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A memória da 1ª mulher negra eleita no país encontra o bolsonarismo em SC

Vereadores de SC usam medalha com o nome de Antonieta de Barros para exaltar deputadas bolsonaristas; família protesta

Por Robson Bonin Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 2 mar 2023, 16h28

Filha de escravos, a professora e jornalista Antonieta de Barros foi a primeira mulher preta eleita no país. Em 1934 — primeira eleição em que mulheres puderam votar e serem votadas para o Executivo e Legislativo no Brasil —, assumiu o mandato de deputada estadual em Santa Catarina.

Na política, foi pioneira no combate à discriminação de mulheres e contra o racismo num estado dominado por homens brancos. Sua memória, exaltada em Santa Catarina, levou a Câmara de Vereadores de Florianópolis a instituir, em 1997, a medalha Antonieta de Barros, “com a finalidade de homenagear mulheres que tenham se destacado nas áreas cultural, política, desportiva, empresarial e de prestação de serviços ou ação social” na capital catarinense.

Nesta semana, a família de Antonieta divulgou uma carta para protestar contra a concessão da medalha que leva o nome da política catarinense a duas deputadas bolsonaristas — Ana Caroline Campagnolo e Caroline de Toni — conhecidas pela defesa de posições opostas ao legado de lutas da filha de escravos na política.

“A trajetória filosófica, ética e política de Antonieta não encontra eco” no bolsonarismo exercido pelas deputadas agraciadas com a comenda, diz Flavio Soares de Barros, sobrinho-neto de Antonieta. “Conceder essa medalha a alguém que rejeita em seus atos esses valores é uma afronta à memória e ao legado de Antonieta”, segue Barros.

Leia a carta escrita por Flavio Soares de Barros, sobrinho-neto de Antonieta:

“Vereadoras e vereadores de Florianópolis,

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Eu, Flávio Soares de Barros, sobrinho-neto de Antonieta de Barros, escrevo em nome da família de Antonieta para expressar nosso repúdio à concessão da medalha Antonieta de Barros às senhoras Ana Caroline Campagnolo e Caroline de Toni.

Antonieta de Barros foi uma importante figura da história de Santa Catarina e do Brasil, uma defensora dos direitos das mulheres, das pessoas negras e dos desvalidos. Incansavelmente, ela lutou pela igualdade e pela justiça social, dedicando sua vida à promoção da educação e da cultura. Seu legado vem sendo resgatado, graças ao ativismo de muitas pessoas, como Flavia Person, que realizou um documentário histórico, e a professora Jeruse Romão, cuja pesquisa iluminou aspectos pouco conhecidos da vida e da carreira de Antonieta como professora, jornalista e política, entre outras.

Infelizmente, Ana Caroline Campagnolo e Caroline de Toni não compartilham desses valores. A trajetória de Campagnolo é marcada por atitudes preconceituosas e discriminatórias contra grupos minoritários, especialmente a comunidade negra e LGBTQIAP+. Envolveu-se, além disso, em episódios de intolerância religiosa, discriminação racial e homofobia, que vão totalmente contra os princípios defendidos por Antonieta de Barros.

Já Caroline de Toni, entre outras demonstrações semelhantes, propôs projeto de lei para a flexibilização do controle, comercialização e aquisição de armas de fogo. Além do fato de que as armas tiram a vida de jovens negros, trata-se de visão oposta à do ideal de democracia de Antonieta, em que “todos se ajudam e todos se dão as mãos, para o bem comum”, onde se possa viver “[…] sob o céu que a todos, resguarda, sob os raios de um sol que a todos ilumina e aquece, sem acotovelar, mas, também, sem ser acotovelado; respeitando o próximo, que o respeita; e agindo, como um indivíduo, cujos direitos são reconhecidos e cujos próprios deveres ele não os desconhece”.

Em resumo, as duas senhoras não se coadunam com a luta pela igualdade, com os princípios do poder revolucionário e libertador da educação de qualidade para todos e da cultura da paz de Antonieta de Barros. Isso sem mencionar a luta pela igualdade de gêneros empreendida por ela, que contrasta com o antifeminismo das duas indicadas.

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Obviamente, as duas senhoras representam um grupo e uma forma de pensar. Mas não é disso que se trata, e sim da adequação entre o que representa a patrona da homenagem e quem faz jus a essa homenagem. A trajetória filosófica, ética e política de Antonieta não encontra eco naquela das indicadas.

Conceder essa medalha a alguém que rejeita em seus atos esses valores é uma afronta à memória e ao legado de Antonieta. É um desrespeito não só à família de Antonieta, mas a quem quer que lute por uma sociedade mais justa e igualitária.

Peço que essa concessão não seja levada adiante. É preciso honrar a memória de Antonieta de Barros e garantir que sua luta continue viva.

Conto com a compreensão das senhoras e dos senhores.

Atenciosamente,

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Flavio Soares de Barros”

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