Saiba qual é a maior fila fora dos estádios em Paris
A VEJA, Cédric Grolet, considerado pela crítica o melhor pâtissier do mundo, conta como se diverte com suas disputadas delícias açucaradas
Em frente a uma vitrine de Paris à primeira vista comum, bem perto da Ópera Garnier, a do teto lindamente colorido por Chagall, um aglomerado de gente espera na fila para entrar. A festa lá dentro é feita por croissants, pains au chocolat e tortas delicadamente esculpidas com a ambição de impressionar o olhar. À frente desta produção limitada – não raro a clientela sai de mãos vazias porque a fornada do dia evapora – está Cédric Grolet, que despontou na concorridíssima arena dos chefs confeiteiros e conquistou o pódio de Melhor Pâtissier do Mundo na prestigiada lista da revista britânica Restaurant.
Aos 38 anos, Cédric virou um fenômeno ao arejar a cena com inovações açucaradas como a recriação de frutas que, numa apreciação ligeira, parecem de verdade, mas guardam no interior recheios os mais variados e surpreendentes. “Só fico satisfeito quando a minha sobremesa sai mais saborosa do que a fruta que a inspirou”, diz o chef, que brinca de artista e cobra caro por isso: uma “maçã” devorada em poucas tacadas custa 22 euros, mais de 100 reais. O show ele estende às redes, onde faz do preparo das receitas um espetáculo acompanhado por 15 milhões de seguidores. Dia desses, 176 milhões de pessoas visualizaram uma teatral apresentação onde dava vida a seus croissants.
Área em que a técnica é cultuada como uma ciência, seguida por doceiros afeitos à tradição passada de uma geração à outra, Cédric foi estimulado pelo chef-celebridade Alain Ducasse a dar asas a suas criações – isso como seu pupilo na pâtisserie do luxuoso hotel Le Meurice. Às vezes a massa cresceu, noutras ela minguou, mas ali serviu de laboratório para o jovem doceiro dar uma guinada e ganhar os holofotes.
Como esperado, há franceses que lhe torcem o nariz, pelo tom midiático que confere ao negócio e aos excessivos euros pedidos pelos doces. Mas é uma minoria. Tanto assim que se expandiu por três endereços em Paris, aportou na ensolarada Saint-Tropez e nas alpinas pistas de Courchevel, e ainda foi parar em Londres e Cingapura.
Às voltas com a Olimpíada, que tornou a fila em frente à loja da Ópera uma missão para os muito, muito pacientes mesmo, ele, que faz aparições-supresa por lá, deu a seguinte entrevista a VEJA.
Espera que os Jogos dêem visibilidade a seus doces? A Olimpíada é, sem dúvida, uma chance de atrair gente de todo o planeta para o meu mundo. Mas quero deixar claro: vou seguir coerente e verdadeiro no que faço, sem perder a essência do que me trouxe até aqui.
Vendo seus vídeos na internet, parece que está realmente se divertindo com suas tarteletes. É isso mesmo? Com certeza. Do contrário, não faria sentido ter um trabalho tão duro. O prazer precisa ser um ingrediente. Desde o começo, me divirto muito, especialmente quando faço minhas experiências, criando o que nunca foi feito.
Pensou em ser outra coisa na vida que não pâtissier? Nunca. Desde os 14 anos, estudo para estar onde estou. Quando comecei, há duas décadas, a confeitaria não era bem vista. As pessoas achavam que tinha ido por esse caminho por falta de opção. Mas essa sempre foi minha escolha número 1.
Pâtisserie também é arte? Sim, tanto do ponto de vista da técnica como da estética. O leque para a criação é vasto, e isso é o que mais me motiva. Há uma linha fina entre um chef doceiro e um artista.
Mereceu o pódio mundial no ranking da Restaurant? Só posso afirmar que a cada dia tento me reinventar e não cair na tentação de paralisar numa zona de conforto. Tenho colegas que são tão talentosos como eu. Todos nós estamos colocando a pâtisserie francesa na linha de frente da alta gastronomia.