anos, a coleção cresceu tanto que hoje está distribuída por cerca de 1 000 metros lineares de estantes em uma antiga fábrica de canhões do século XVIII em Woolwich, na periferia de Londres.

O que era apenas ferramenta de trabalho tornou-se uma paixão. Primeiro, Hyman entupiu a casa de revistas, a ponto de a companheira, não sem espanto, se dar conta de que estava dormindo sobre pilhas de Playboy. Após um ultimato tácito da mulher grávida, ele espalhou o acervo por vários depósitos, até concentrá-lo em um lugar só. Em 2012, o então Hyman Archive — depois rebatizado de Hymag simplesmente — foi certificado pelo Guinness Book of World Records como a maior coleção de revistas do mundo, com 50 953 exemplares, de 2 312 títulos.

Desde então, a história se espalhou pelo mundo e o acervo cresceu graças a generosas doações. Uma delas, do celebrado crítico de moda Colin McDowell, que cedeu 2 600 edições raras de publicações britânicas, francesas, italianas e de outras nacionalidades. A famosa arquivista alemã Edda Tasiemka, que morreu em 2019, deixou aos cuidados do jornalista sua impressionante coleção de recortes, separados metodicamente em pastas por assuntos que vão desde o rolling stone Mick Jagger até o Estado Islâmico. Atualmente, a coleção de Hyman contempla 150 000 itens de cerca de 5 000 títulos — inclusive VEJA, a maior e a mais relevante publicação brasileira.

Arte Revistas

O foco de interesse de Hyman sempre foi a cultura pop, mas sua coleção não tem restrições de tema, época ou nacionalidade. Há relíquias como os primeiros exemplares da revista Tatler, de 1901, publicada até hoje pela Condé Nast, com foco em moda e estilo de vida, além da cobertura da alta sociedade e da política britânicas. Pode-se encontrar também curiosidades como o FBI Law Enforcement Bulletin, um periódico da famosa polícia federal americana destinado a agentes da corporação. Sem falar em bizarrices como fanzines — publicações caseiras feitas por fãs — sobre erotismo, comunidades alternativas e até alienígenas. A barreira da língua nunca foi um problema, tanto é assim que as estantes guardam exemplares de idiomas que ele jamais sonhou em dominar, como o português.

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O que explica a paixão de Hyman? “A experiência de manusear uma revista não tem a ver apenas com o conteúdo, mas com tudo que está em torno da cópia física, como a diagramação, as fotos e os anúncios”, afirma. Ele destaca também que as revistas são, acima de tudo, um registro histórico de seu tempo. Este exemplar de VEJA, por exemplo, permanecerá vivo e certamente ajudará as gerações futuras a compreender melhor o passado e, assim, moldar o presente.

A hemeroteca Hymag está aberta ao público. Atualmente, os visitantes podem fazer pesquisas por 75 libras a hora (algo como 560 reais). Os frequentadores são acadêmicos, cineastas, escritores, estilistas, jornalistas, pesquisadores, publicitários, museólogos ou simples curiosos. Além de Hyman, trabalham no acervo apenas mais duas pessoas. Mesmo com uma equipe reduzida, as contas não fecham, o que se agravou durante o período mais agudo da pandemia no Reino Unido.

Para contornar o problema, o jornalista recorreu ao financiamento coletivo. Conseguiu angariar até agora 25 000 libras, quase 190 000 reais, o que é pouco para as ambições de Hyman, que almeja transformar o local numa das principais referências em revistas do mundo. “Precisamos de algo como 2 milhões de libras para realizar esse projeto”, diz. Além de escanear as publicações e colocá-­las em um servidor, é preciso fazer a manutenção do acervo para que não se perca de forma irremediável. Outra meta é montar um site para acomodar todo o material e torná-lo acessível a um público maior. Só assim será possível preservar um patrimônio inestimável: as revistas que, no último século, foram e continuam sendo testemunhas privilegiadas dos avanços e recuos da civilização.

Publicado em VEJA de 12 de maio de 2021, edição nº 2737

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