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Paris é uma Festa

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Histórias da cidade olímpica fora das arenas
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93 anos, 9 olimpíadas e fôlego para mais

A paulistana Ruth Valente, que está em Paris com agenda cheia, tem um incrível baú de histórias dos Jogos

Por Monica Weinberg, de Paris
Atualizado em 31 jul 2024, 06h59 - Publicado em 31 jul 2024, 06h52

O vigor de Ruth Valente, 93 anos, deixa muito jovem para trás. Com a saúde em dia, boa de caminhar, ela está praticando hoje um de seus esportes favoritos: assistir às olimpíadas. Começou a saga na Cidade do México, em 1968, junto com o marido. Os dois eram professores de educação física – ela jogadora de vôlei, ele corredor profissional.

Gostaram tanto que implantaram uma rotina – de quatro em quatro anos, partiam para ver os Jogos, assunto do qual ela entende como poucos. “Você acaba vendo a história acontecer na sua frente”, diz.

Em Paris, que adora (“na primeira vez que vim, subi no topo do Arco do Triunfo e tive uma emoção única ao ver a cidade aos meus pés”), já garantiu ingressos para os vôleis de quadra e praia, futebol feminino e tênis. Está particularmente encantada com a ideia de assistir aos saques e cortadas nas areias da arena instalada ao lado da Torre Eiffel, cartão-postal em que gosta de jantar, no restaurante lá em cima. “Sei que não posso me exceder”, fala, enérgica.

Sua memória volta décadas no tempo trazendo à tona uma riqueza de passagens olímpicas. Ela lembra muito bem da Olimpíada de Munique, em 1972, os fatídicos Jogos em que onze integrantes da equipe israelense foram assassinados num massacre encabeçado pelo grupo terrorista palestino Setembro Vermelho. “Tentaram não propagar muito a tragédia para não tirar o brilho da festa, que acabou ali. Uma mancha indelével”, define ela, que não quis saber de ir à cerimônia de encerramento, de tão abalada que ficou.

DEZ, NOTA DEZ

Um dos momentos áureos em sua saga olímpica foi assistir, em Montreal, no Canadá, à ginasta romena Nadia Comaneci, então com 14 anos, cravando um 10 nas barras assimétricas. Entrou para a história como “o 10 perfeito”. Ninguém nunca havia chegado à nota máxima. Nem mesmo o placar estava preparado para tamanha precisão: ele marcava “1 00”, no lugar do tão inesperado 10.

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Naqueles Jogos,em 1976, Comaneci saiu com três ouros, uma prata e um bronze, e ofereceu ao público um espetáculo raro. “O que assisti foi uma atleta ultrapassando a fronteira humana, nunca tinha visto nada parecido”, conta Ruth, que entendeu que ali estava nascendo um novo e mais elevado padrão. “Foi uma ginástica 100% inspirada e inspiradora para tantas outras atletas que vieram depois”, fala ela, que se arrisca no campo das opiniões esportivas. “Leio muito sobre as competições antes de embarcar. Muda a experiência.”

“SERÁ QUE ME VIGIARAM?”

Ela teve uma provinha da União Soviética em plena era da cortina de ferro em 1980, edição que os Estados Unidos boicotaram. “Tinha que fazer tudo o que o guia falava. Não senti a mesma liberdade que em outros países, parece que me vigiavam”, lembra.

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Ruth Valente em Moscou 1980 (Ruth Valente/Arquivo pessoal)
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Comprou matrioskas, aquelas bonequinhas típicas que ficam umas dentro das outras, para presentear a filha, Sylmara, 63 anos, única menina de uma prole de quatro, com quem está em Paris e já foi à s Jogos de Londres, Sochi (os únicos de inverno da lista) e Rio de Janeiro. Recorda de não haver nas lojas russas papel de embrulho, então o pacote era feito com o de pão mesmo. Mas adorou. Ninguém ficava falando de política, conta, e a festa foi permeada de emoção. “Quando o mascote Misha, aquele ursinho carismático chorou, na cerimônia de encerramento, também não aguentei.”

Ruth chegou a ir a Los Angeles em 1984. Em 1992, ficou viúva e deu um tempo. Mas voltou com tudo em Londres, quando sua epopeia olímpica lhe veio toda à mente, como um álbum de fotografias. Os Jogos do Rio foram um ponto alto: Ruth correu com a tocha, em Corumbá, passando o objeto que segurava como um troféu às mãos da filha, que virou sua companhia em Jogos. Paris é o quarto da série juntas.

A veterana diz que, nos dias de hoje, a logística é mais difícil. “O público só aumenta, enquanto os estádios ficam do mesmo tamanho”, avalia. “É preciso resistência para encarar a multidão.” Isso Ruth, que vive cercada de amigos e até casou-se de novo aos 83, tem de sobra. “É a festa mais alegre, amistosa e diversa do planeta”, fala, entusiasmada, já de olho na próxima; “Me aguardem em Los Angeles.”

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