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O Som e a Fúria

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As estrelas que expõem seus problemas mentais sem censura

Jovens artistas se sentem mais à vontade para falar sobre o tema e, sobretudo, pedir ajuda

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 12h34 - Publicado em 7 ago 2022, 08h00

“Ficou mais claro que preciso aproveitar o tempo que eu nunca tive, me encontrar e voltar mais forte.”
Shawn Mendes, cantor canadense, que cancelou a turnê para cuidar de si

O primeiro grito de socorro do canadense Shawn Mendes veio na letra da música In My Blood, há quatro anos. “Me ajude / É como se as paredes estivessem desmoronando / Às vezes, sinto vontade de desistir”, ele cantava. Há duas semanas, Mendes finalmente sucumbiu. Aos 23 anos, o artista anunciou o cancelamento de sua turnê para reencontrar o equilíbrio psíquico perdido. “Estarei de volta assim que me curar”, escreveu em suas redes sociais. A atitude corajosa do artista foi recebida com naturalidade e a pronta solidariedade dos fãs. Mas assinala uma inflexão notável no modo como os artistas da música lidam com seus transtornos pessoais.

Shawn Mendes [Disco de Vinil]

Até poucos anos atrás, os tabus que cercavam problemas como abuso de drogas, depressão e ansiedade ensejavam grotescos espetáculos de humilhação, que rendiam comentários jocosos em tabloides e despertavam o sadismo na internet. Hoje, o enfoque mudou: em vez de esconderem até desabar diante dos olhos do público, as estrelas admitem suas agruras, e não se furtam a falar delas com franqueza. Dão nome, sobretudo, ao que está em jogo: a saúde mental.

Wonder [LP]

Ao adotar a nova postura, Shawn Mendes não se encontra sozinho. O cantor Justin Bieber, de 28 anos, conheceu a fama ainda na infância, e teve seu comportamento errático noticiado no mundo inteiro. Até que, cinco anos atrás, ele desapareceu da vida pública. Os fãs ficaram sem entender nada. Em 2020, o documentário Justin Bieber: Next Chapter revelou que o músico travava uma batalha contra a depressão. “Se você está se sentindo solitário, fale sobre isso. Diga em voz alta”, disse. Recuperado, Bieber voltou aos palcos e se apresentará em setembro no Brasil, no Rock in Rio.

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Chromatica [LP]

Lady Gaga, de 36 anos, foi outra que se abriu sobre sua saúde mental em um documentário revelador, Gaga: Five Foot Two, de 2017. No filme, a cantora confidencia que se afastou dos palcos devido a uma fibromialgia que lhe causava dores excruciantes, além de sofrer de estresse pós-traumático, razões pelas quais naquele mesmo ano cancelou em cima da hora sua apresentação, coincidentemente, no Rock in Rio.

SOB CUIDADO - Bieber, Lady Gaga e Adele: eles se afastaram da vida pública para cuidar de si e tiveram apoio dos fãs -
SOB CUIDADO - Bieber, Lady Gaga e Adele: eles se afastaram da vida pública para cuidar de si e tiveram apoio dos fãs – (@justinbieber/instagram; @ladygaga/instagram; @adele/Instagram)

Falar sobre os problemas com honestidade não deixa de ser uma forma de terapia — e, para os artistas pop, também traz ganhos de imagem, claro. Após superar seu drama, Lady Gaga deu testemunho do que passou em palestras. A inglesa Adele, de 34 anos, também extrai lições de suas aflições. Após desaparecer por algum tempo e surpreender os fãs ao ressurgir muito mais magra, ela explicou que a mudança não estava relacionada à estética, e sim à busca de equilíbrio. “Um dos motivos pelos quais as pessoas ficaram chocadas com minha perda de peso foi porque não compartilhei o processo nas redes sociais”, disse. “Nunca foi sobre perder peso. Sempre foi sobre ficar forte e dar o máximo de tempo a mim todos os dias sem usar o celular”, completou. De volta, Adele lançou o álbum 30 e emendou uma turnê em Las Vegas.

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Com seu alerta sobre os efeitos danosos das redes, Adele ilumina um ponto essencial: além de enfrentar seus tormentos, os artistas precisam dar conta do escrutínio invasivo da internet. Ainda antes de seu advento, é fato, a indústria da música já se notabilizava como uma máquina de moer carne. No passado, comportamentos autodestrutivos foram romantizados ou vistos como fraqueza. A compreensão sobre a gravidade do problema é resultado de anos de campanhas de conscientização. Justin Bier já declarou que a mudança na maneira como as pessoas encaram hoje os transtornos mentais dos famosos teve peso crucial em sua recuperação.

Em abril, a organização Toronto Over the Bridge lançou o projeto Lost Tapes of the 27 Club, que usou uma ferramenta de inteligência artificial para compor músicas “inéditas” de artistas que morreram aos 27 anos, como Kurt Cobain e Amy Winehouse. As letras chamam a atenção para a saúde mental. Se os gritos de socorro de Cobain e Winehouse tivessem sido ouvidos, talvez o destino de ambos fosse diferente. Ainda bem que isso está mudando.

Publicado em VEJA de 10 de agosto de 2022, edição nº 2801

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