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Reinaldo Azevedo

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A morte de José Eduardo Dutra e os limites que não devem ser ultrapassados

Que tipo de gente vai a um velório, como ocorreu com o de José Eduardo Dutra, para deixar panfletos com a inscrição “Petista bom é petista morto”? Entendam: ainda que alguém pense isso — e as pessoas têm o direito de pensar as coisas mais brutais —, não diz porque é moralmente indecoroso, independentemente de […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 00h22 - Publicado em 5 out 2015, 21h07

Que tipo de gente vai a um velório, como ocorreu com o de José Eduardo Dutra, para deixar panfletos com a inscrição “Petista bom é petista morto”? Entendam: ainda que alguém pense isso — e as pessoas têm o direito de pensar as coisas mais brutais —, não diz porque é moralmente indecoroso, independentemente de escolha ideológica. Romper essa fronteira do decoro corresponde a romper também um pacto de civilidade.

Ninguém melhora nem piora porque morre: petista ou antipetista, corintiano ou palmeirense, flamenguista ou vascaíno. Mas é preciso ter senso de limite.

Já relatei aqui a experiência. Em 2006, tive de extrair dois tumores do crânio. Um deles me conferiu aquela cova de golfinho do no alto da testa. Os petralhas fizeram, então, uma corrente torcendo pela minha morte. A agressão mais simpática, até engraçada, afirmava que os médicos haviam arrancado o meu cérebro e posto no lugar os tumores.

Um rapaz que fazia um site do então presidente Lula, contratado do Palácio do Planalto, escreveu que eu só tinha tido os tumores porque estava sendo punido pelo meu reacionarismo e porque eu era contra a legalização da maconha. Creio que tivesse queimado muito mato. Não entendi nada.

Eu me importava pouco comigo mesmo quanto a essas correntes — Dutra, então, nem ficou sabendo da baixaria. E assim era não por qualquer senso de desapego. Achava aquilo tudo de mau gosto e pronto; burro mesmo! Mas há as pessoas a quem você ama e que o amam. Elas ficam justamente magoadas. Sofrem. Sentem-se agredidas.

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Não contem comigo jamais para condescender com algo parecido. E não porque tenha acontecido comigo, mas porque tenho limites.

Fui coordenador de Política da Sucursal da Folha em Brasília, em 1994. Almocei com Dutra umas quatro ou cinco vezes num dos bandejões do Congresso. Era um sujeito inteligente e cordial no trato. Mas aqueles eram tempos em que o PT estava na oposição, e os jornalistas, mesmo eu não sendo da turma, eram vistos como “companheiros”.

Depois ele adotou o padrão petista de confronto com a imprensa. Andamos nos estranhando no Twitter não faz tanto tempo, há coisa de uns dois anos. Depois, não mais. Confesso que nem sabia da gravidade de seu estado de saúde.

Lamento a sua morte, como lamento a de qualquer pessoa, e me parece terrível que se tente fazer política com isso. Eu não deixo que divergências dessa natureza contaminem meu juízo. Não morreu só o ex-presidente do PT e da Petrobras. Morreram também o pai, o marido, o filho, o irmão, o amigo dos seus amigos… Não agrido territórios do sagrado — e a vida humana é sagrada pra mim. Ponto final.

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Reitero: a morte não beatifica ninguém, a não ser os beatos — o que não era o caso de Dutra e de ninguém que eu conheça. As pessoas têm de arcar com o peso de sua história e de suas escolhas, é claro.

Mas é bom que todos nós estabeleçamos uma linha, dizendo para nós mesmos: “Daqui não passo”. Eu sei do que são capazes os sem-limites e posso lhes dizer: não gosto deles, pouco me importa se esquerdistas, centristas ou direitistas; pouco me importa se corintianos ou palmeirenses; pouco me importa se carnívoros ou vegetarianos, se guelfos ou gibelinos.

Quem estabelece meus limites sou eu mesmo, não meus adversários.

Se alguém tiver alguma dúvida sobre o que pensa este blog em casos assim, basta consultar o arquivo. 

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