Sob as ondas: empresas avançam no mercado de submarinos particulares
O público-alvo é aquele que já singra os mares em iates e quer um brinquedinho para explorar as profundezas
Meio de transporte inventado no século XVII que se tornou conhecido por seu papel militar na I Guerra Mundial, o submarino até recentemente cumpria três funções principais: abrilhantar a frota da Marinha das nações avançadas, contribuir para as pesquisas marítimas e figurar, gloriosamente amarelo, na capa do famoso álbum dos Beatles. Agora, começa a ganhar o mundo. Duas empresas competem pelo mercado dos submarinos particulares, um brinquedinho dedicado sobretudo a quem já tem um portentoso iate e quer ampliar (para baixo) seus horizontes. Pioneira no ramo, a holandesa U-Boat Worx, apoiada na própria avaliação de que todo dono de um barco de mais de 150 pés é potencial comprador, lançou em 2020 a linha Nemo, capaz de descer a 100 metros de profundidade, a preços que começam em 1 milhão de dólares (5,2 milhões de reais).
Com 2,8 metros de largura, 1,55 metro de altura e capacidade para duas pessoas, o Nemo é o único modelo prêt-à-porter da Worx — todos os demais são feitos sob encomenda, prática também em vigor na concorrente Triton, sediada na Flórida. Dependendo das especificidades, a maioria dos submarinos particulares das duas marcas custa entre 2,5 milhões e 3,6 milhões de dólares (na casa dos 18 milhões de reais). Fundador e CEO da U-Boat Worx, Bert Houtman, 69 anos, disse a VEJA que sua paixão por submersíveis vem de longe: aos 16 anos, apresentou-se ao célebre oceanógrafo francês Jacques Cousteau e pediu para revender o Flying Disk — um modelo muito parecido com o Yellow Submarine da canção, lançado em 1959 para pesquisas científicas. De lá para cá, Houtman adotou como missão popularizar (relativamente) o submarino. “A fórmula é conseguir um preço de custo baixo, sem prejuízo da segurança e do conforto”, afirma.
Na base da Worx em Curaçao, no mar caribenho, a empresa oferece um curso de duas semanas aos compradores de submarinos, que inclui aulas teóricas e vinte mergulhos de treinamento. Os veículos precisam de manutenção e revisão anuais e contam com assentos confortáveis, ar-condicionado, sistemas de som de alta qualidade e câmeras de bom nível para fotografar o passeio, além de reservas de emergência de alimentos e combustíveis e comunicação ininterrupta com a base. Até hoje, nenhum dos 6 000 mergulhos realizados em veículos da marca apresentou problema técnico — embora, sim, os passageiros possam eventualmente passar por crises de claustrofobia e pânico. Houtman diz já ter vendido sessenta submersíveis — metade para particulares, metade para organizações de pesquisa e empresas de cruzeiro — e espera que o Nemo multiplique a demanda. “Não vai demorar para que seja o mais vendido do mundo”, antecipa.
A americana Triton está mais interessada em chamar a atenção pelo inusitado de suas conquistas. Em 2019, fabricou um modelo com casco de titânio para levar o financista e aventureiro Victor Vescovo à parte mais profunda do oceano já explorada: 10 927 metros abaixo na Fossa das Marianas, supostamente batendo o recorde do diretor de cinema James Cameron (ele nega). Foi em um submarino da Triton com capacidade para oito pessoas que se realizou a primeira cerimônia de casamento a 1 000 metros de profundidade, em 2017. Na mesma linha de o fundo do mar é o limite, o holandês Houtman projeta a construção do Under Water Entertainment Platform (UWEP), um imenso submarino capaz de levar 120 pessoas para 200 metros de profundidade, com direito a jantar em restaurante subaquático enquanto apreciam a vista (devidamente iluminada por holofotes) através das catorze enormes “janelas”. Quando não está submerso, o UWEP proporciona ar fresco e brisa no rosto em um vasto deque.
Também está nos planos a construção de uma espécie de “iate subaquático”, o Nautilus, apresentado no Yacht Show de Mônaco em setembro. O submarino terá salão e quatro suítes, cozinha, bar e sala de jantar, tudo iluminado por um enorme painel de vidro frontal. Vai custar o equivalente a 130 milhões de reais e deve ficar pronto em quatro anos. Depois de ter acesso a todos os pontos do planeta e de garantir a chance de esbarrar na órbita terrestre em foguetes particulares, os milionários podem agora desbravar a seu bel prazer as profundezas do mar. Próxima parada — Marte?
Publicado em VEJA de 16 de novembro de 2022, edição nº 2815