‘Trazemos um olhar novo’, diz Paulo Silvestrini, diretor de ‘Vale Tudo’
Ele fala sobre o desafio de se equilibrar entre a reverência ao passado e a adaptação ao Brasil do presente no remake da Globo

Como dirigir um remake de Vale Tudo, uma novela que marcou tanto a memória afetiva do Brasil nos anos 1980? Eu queria muito contemplar o público que não viu e o público que viu. Então, procurei fazer uma novela nova, mas que quem assistisse e tivesse visto a original pudesse sentir que ela ainda estava lá de alguma maneira. Não tratamos as questões da mesma forma, mesmo aquelas que se mantiveram iguais nesses 37 anos — a maneira como as olhamos hoje é diferente de como víamos as pautas da sociedade de 1988. Muito foi ressignificado e coisas novas surgiram. Quisemos trazer um olhar novo, um olhar contemporâneo para tudo que mostramos na novela.
Não é uma ideia temerária fazer um remake de um sucesso do tamanho de Vale Tudo? Tem uma coisa que eu costumo falar sobre um clássico, que é: clássico é aquela coisa que sempre que você lê ou vê, ele faz sentido. Eu queria muito que as pessoas olhassem para essa novela e tivessem essa impressão. Que mesmo quem já viu olhasse e falasse: “Pô, tô vendo essa novela agora”. Ao mesmo tempo, queria que tivessem no coração esse quentinho de “conheço isso”.
Como procurou traduzir isso na tela? Eu fiz Vale Tudo com muita atenção às características que tornaram esse gênero uma coisa tão querida e tão importante para o brasileiro. Por isso fiz dela uma novela no melhor sentido. Não queria que tivesse cara de série, não queria que tivesse cara de filme. E são sessenta anos de TV Globo, nossa primeira novela foi feita em 1965. Eu queria muito que a gente de alguma forma celebrasse o que a Globo faz melhor.
Algumas tramas recentes da Globo foram criticadas justamente por tentar imitar as séries americanas. Hoje ainda é possível fazer uma novela sem medo de ser novela? Eu não tenho medo de fazer novela: tenho orgulho, porque não existe um produto de dramaturgia audiovisual tão identificável com o brasileiro. A identidade do brasileiro passa pelas novelas da Globo, com certeza.
E a perda do público das novelas nos últimos tempos, como afetou seu trabalho? A gente valoriza o público que tiver, porque eu considero o povo brasileiro um parceiro. Sempre que faço uma cena de Vale Tudo, eu faço pensando de que maneira o povo brasileiro vai respeitar, vai receber isso.
Qual a forma de buscar essa conexão? Procuro fazer respeitosamente, atento às sutilezas, aos detalhes, às delicadezas que são caras e importantes para o público, para quem recebe nosso trabalho na sala da casa deles. Sou um pouco entusiasmado, porque estou encantado com isso que a gente faz aqui.
Publicado em VEJA de 11 de abril de 2025, edição nº 2939