Duca Rachid assume desafio de ‘mostrar o Brasil como ele é’
Autora de ‘Amor Perfeito’, da TV Globo, conversou com a coluna
Autora de Amor Perfeito, novela que se passa nos anos 1940 numa cidade fictícia do interior de Minais Gerais, Duca Rachid apresenta muitos temas atuais. O folhetim mostra a saga de um garoto criado num mosteiro para encontrar a mãe. Dona de dois Emmy’s (Joia Rara, de 2014; e Órfãos da Terra, de 2020), a autora comenta, em conversa com a coluna, os desafios de apresentar diversidade no audiovisual – seu elenco é majoritariamente negro – um feito e tanto nas produções de TV sempre marcadas por atores brancos.
Depois de dois Emmys, o desafio aumenta quando começa a escrever novo trabalho? O desafio é sempre o mesmo. Nunca faço uma novela pensando nos prêmios. É sempre um risco fazer novela. Estou nessa vida há 24 anos, a gente faz com a melhor das intenções, querendo que o resultado seja o melhor possível, mas também não posso garantir. Não dá para pensar em repetir um fenômeno, como Cordel Encantado, por exemplo. Fenômeno é fenômeno.
Como é trabalhar o tema da representatividade em Amor perfeito? A gente foi fazer uma pesquisa histórica e conceituou a novela em função dessa pesquisa. A gente levantou toda uma iconografia negra e descobriu que a elite negra sempre existiu no Brasil, só ficou escondida debaixo da narrativa hegemônica do Sul e do Sudeste. Foi surpreendente, nem eu conhecia. A gente achou interessante resgatar isso, trazer brasilidade à novela, mostrar o Brasil como ele realmente é, com todas as cores que tem. A ideia da novela não é falar da questão racial, mas é mostrar um Brasil que sempre existiu.
Não vai tratar diretamente da questão do racismo mesmo tendo vários atores negros? A gente não vai esconder o racismo, ele existe. Os personagens estão aí, vão reagir a isso, mas não estão ali especificamente para sofrer o racismo e a gente discutir sobre isso. Não dá para esconder e não é possível esconder, né?
Sua novela só é possível graças a esse novo contexto político? Não, acho que (a pauta da diversidade) começou muito antes, até antes da era Bolsonaro.
Esta preocupação com diversidade é uma virada de chave na teledramaturgia da Globo? É um caminho sem volta, a gente tem que se assumir como brasileiro. Nós somos isso (que era mostrado), entende? A cultura negra nos perpassa. Eu como feijoada, eu vou no terreiro… A gente tem que se assumir como brasileiro, naturalizar todo mundo num outro lugar social.
É também uma forma de fazer com que a novela vença a briga do streaming? Acho que muito do streaming vive em função da novela. As grandes audiências da Globoplay são novelas. Eu não sei se dá para brigar com o streaming. A ideia não é essa. Mas que a novela ainda é uma grande força nesse país, isso é verdade. Muita gente não tem streaming, não consegue pagar, não tem acesso a internet de qualidade. Novela ainda tem grande força para falar com essas milhões de pessoas.