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Jornalismo contra a desinformação
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Senador ironiza dados de instituto para desacreditar pesquisas eleitorais

Flávio Bolsonaro compartilhou pesquisa Datafolha de agosto de 2018 para sugerir falta de precisão, mas levantamento não é previsão de resultado das eleições

Por Da Redação Atualizado em 4 jun 2024, 12h22 - Publicado em 30 ago 2022, 09h34

Post do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) engana ao sugerir que dados do Datafolha são imprecisos. Para isso, ele utiliza reportagem do portal G1, de agosto de 2018, mostrando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como líder nas pesquisas eleitorais daquela eleição para presidente. O conteúdo não leva em consideração que pesquisas eleitorais não são uma previsão do resultado, mas um recorte das intenções de voto em um determinado momento. Posteriormente, Lula foi impossibilitado de concorrer ao pleito e Jair Bolsonaro, então no PSL, esteve em primeiro lugar nas análises seguintes. A pesquisa boca de urna do instituto mostrou Bolsonaro com 45% das intenções de voto e Fernando Haddad, candidato do PT em 2018, com 28%. O resultado oficial foi de 46,03% dos votos para Bolsonaro e 29,28% para o petista.

Conteúdo investigadoPublicação do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) com print de matéria do G1 a respeito de pesquisa do instituto Datafolha, em agosto de 2018. A imagem mostra o ex-presidente Lula (PT) com 39% das intenções de voto e Jair Bolsonaro (à época no PSL), com 19%, além de dados dos demais candidatos. O senador destaca com um quadro amarelo as informações relativas aos dois candidatos mais bem pontuados, bem como a data e o horário da divulgação do levantamento. O post é acompanhado da legenda: “DataFolha como sempre muito preciso! Kkkk Em 22 de agosto de 2018, eles davam 39% para o ladrão (que estava preso), e 19% para Bolsonaro e o final vocês já sabem!”.

Onde foi publicado: Instagram.

Conclusão do Comprova: É enganosa a postagem de Flávio Bolsonaro sugerindo que as análises feitas pelo instituto Datafolha são imprecisas. O político utiliza uma matéria do portal G1, de 22 de agosto de 2018, em que Lula aparecia com 39% das intenções de voto, enquanto Bolsonaro estava com 19%, para tentar tirar a credibilidade de pesquisas eleitorais e induzir a uma ideia de que as análises atuais não retratam a realidade.

Ouvido pelo Comprova, Daniel Bramatti, jornalista e responsável pela análise de pesquisas eleitorais no Estadão desde 2010, comenta que o fato da pesquisa não mostrar Bolsonaro à frente naquele momento não indica erro ou uma imprecisão. “Pesquisa não é previsão de resultado, é uma fotografia do momento. Não é previsão do resultado nem quando é feita na véspera da eleição”, afirma.

A mesma pesquisa Datafolha do dia 22 de agosto também mostrou um cenário sem o ex-presidente Lula, que estava preso, e com Fernando Haddad, candidato do PT que disputou aquele pleito, em seu lugar. Nesse cenário, Bolsonaro liderava com 22% das intenções de voto e Haddad tinha apenas 4%. No dia 31 de agosto, o TSE barrou a candidatura de Lula.

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A consulta em questão foi a última com Lula entre as opções para os entrevistados. Bolsonaro esteve em primeiro lugar nas intenções de voto de todos os levantamentos do Datafolha divulgados a partir daquela data.

A pesquisa de boca de urna chegou a registrar crescimento dos dois candidatos: Bolsonaro pontuou 45%, e Haddad aparecia com 28%. O resultado das urnas foi compatível com essa última sondagem. O então candidato do PSL teve 46,03% dos votos e o petista teve 29,28%.

Enganoso para o Comprova é qualquer conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos que obtêm maior alcance nas redes sociais. Até o dia 26 de agosto, a publicação feita pelo senador em seu perfil no Instagram acumulava mais de 39,9 mil curtidas e passava dos 5,6 mil comentários.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com a assessoria do senador Flávio Bolsonaro, que não retornou até o fechamento desta verificação..

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Como verificamos: Inicialmente, fizemos uma busca no Google com o título da reportagem descrito na publicação feita pelo senador. A procura retornou a matéria publicada pelo G1, mostrando que, de fato, o levantamento do Datafolha foi divulgado na data indicada e os resultados eram verdadeiros.

