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Advogada atende exclusivamente mulheres em ‘escritório feminista’

'Homens ligam para dizer que as esposas estão erradas, que estão loucas. Eles acham que podem simplesmente fazer isso", conta Gabriela Souza, 31

Por Paula Sperb
Atualizado em 7 jun 2018, 17h33 - Publicado em 7 jun 2018, 16h10

Tomando café na beira da praia em Florianópolis, em um raro momento de folga da rotina de advogada, a gaúcha Gabriela Souza, 31, teve a ideia que estava buscando para dar novo sentido à profissão escolhida: utilizar seu trabalho para ajudar mulheres em casos de violência doméstica, divórcios litigiosos com pressão psicológica do parceiro e questões mais rotineiras que envolvem direito do consumidor, por exemplo. No Rio Grande do Sul, os assassinatos de mulheres aumentaram 90% em dez anos.

Gabriela decidiu que, ao retornar a Porto Alegre após o final de semana em Santa Catarina, pediria demissão do escritório de advocacia onde trabalhava e abriria um escritório feminista para atender exclusivamente mulheres. Um ano e meio depois, o escritório Gabriela Souza – Advocacia para Mulheres já atendeu mais de 300 mulheres e é o primeiro da região Sul nesse modelo. Agora, já existem escritórios nos mesmos moldes em outras cidades. “Nossa ideia é que o modelo se prolifere, que tenha um em cada esquina, porque a gente precisa”, defende.

“Atendemos muitos casos pesados. Semanalmente nos deparamos com questões de estupro, agressões e assédio no ambiente de trabalho. Mas não é só isso, tem o lado do direito comum. É como se nós, mulheres, esquecêssemos que temos tantos direitos quantos os homens. A maior parte dos processos é ajuizado por homens que, historicamente, se sentem mais detentores dos direitos. As mulheres acham que, ao processar, estão incomodando. Mas somos trabalhadores e pagamos tributos tanto quanto homens”, relata a advogada.

A profissional explica que, mesmo em processos comuns, a desigualdade de gênero está presente. “A questão de gênero sempre está envolvida. O marido diz para a mulher que é bobagem ela buscar seus direitos. Por isso, quando o gênero não é a principal questão, acaba estando presente como uma questão secundária”, explica.

Casos curiosos ocorrem no escritório. “Nunca tinha acontecido comigo, mas agora homens ligam para cá para dizer que as esposas estão erradas, que estão loucas. Eles acham que podem simplesmente fazer isso”, conta. O escritório já foi chamado por homens de “Clube da Luluzinha” e teve até advogado que se ofereceu para trabalhar ali para que “as clientes se sentissem mais seguras”.

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O ambiente feminista, porém, não significa que a equipe não tolere os homens. “Não odiamos homens, isso tem que ficar bem claro. Sou casada com um há onze anos e o amo demais e assim é com as outras mulheres. Mas aqui temos um atendimento especializado”, explica Gabriela.

A necessidade desse atendimento especializado foi constatada também por meio de pesquisa que a advogada realizou antes de inaugurar o escritório. “Muitas mulheres me falavam que já tinham buscado auxílio jurídico e se sentiram julgadas, diminuídas. Contavam do assédio sofrido e ouviam de volta: ‘Ah, não processa porque não pode provar’. Elas relatavam que o linguajar jurídico assustava, que a ideia de um homem explicar tudo não agradava mais. Entrevistei 50 mulheres e entendi que, além de um serviço de qualidade, elas precisariam entender o atendimento. Aprendi com uma experiência em defensoria pública a descomplicar a linguagem para as pessoas”, diz.

Ela explica que todas as clientes preenchem um cadastro indicando uma amiga “anjo” para referência, especialmente nos casos de violência doméstica. Em casos delicados, o escritório indica o acompanhamento de uma psicóloga e orienta, por meio de uma cartilha, como agir após a entrada de uma medida protetiva contra o agressor, por exemplo. “A gente pede para elas ficarem acompanhadas nos dias seguintes ao pedido de protetiva, que liguem para o 190 se o agressor tentar contato”, explica.

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O desejo de Gabriela, entretanto, é que nenhum desses cuidados especiais fossem necessários. “Meu sonho é que chegue em um ponto em que se atinja a igualdade e não precise mais [atendimento especializado]. Mas ainda é um caminho longo e complicado. Mas, enquanto existir essa diferença, vamos atuar”, afirma.

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