Há pastores por todos os lados tentando juntar ovelhas dispersas pelo planeta. Tentativas inócuas, os animais não reconhecem a voz do pastor. A imagem cai bem no ciclo atual da Humanidade. Há políticos de todos os estilos, autoritários e demagogos, liberais e conservadores, populistas e articuladores.
A paisagem é árida quando se procura um perfil identificado com lealdade moral, qualidade central em um estadista, cuja índole agregadora e admirada facilita a busca de soluções para atender às populações. Enfrenta desafios, ciente de que a coragem e a resiliência são essenciais para se ganhar a guerra. Churchill, por exemplo, de tanto insistir, convenceu os EUA a entrarem na Segunda Guerra.
O líder moral resiste ao tempo, à tempestade e à bonança. Não se subordina a partidos caçadores de recompensas. Entende a política como “a habilidade de prever o que vai acontecer amanhã, na semana que vem, no mês que vem e no ano que vem, porém com a capacidade de explicar depois por que nada daquilo aconteceu”, como definia Churchill.
Quem seria capaz de promover hoje um “swadesh”, boicote às mercadorias importadas ou deixar de pagar tributos escorchantes à Inglaterra, como sugeriu Gandhi aos indianos, como estratégia para alavancar a economia de seu país? Ele foi um formidável ícone moral.
Outro exemplo é John Kennedy. Sua fala empolgava as multidões: “Não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer por seu país”. O carisma se estampava na face sorridente, no sonho de ver uma América feliz, apelo de outro líder moral dos EUA, Martin Luther King.
E em nossos trópicos? Comecemos pela década de 50. O retrato é o de Juscelino Kubitschek, JK, cujo sorriso aberto conquistava a massa. Desenvolvimentista, consolidou a indústria automobilística e construiu Brasília: “Deste Planalto Central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro das altas decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu país e antevejo esta Alvorada com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino.”
Vemos, a seguir, Jânio Quadros, com seu olhar oblíquo e medidas esdrúxulas. Ficou apenas sete meses na Presidência, mas tinha carisma. Implantou uma política externa independente, ganhando apoio mundial durante a Guerra Fria. Era respeitado. Na campanha para prefeito de São Paulo, em 1985, fez contundentes pronunciamentos contra bandidos e corruptos. Um certeiro recado para o momento. Com seu estilo histriônico, ganhou de Fernando Henrique.
Pulemos para os tempos de redemocratização. Sarney não conseguiu vencer a inflação. Litúrgico. Collor cavalgava no cavalo do marketing. Itamar, sério, mas sem carisma. FHC, ainda com Itamar, criou o Real. Um schollar, porém sem carisma. De JQ até hoje, só apareceu Luiz Inácio com estoque de carisma e certa lealdade moral restrita aos petistas. Mas os escândalos que envolveram o PT corroeram sua dimensão ao dividir o Brasil em “nós e eles”.
Em suma, falta-nos hoje um líder moral, um perfil aplaudido por todas as classes sociais. Quem souber onde ele se encontra, favor anunciar o nome.
Gaudêncio Torquato é jornalista, escritor, professor titular da USP e consultor político