A reportagem também procurou pela pesquisa em questão no site oficial do Datafolha, que disponibiliza todos os levantamentos sobre eleições feitos desde 1992. Ali, encontramos a íntegra da pesquisa divulgada em 22 de agosto de 2018, e verificamos que o instituto também perguntou aos entrevistados sobre um cenário eleitoral com Fernando Haddad em vez do ex-presidente Lula.

Depois de ler a íntegra da pesquisa que aparece na publicação, verificamos as pesquisas do Datafolha divulgadas nas semanas e meses seguintes, entre agosto e outubro de 2018, até a votação de segundo turno. Em seguida, comparamos as pesquisas publicadas na véspera e na boca de urna do primeiro e segundo turnos com o resultado das eleições daquele ano

Print e números publicados por senador são reais

A imagem compartilhada pelo senador Flávio Bolsonaro no Instagram destaca uma manchete do portal G1, cuja reportagem foi publicada em 22 de agosto de 2018. A matéria detalhou os números obtidos em levantamento do instituto Datafolha relativo à corrida presidencial daquele ano.

Na ocasião, o instituto apurou os percentuais de intenção de voto em dois cenários distintos, sendo o primeiro com o ex-presidente Lula e um segundo cenário com o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT).

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Também foram analisadas as intenções de voto dos candidatos por diferentes segmentos: sexo, faixa etária, escolaridade, renda familiar, regiões do país e religião.

Os números que aparecem na imagem compartilhada pelo político correspondem aos dados apurados pelo Datafolha naquela ocasião. Apesar de trazer informações reais na postagem, o senador acrescenta à publicação uma frase que ironiza o conteúdo, em uma clara tentativa de descredibilizar o levantamento e o próprio instituto de pesquisa.

Pesquisa em questão trazia dois cenários

A mesma pesquisa Datafolha do dia 22 de agosto também mostrou um cenário sem o ex-presidente Lula, e com Haddad em seu lugar. Nesse cenário, Bolsonaro liderava com 22% das intenções de voto e Haddad tinha apenas 4%. Na análise sem Lula, o número de eleitores que declararam votos em branco e nulos também era de 22%, o que superava as intenções de voto em Marina Silva (16%), Ciro Gomes (10%) e Geraldo Alckmin (9%) – todos à frente de Haddad naquele momento. Lula ainda constava como presidenciável nas pesquisas, pois o PT havia registrado seu nome como candidato do partido. O TSE decidiu barrar sua candidatura apenas no dia 31 de agosto daquele ano, ou seja, nove dias depois da divulgação da pesquisa.

Assim, a pesquisa do dia 22 de agosto de 2018 foi a última em que o nome do ex-presidente Lula apareceu entre as opções para os entrevistados. Bolsonaro apareceu em primeiro lugar nas intenções de voto de todos os levantamentos do Datafolha divulgados a partir dali.

A sondagem seguinte do instituto para a eleição nacional foi divulgada no dia 11 de setembro, cerca de dez dias após a decisão do TSE. Naquela data, Bolsonaro aparecia isolado na liderança, com 24% das intenções de voto, e quatro candidatos empatados tecnicamente no segundo lugar: Ciro Gomes (13%), Marina Silva (11%), Geraldo Alckmin (10%) e Fernando Haddad (9%). Entre a pesquisa feita no fim de agosto e aquela divulgada em 11 de setembro, Bolsonaro sofreu o atentado a faca em Juiz de Fora (MG) e passou as semanas seguintes hospitalizado. Nos dias seguintes, as sondagens do Datafolha mostraram uma tendência de crescimento contínuo nas intenções de voto em Bolsonaro. Ele pontuou 26% na pesquisa divulgada em 14 de setembro, depois 28% no dia 19 – resultado que ele manteve no dia 28 daquele mês.

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Haddad também cresceu nas pesquisas de intenção de voto no mesmo período. O Datafolha mostrou o petista com 13% na pesquisa estimulada de 14 de setembro, e ele chegou a 22% na sondagem divulgada no dia 28 – neste dia, isolando-se pela primeira vez na segunda colocação.

Pesquisas na véspera e boca de urna coincidiram com o resultado das eleições

Na véspera da votação em primeiro turno, no dia 6 de outubro, Bolsonaro aparecia com 40% das intenções de votos válidos e Haddad tinha 25%, segundo o Datafolha. Já a pesquisa de boca de urna, feita após a votação, chegou a registrar crescimento dos dois candidatos: Bolsonaro pontuou 45%, e Haddad aparecia com 28%. O resultado das urnas foi compatível com essa última sondagem.

