Os 60 anos de Michael Jackson: ele era um “cara diferente”
O fenômeno Michael Jackson não se reduziu a um mero produto empacotado pela indústria cultural.
É noite e um carro para na estrada deserta. O rapaz explica à garota que a gasolina acabou. Ela sabe que isso é mentira, mas se finge de tola porque está visivelmente apaixonada.
— O que vamos fazer agora? — diz a moça, insinuante.
Em vez do tão esperado beijo, os dois saem à procura de ajuda. O rapaz caminha em silêncio. A garota não gosta disso, tenta puxar assunto. Param no meio da floresta.
Ele, sério:
— Preciso te dizer uma coisa.
Ela (será que vai me beijar agora?):
— Diga o que quiser. Sou toda ouvidos.
— Sabe que gosto de você, não sabe?
— Sim, eu sei.
— Que bom. Espero que goste de mim do mesmo jeito.
— Claro que gosto. Gosto muito. Gosto demais.
Os dois se abraçam, mas nada de beijo. O rapaz tira alguma coisa do bolso. É uma espécie de anel de noivado, que põe no dedo dela.
— Agora você vai ser a minha garota. Mas primeiro tenho uma revelação a fazer.
— Faça, meu bem. Pode se abrir comigo.
— Eu não sou como os outros rapazes.
— Claro que não. É por isso que eu te amo.
— Você não está entendendo. Sou um cara diferente.
— Diferente? Do que está falando?
Antes da resposta, um vento impetuoso sopra as nuvens que até então bloqueavam a claridade da lua cheia. O rapaz sente engulhos, geme e cai aos pés da moça.
— O que houve? — diz ela. — Você está bem?
— Ah! — exclama ele, agora com olhos brilhantes e voz cavernosa.
A garota grita, mas é tarde. Diante de nossa incredulidade, o “cara diferente” passa por uma horrível metamorfose. Torna-se lobisomem e começa a perseguir a mocinha por entre as árvores e as sombras. Ao que tudo indica, irá matá-la, esquartejá-la e dilacerá-la.
Só quem mora em Marte não assistiu ao videoclip acima. É a abertura de Thriller, a marca registrada de Michael Jackson, a quintessência do que sua música representa para o mundo.
No momento mais brilhante de sua carreira, o rei do pop fez questão de mandar uma mensagem subliminar a todos os seus súditos. Chamou atenção para o fato de ser “um cara diferente” antes de se transformar naquela criatura branca e sem nariz que semanalmente aparecia nas revistas de fofoca. Os fãs não tiveram melhor destino. Surpresos com o excesso de plásticas e as histórias de pedofilia, acabaram encarnando a mocinha que desejava um beijo. Foram simbolicamente assassinados, esquartejados e dilacerados.
Doeu em todo mundo. É que o fenômeno Michael Jackson não se reduziu a um mero produto empacotado pela indústria cultural. A despeito dos escândalos e dos fracassos que pesaram sobre o bizarro Peter Pan, muitos passaram a última década lamentando a sua morte. Desde o seu passamento, a sua imagem acumulou um “ganho” extraordinário: Michael morreu como curiosidade e ressuscitou como artista.
Do além-túmulo, o rei do pop recuperou sua majestade.