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Carol Trentini fala de cotas em passarelas e etarismo no mundo da moda

Modelo gaúcha, com mais de 21 anos de carreira, conversa com VEJA

Por Valmir Moratelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 Maio 2024, 15h12 - Publicado em 3 Maio 2024, 07h00

Uma das brasileiras com maior solidez na carreira em passarelas internacionais, Carol Trentini, 36 anos, já realizou trabalhos para grifes como Dolce & Gabbana, Gucci, Dior e Versace, entre outras. Mãe de Bento e Benoah, 10 e 7 anos, respectivamente, a modelo segue no circuito, mas também se dedica a uma grife de moda infantil. Em conversa com a coluna GENTE, ela fala de etarismo, cota para corpos fora do padrão em passarelas, da chegada de influenciadoras e da pressão do mercado por uma nova Gisele Bündchen.

Onde está a ausência do glamour nesses 21 anos de carreira? É engraçado, porque o glamour e o não glamour às vezes estão na mesma situação, no mesmo trabalho, no mesmo cliente. O não glamour é o trabalho duro por trás de tudo. Perder alguma coisa importante de outra área da minha vida, que é a maternidade, para me dedicar à carreira. Sempre fui muito de equilibrar tudo, mas nem sempre a gente consegue. Confesso que não é nada glamoroso sair de casa às 4h da manhã, deixando o filho com febre, para exercer a profissão.

Quando você começou, as redes sociais não existiam. Como lida hoje com a pressão dos seguidores? Tenho a sorte de não ter nascido nesse mundo (conectado). Já tenho 36 anos. Consigo enxergar pela perspectiva de uma pessoa que viveu antes disso. E tento exercer meu papel de “quanto mais real, melhor”. Expor-se, claro que é sim glamoroso, a moda é glamorosa, mas também é real, sofrida, tem altos e baixos. Não uso muito filtro em fotos, por exemplo. Uma dica: te olhe no espelho, não na tela do teu celular.

A rede social potencializa a cobrança de um padrão? Com certeza, uma coisa é falar com o público de mulheres, outra coisa com o público de meninas de 12, 13, 15 anos, que estão formando a personalidade, caráter, autoimagem. Elas entendem que são mais bonitas com filtro ou maquiadas. É extremamente perigoso. A gente precisa usar a nossa voz para isso. No meu trabalho, tenho o papel de vender às vezes uma coisa que não sou, uma roupa que não usaria, só que é uma arte. Não é quem eu sou na realidade.

Você busca uma personagem para passarelas e campanhas de moda? É isso, faço arte. As pessoas questionam muito do que o mundo digital trouxe, os influenciadores, são trabalhos completamente diferentes do meu. O meu trabalho é vender uma imagem, um sonho, que vai despertar o teu inconsciente, não necessariamente só aquela roupa para você comprar.

As influenciadoras não estariam fazendo o papel das modelos, ao tentarem ditar moda? As modelos nunca tentaram ditar moda. As modelos sempre vestiram a moda. Naomi (Campbell) em um backstage não era a mesma Naomi da passarela. A gente veste e vende um produto de maneira artística, desperta algo além do que a imagem quer dizer. Nosso trabalho vai mais para criação, menos para o imediatismo das influencers.

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Quanto de culpa tem a indústria da moda por potencializar estereótipos do corpo feminino? Não é só a moda que é culpada. A sociedade como um todo tem que assumir essa culpa. Está tudo enraizado em todos nós: o machismo, o racismo, o capacitismo… Culpa carrega quem não tenta enxergar isso para mudar.

Já se sentiu estereotipada? Cheguei num momento que meu perfil estava muito em alta. Tive privilégio de me encaixar naquele perfil que a moda precisava. Mas tenho uma autoanálise de sempre me enxergar nos meus privilégios. Estou educando dois homens na minha casa, meu papel é gigantesco. Eles fazem parte da mudança, quero um mundo melhor para meus filhos.

Tem um movimento forte de diversidade no mundo da moda, inclusive com cotas. É a favor? Vamos analisar. Todo mundo está se sentindo representado? Se a resposta for não, precisamos, com certeza. Sou a favor de cota de diversidade, de cor, de shape. A gente precisa se sentir visto, precisa olhar para aquele produto, aquela passarela e se sentir representado. Representatividade importa em qualquer lugar: na moda, na política, no esporte, na televisão…

Você falou há pouco uma frase forte: ‘já tenho 36 anos’. Pesa a idade? Para uma pessoa que começou com 14, numa carreira que, com 25 não pode mais ser modelo, é normal. Mas obrigada por pontuar essa frase. O ideal é falar ‘sou apenas uma mulher de 36 anos’. A pressão sempre existe. Fui mãe com 26 anos, com a noção de que talvez não voltaria para o mundo da moda. Mas estou aqui ainda, com o meu lugar de fala, fazendo trabalhos importantes.

Já sofreu etarismo? Não. Em passarela, vejo muita modelo da minha geração, que trabalha, presente nos desfiles, e modelos mais velhas também, com 45, 50 anos. Sei do meu espaço, sei do meu valor.

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Pensa em carreira artística? Estou muito feliz onde estou. Tenho uma marca de roupa infantil chamada Benbini, estou explorando esse mundo com muita calma, dando um passo de cada vez. Não preciso de um plano B. Faço uma moda brasileira, mão de obra brasileira, tecidos sustentáveis. É uma slow fashion voltado para crianças.

Os seus filhos são inspiração? Eles são os modelos de provas (risos). Eles que vão sempre me falar, têm uma personalidade única. Eles se encarregam do jeito que acham interessante nas roupas.

Há uma pressão para aparecer uma nova Gisele Bündchen. Aponta alguma candidata? Ela é única, não tem como ter uma nova Gisele. Ao mesmo tempo, tem espaço para todo mundo. Quando cheguei, eu olhava revistas e não falava ‘quero ser essa pessoa’. Virar referência, inspiração, é diferente de ter pessoas que querem ser você. É clichê, mas todo mundo é único. Onde ela chegou é só dela. O Pelé é único, o Ayrton Senna é único, a Gisele é a única.

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