Vereador de SP mira em padre Júlio Lancellotti com CPI e Boulos reage
Rubinho Nunes quer instalar investigação contra ONGs e não esconde que sacerdote é alvo da comissão
O vereador de São Paulo, Rubinho Nunes (União Brasil), diz ter o apoio de 30 colegas na Câmara Municipal para instalar uma CPI que investigue o trabalho de ONGs na Cracolândia. Ele prevê que a comissão seja aberta em fevereiro e, já no início dos trabalhos, quer pedir os depoimentos de representantes da ONG Bompar, do coletivo Craco Resiste e do padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua.
“Tenho mais de 30 (assinaturas). Eu protocolei com 25, em 30 minutos no plenário eu já juntei 25 assinaturas. Agora, já tenho mais de 30 apoiamentos, para abrir (a Comissão), eu preciso de 28. Deve ser a primeira CPI do ano a ser instalada”, afirmou Nunes ao Radar.
Em dezembro, o vereador já havia apresentado o protocolo da comissão, que deve ser instalada em fevereiro, de acordo com informação da Folha de S.Paulo. No último mês do ano passado, Rubinho também tentou convocar Júlio Lancellotti em uma Frente Parlamentar, mas o regimento da Câmara não previa o poder de convocação a ele.
“O padre se recusou a comparecer e não quis comparecer espontaneamente. Ele disse que era competência de uma CPI. Então, tá aí. Agora, o padre tem uma CPI e vai ter que ir. Se não quiser ir de boa vontade, no convite, a gente pode convocar e levar ele com força policial.”
Em outubro do ano passado, Rubinho havia convocado o deputado e pré-candidato à Prefeitura de São Paulo,Guilherme Boulos a explicar a greve do metrô. O psolista negou comparecer à Câmara e destacou a falta de base legal para a convocação, como mostrou a coluna.
Reação de Guilherme Boulos
O deputado, inclusive, se manifestou nas redes sociais em defesa do sacerdote. Nesta quarta-feira, Boulos publicou no Instagram uma imagem que diz “protejam o padre Júlio Lancellotti” (veja abaixo). Recentemente, em entrevista ao Uol, o pré-candidato às eleições municipais disse que doou o auxílio-mudança que recebeu pelo mandato em Brasília ao pároco.
Questionado pelo Radar sobre o caráter eleitoreiro da instalação da CPI, Rubinho Nunes negou, mas não deixou de atacar Boulos e disse que o psolista levaria a CPI para o viés político-partidário.
“Não é porque é ano de eleição que eu vou deixar de trabalhar enquanto vereador. Eu tenho as minhas funções e tenho que executá-las”, respondeu.
“O Boulos vai se valer de qualquer artifício para mobilizar a esquerda contra adversários políticos. Se ele pretende fazer uso político, vai da consciência dele. O meu objetivo é investigar o padre, investigar as ONGs e, principalmente, contribuir para que a gente consiga dar um fim à situação da Cracolândia e resgatar o centro de São Paulo”, acrescentou.
A rusga de Rubinho Nunes contra o padre Júlio Lancellotti não é recente. Ele defende que o pároco confunde sua função religiosa com “militância do PT e do PSOL”. Um dos fundadores do MBL, Nunes chegou a atuar como advogado no processo de Arthur Do Val, o “Mamãe, Falei”, em que denunciava Lancellotti por pedofilia.
Rubinho deixou o Movimento em outubro de 2022, mas se refere ao sacerdote com o mesmo termo que Do Val usava, em meados de 2020: “Cafetão da miséria”.
“O padre é uma espécie de cafetão da miséria, que explora as pessoas em situação de rua, os usuários de drogas e não contribui para melhorar a condição de vida delas”, argumentou Rubinho à coluna.
Em reportagem da revista Piauí de julho de 2022, Fernando Dainese, ex-MBL, que foi um dos coordenadores da campanha de Nunes à Câmara de Vereadores, revelou que houve uma operação que usou Guto Zacarias — hoje deputado estadual pelo União Brasil e vice-líder de Tarcísio de Freitas na Alesp — como “isca” para atrair o padre.
“Guto fez essa operação dentro do escritório de advocacia do Rubinho, que também era onde funcionava o comitê de campanha”, disse Dainese ao jornalista João Batista Jr.
Neste ano, Rubinho promete, por meio da CPI, reafirmar posição contrária a Lancellotti. Ele tem recebido material volumoso sobre o padre Júlio e, inclusive, criou uma equipe para filtrar as denúncias consideradas factíveis de “coisas malucas”.
A VEJA, Lancellotti afirmou que a instalação da CPI “é um direito” dos vereadores. No entanto, o pároco publicou nota pública, na qual afirma que o trabalho da Pastoral é independente e não recebe aporte do governo municipal, portanto não vê objeto em sua participação no trabalho da Câmara.
“Esclareço que não pertenço a nenhuma Organização da Sociedade Civil ou Organização Não Governamental que utilize de convênio com o Poder Público Municipal. A atividade da Pastoral da Rua é uma ação pastoral da Arquidiocese de São Paulo, que por sua vez não se encontra vinculada de nenhuma forma as atividades que constituem o objetivo para a criação da CPI em questão.”