Por que o figurino de ‘Assassinos da Lua das Flores’ é tão interessante?
Assinado por Jacqueline West e visto de perto pela comunidade Osage, retratada no filme, roupas trazem uma precisão impressionante de detalhes
Um dos filmes mais esperados – e já festejados do ano – “Assassinos da Lua das Flores”, de Martin Scorcese traz uma história real baseado no livro de David Grann sobre a misteriosa série de assassinatos de membros da comunidade nativa americana Osage, em Oklahoma, nos Estados Unidos, na década de 1920. Mas além da violência e crueldade dessas mortes, um período devastador para os Osage, o longa estrelado Leonardo DiCaprio, Robert De Niro e a atriz nativa americana Lily Gladstone, faz uma bela homenagem à beleza da história e da cultura da comunidade que, naquela época, eram as pessoas ricas pela quantidade de reservas de petróleo que tinham em suas terras (e que atraiu homens brancos e violentos, que culminaram nos assassinados).
Entre as referências da herança cultural do Osage está o belíssimo figurino, assinado por Jacqueline West, figurinista famosa por seu extenso trabalho de pesquisa que, com o auxílio da consultora Julie O’Keefe, conseguiu retratar as roupas da comunidade nativa de forma impecável e torna-lo uma das partes mais interessantes do filme pela impressionante riqueza de detalhes. “Essas roupas são muito particulares”, disse Jaqueline à revista Harper´s Bazaar americana. “Mesmo entre o povo da nação Osage, uma mãe pode ter ensinado de uma maneira, outra mãe pode ter ensinado de outra. Mas existe uma maneira clássica, que Julie sabe bem”, completou, referindo-se a consultora, que é uma legítima Osage.
Além do olhar de Julie, Jacqueline contou com um vasto material fornecido pelas próprias pessoas dos quatro distritos diferentes que compõem a comunidade nativa, desde fotografias antigas aos raros vídeos caseiros feitos por eles, naquela época os únicos que os produziam além da realeza britânica. “Os Osage eram algumas das únicas pessoas que podiam se dar ao luxo de fazer filmes caseiros nesse período. Entre os arquivos, se encontram filmagens em seus próprios aviões particulares; andando por Pawhuska em lindos carros, fazendo compras em Paris e Nova York, usando as melhores joias da Tiffany e passando férias em Colorado Springs”, contou Julie, à mesma publicação. “Os Osage eram bastante elegantes.”
O que chama a atenção, porém, é que mesmo com todo esse poder aquisitivo e consumindo a moda parisiense, os Osage não largaram mão de suas raízes e fizeram questão de, ao longo dos anos, manter características essenciais do vestuário original da comunidade, que inclui, por exemplo, os cobertores, xales, lonas e fitas que aparecem em quase todo o filme. O que muda – e diferencia as pessoas de cada distrito ou posição, é a forma como eram usados ou enrolados no corpo – tanto para homens quanto para mulheres.
Cobertores, fitas, franjas e broches
Um exemplo, no filme, é como o personagem do Chefe Bonnicastle (Yancey Red) usa o cobertor por cima do terno, o que indica um homem educado e um líder. Já um homem da estrada ou um homem considerado santo usa o cobertor em volta da cintura, do mesmo jeito que um cavalheiro durante o casamento. Entre as mulheres, também trazem significados, bem retratados no figurino de Mollie Burkhart (Lily Gladstone), que embora fosse educada em escolas de brancos, sempre optava por roupas tradicionais Osage, em especial em se enrolar em cobertores por cima do vestuário contemporâneo. “Mollie no filme representa a verdadeira mulher Osage. Ela é um símbolo da nação Osage”, declarou Jacqueline.
Feitas do zero e aprovadas pela comunidade
Outros recursos relativos às vestimentas são usados no longa para precisar a moda Osage. Na tradicional dança In-Lon-Shka, por exemplo, os distritos da comunidade nativa são diferenciados por detalhes nas roupas: as franjas viradas para o lado de fora significam membros do distrito chamado Gray Horse, já as viradas para dentro, são de Pawhuska. O distrito de Zon-Zo-Li amarra as fitas com um laço nas costas, já outros preferem prendê-las em broches. Assim, os membros conseguem distinguir os diferentes distritos ou famílias nos bailes – mas a dança permanece a mesma há mais de 150 anos. Já as mulheres Osage mais modernas, como a personagem Anna (Cara Jade Myers), irmã de Mollie, apresentam uma estética que lembra uma melindrosa moderna, mas vez ou outra, colocam o cobertor ou o xale como forma de reafirmar sua cultura.
Mais um destaque de “Assassinos da Lua das Flores” são os casacos de noiva, que os homens usavam para encontros com líderes governamentais e depois dava para Traz status para suas filhas ornamentarem com fitas para usar no dia do casamento. “Assim, sabiam que ela vinha de uma família muito importante”, contou Julie. Uma tradição que se seguiu até o começo da década de 1950, quando os casamentos Osage passaram a não serem mais arranjados.
Vale dizer que, exceto os figurinos dos vários figurantes e as joias e acessórios, praticamente todos os figurinos foram feitos especialmente para os personagens do filme de Scorcese. E todas as roupas Osage foram feitas do zero e “aprovadas” por membros da própria comunidade, que fizeram questão de ajudar no trabalho da figurinista e da consultora. “De certa forma, foi um projeto comunitário. Eles queriam que tudo fosse absolutamente correto”, concluiu a consultora.
Pela beleza e precisão de todo o figurino do longa, não é difícil prever que “Assassinos da Lua das Flores” não será apenas um forte candidato ao Oscar de Melhor Filme, mas também de Melhor Figurino. Aguardemos!