Michael J. Fox fala a VEJA sobre documentário: ‘Foi catártico’
Queridinho de Hollywood nos anos 80, ator olha com humor para o passado e descreve a vida com o duro diagnóstico de Parkinson
Em um quarto de hotel, em 1990, o ator Michael J. Fox, então aos 29 anos, acorda sozinho e de ressaca após uma noite de bebedeira desenfreada com o amigo Woody Harrelson. Assimilando onde está, o canadense levanta a mão para bloquear o raio de sol que invade o cômodo e nota um movimento estranho: um dedo mindinho se mexendo involuntariamente. O que ele pensa ser apenas o reflexo de um corpo cansado, na verdade, é um penoso presságio: o primeiro indício da doença de Parkinson — condição neurológica degenerativa que afeta a mobilidade e a fala —, que o acompanharia dali em diante. No documentário Still: Ainda Sou Michael J. Fox, da Apple TV+, o ator, hoje aos 61, sem apelar para o melodrama, detalha a terrível descoberta, como escondeu a situação do público para seguir trabalhando e revisita com ternura sua ascensão em Hollywood, interrompida justamente pela doença.
Desde 1998, quando revelou ao público o drama, Fox comove admiradores. Em 2020, anunciou sua aposentadoria, após perder a confiança em sua fala. No ano passado, fez aparição emocionante na Comic Con de Nova York, subindo no palco com dificuldade para participar de um painel com Christopher Lloyd, o Dr. Emmett Brown na saga pop De Volta para o Futuro. Agora, o intérprete de Marty McFly se abre em uma produção que costura os fatos de sua trajetória com retalhos dos filmes e séries que estrelou, a fim de mostrar que a doença, por mais trágica que possa ser, não o impede de viver com humor e um forte senso de propósito: Fox é um ativista incansável na busca por uma cura para o Parkinson. Desde 2000, financia uma organização que leva seu nome para encontrar uma cura. “Minha habilidade de expressar criatividade e sentimentos foi diminuindo ao longo do caminho. Não posso fazer certas coisas que costumava, mas ainda posso contar minha própria história”, contou Michael J. Fox a VEJA (leia mais abaixo).
Coisas Engraçadas Acontecem no Caminho Para o Futuro
Com apelo nostálgico, o documentário equilibra bem o humor do ator carismático e sua amável família com Tracy Pollan — com quem é casado desde 1988 e tem quatro filhos — com suas mazelas, como o alcoolismo provocado pelo diagnóstico e até acidentes nas gravações, que resultaram em mão e rosto fraturados. “Michael é cheio de otimismo, teve muitas quedas, mas sua atitude é ver o lado positivo das coisas, o que é contagiante”, ressaltou a VEJA o diretor do documentário, Davis Guggenheim. A obra também resgata o adolescente que decidiu largar os estudos para ser ator. Seu pai, um policial reformado cético, surpreendentemente embarcou na aventura e o levou para Los Angeles. O jovem de belos olhos azuis e 1,63 metro de altura roubou a cena na sitcom Caras e Caretas (1982-1989), pela qual faturou seu primeiro Emmy, além de blockbusters, como Teen Wolf (1985). Nada que se compare, claro, ao sucesso da trilogia De Volta para o Futuro. Agora, no novo filme, o irrequieto artista encara de forma corajosa e sem dramas o presente.
“Fazer esse filme foi catártico”
Em entrevista a VEJA, Michael J. Fox fala sobre a decisão de eternizar sua história de vida em um documentário.
Pop! De Volta Para O Futuro – Marty Mcfly
Por que sentiu necessidade de fazer este documentário agora? Nos últimos anos, sinto que minha habilidade de expressar criatividade e sentimentos foi diminuindo ao longo do caminho. Não posso fazer certas coisas que costumava fazer, mas ainda posso contar histórias, e o que poderia ser melhor do que contar a minha própria história?
O filme faz uma retrospectiva de sua vida e carreira desde a infância. Como foi revisitar esse período prévio ao Parkinson? Uma das melhores coisas desse projeto foi poder parar para refletir sobre o que iríamos iluminar. Foi ótimo poder mostrar como eu tinha esse senso imparável para fazer as coisas na infância e juventude.
Teve medo de expor algo delicado da doença? Foi chocante ver como meu rosto fica inexpressivo nos momentos em que me dá um branco, porque eu não sei como outros me veem, mas isso não me incomoda. Eu só não esperava cair e me acidentar durante as gravações, mas todo o processo foi muito catártico, não censurei a equipe de filmagem em nenhum momento e a deixei capturar tudo.
Qual parte do retrato de seu passado o emociona mais? O que mais me afeta quando o assisto não é toda a tragédia, luta e conflitos da doença, e sim a minha família, ver essas pessoas maravilhosas, inteligentes, engraçadas que me mantêm vivo e ligado. Minha esposa é um milagre, a forma como ela me ajuda nas coisas mais simples é incrível.
Se pudesse voltar no tempo, qual momento gostaria de reviver? Quando meu pai, pragmático e cético, aceitou que eu largasse a escola para atuar. Ele poderia ter negado, mas me apoiou e mudou a minha vida.
Publicado em VEJA de 17 de maio de 2023, edição nº 2841
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