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Biografia revela a influência de Amélia de Leuchtenberg sobre Pedro I

A jovem franco-bávara, a segunda mulher do imperador, influenciou-o na política e ditou moda no Império

Por Marília Monitchele Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h04 - Publicado em 10 set 2023, 08h00

Os livros de história destacam duas únicas mulheres cruciais na vida do imperador dom Pedro I (1798-1834): a esposa e imperatriz Maria Leo­pol­dina (1797-1826) e a amante Domitila de Castro (1797-1867), depois feita marquesa de Santos. Contemporâneas, as duas disputavam o coração e a atenção do príncipe viril e mulherengo. Há um nome, contudo, um tanto esmaecido, muito escanteado, como se não fosse mulher de verdade: Amélia de Leuchtenberg (1812-1873), a segunda cônjuge oficial de Pedro.

Ela foi personagem decisiva e influente nos momentos conturbados que marcaram o fim do Primeiro Reinado, em 1831, com a abdicação do pai, ao ceder o trono ao filho, que seria conhecido pela vasta barba, mas que um dia foi criança. O legado de Amélia começa a sair das sombras com uma reveladora e bem cuidada biografia, D. Amélia: a História Não Contada (Editora LeYa), da pesquisadora e escritora luso-brasileira Cláudia Thomé Witte, uma das grandes especialistas do tema.

DETERMINADA - Em Portugal, já viúva, no ano de 1861: perfeita noção do poder
DETERMINADA - Em Portugal, já viúva, no ano de 1861: perfeita noção do poder (Francisco Augusto Gomes//)

Neta de Napoleão Bonaparte e de Josefina, da França, Amélia cruzou o oceano com apenas 17 anos para encontrar um futuro marido que nunca havia visto, mas do qual ouvira falar barbaridades que afastaram outras pretendentes. Com um rosto angelical, a princesa franco-bávara da Casa de Beauharnais era uma das nobres mais bem-educadas da Europa. A autora mostra como, já no papel de imperatriz consorte, a moça revelou firmeza e noção nítida de poder diante do enfraquecimento da monarquia no Brasil e da disputa pelo trono português. “Ela transitava entre vários momentos históricos e cortes, sempre ao lado do poder”, disse Cláudia a VEJA.

No plano político, Amélia foi uma estrategista. Ainda no Brasil, sugeriu ao marido se aproximar do Partido Brasileiro, insatisfeito com o aceno do imperador ao Partido Português. Na Europa, Amélia cuidou da enteada Maria da Glória, filha de Leopoldina, em Paris, enquanto dom Pedro, então duque de Bragança, lutava contra seu irmão, dom Miguel, para garantir a manutenção da coroa. Pedro venceria a disputa. A filha viraria Maria II, rainha de Portugal, de 1834 a 1853.

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Como mãe, Amélia foi responsável pelos herdeiros do trono brasileiro e português. E assumiu o papel com primor. Dom Pedro II, com quem conviveu por pouco tempo, mas trocou cartas e afetos por toda a vida, chamava-a de mamãe. Garantiu que sua única filha, Maria Amélia de Bragança, completasse o ensino superior, naquela época proibido para mulheres, mesmo as mais abastadas. Graças a seu esforço, a princesa tornou-se, simultaneamente, a primeira brasileira a se formar em física e astronomia. “Ela conseguia burlar o sistema e fazer as coisas acontecerem da forma que acreditava”, diz Cláudia.

A PRIMEIRA - A imperatriz Maria Leopoldina: disputa com a amante, a futura marquesa de Santos
A PRIMEIRA - A imperatriz Maria Leopoldina: disputa com a amante, a futura marquesa de Santos (Museu de História da Arte-Viena//)

Dito de outro modo, com o perdão da expressão contemporânea: ela era uma influencer dos tempos de im­pério no Brasil. Lançava tendências. Obce­ca­da pelo cor-de-rosa, antecipou em séculos a febre da barbiemania. Sua chegada ao Rio de Janeiro esgotou os estoques de tecidos rosáceos, comprados por mulheres da corte que desejavam recepcioná-la em bom-tom. E mais: depois de romper com a marquesa de Santos, louquinho para passar a borracha no passado, Pedro I instituiu na nobreza brasileira a Ordem da Rosa, cujo lema era “Amor e Fidelidade”. À mesa, popularizou o cafezinho forte depois do almoço, que antes era consumido pela manhã e muito mais fraco. Também ditou moda nos casamentos, como mostra a pintura de Debret retratando as núpcias com Pedro (imagem em destaque). Vestiu-­se de branco, como aconteceria na maioria das bodas dali para a frente. Sempre se imaginou que o costume tivesse sido lançado pela rainha Vitória(1819-1901). Amélia fez antes.

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Esperta e fascinante, como se extrai da biografia, Amélia antecipou a toada do mote que Tomasi di Lampedusa, o autor de O Leopardo (1958), criou para a aristocracia siciliana do século XIX: “Se queremos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude”. Amélia mudava para deixar tudo como antes, a um só tempo delicada e audaz, embora quase adolescente. “Era uma pessoa determinada, cuja desenvoltura soava atrelada à coragem de ter enfrentado o mar para chegar ao Brasil”, diz Paulo Rezzutti, biógrafo da família imperial. Amélia merece mais luz.

Publicado em VEJA de 8 de setembro de 2023, edição nº 2858

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