O então candidato do PSL teve 46,03% dos votos e o petista teve 29,28%, portanto o resultado divulgado pelo TSE ficou dentro da margem de erro (de dois pontos percentuais, para mais ou para menos) da última pesquisa divulgada pelo Datafolha antes da apuração dos votos.

O mesmo se repetiu no segundo turno da eleição presidencial. No dia 27 de outubro, véspera da votação, o Datafolha apontava Bolsonaro com 55% das intenções de voto e Haddad com 45%. O resultado apurado pelo TSE foi de 55,13% para o candidato do PSL e 44,87% para o petista.

Funcionamento de pesquisas eleitorais

O Projeto Comprova explicou recentemente como funciona uma pesquisa eleitoral, que busca apontar as intenções de voto no momento em que é realizada. Utilizando uma amostra cientificamente calculada para representar a população brasileira, a pesquisa eleitoral consegue representar o grupo como um todo e evitar vieses que possam prejudicar a interpretação da realidade.

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É considerada uma série de critérios, também chamados de variáveis, para aproximar o grupo de entrevistados da composição real da população, como raça, gênero, escolaridade e ocupação. As variáveis usadas podem diferir entre os institutos de pesquisa. O Comprova também mostrou que as pesquisas eleitorais retratam os resultados obtidos no momento em que elas foram realizadas. Como são feitas por amostragem e não trazem resultados absolutos, as pesquisas apresentam as margens de erro, que incluem essa possível oscilação nos resultados. Para eliminar essa margem de erro, seria necessário entrevistar todas as milhões de pessoas com idade para votar na cidade, estado ou país, o que é inviável.

Daniel Bramatti, responsável pela análise de pesquisas eleitorais no Estadão desde 2010, explica que existe um cálculo estatístico para definir o tamanho da amostra de acordo com a precisão desejada para a pesquisa.

“Se quiser uma pesquisa mais precisa, com menos margem de erro, a sua amostra vai ter que ser um pouco maior. Se não tiver condições de fazer com uma amostra muito grande, vai ter um cálculo para definir qual vai ser a sua margem de erro e se ela é aceitável para o que se está buscando. As pesquisas no Brasil buscam uma margem de erro máxima de 3 pontos percentuais, muitas com 2 pontos percentuais. Isso depende do número de entrevistados. Então, quanto maior o número de entrevistados, menor a margem de erro e maior o intervalo de confiança – ou seja, a sua certeza de que ao fazer a pesquisa ela vai dar resultados que venham dentro da margem de erro esperada”, explica o especialista.

Em relação à postagem feita por Flávio Bolsonaro, Bramatti afirma que não há nada indicando que a pesquisa Datafolha estava errada: “O fato de a pesquisa de agosto não mostrar o Bolsonaro na frente ou não mostrar que ele venceria, não quer dizer nada. Simplesmente pesquisa não é previsão de resultado. Pesquisa é uma fotografia do momento em que ela é realizada”.

Ele ressalta que a definição de intenção de voto tem ficado cada vez mais para o último momento e pode ser alterada até no dia da votação. Além disso, a decisão do eleitor passa pela influência de redes sociais e do círculo social, o que pode gerar mudanças de última hora.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de Covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. Com a proximidade da eleição, as pesquisas eleitorais têm sido alvo ainda mais frequentes de críticas e questionamentos, especialmente de candidatos insatisfeitos com suas posições nos resultados de intenção de voto. Conteúdos de desinformação sobre pesquisas podem prejudicar o processo democrático uma vez que confundem a população ao tentar descredibilizar as análises. É importante, portanto, que os eleitores tenham acesso a informações verídicas sobre as pesquisas, que seguem um método científico e buscam eliminar possíveis distorções e vieses.

Outras checagens sobre o tema: Conteúdos de desinformação que tentam colocar em xeque as pesquisas eleitorais costumam circular com frequência nas redes sociais. O Comprova já mostrou que vídeo faz alegações enganosas para colocar em dúvida credibilidade das pesquisas, além de ter produzido um material explicativo para mostrar que pesquisas eleitorais seguem métodos científicos, ao contrário de enquetes.

Conteúdo recente publicado pelo Aos Fatos também detalha como são feitas as pesquisas eleitorais.

A investigação deste conteúdo foi feita por VEJA, CBN Cuiabá e Metrópoles, e a verificação por A Gazeta, Plural Curitiba, CNN Brasil, O Dia, e SBT

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