Terminaram as eleições presidenciais mais polêmicas da história da redemocratização brasileira. Já as dúvidas e as incertezas prosseguem e devem ser objeto de cuidadosa análise. Principalmente acerca dos movimentos relacionados às políticas fiscal e tributária.
Temos heranças desafiadoras, deixadas tanto pela pandemia quanto pelas eleições. Agora que o país desce do palanque, estamos saindo dos delírios das promessas e entrando no campo minado da possibilidade de cumpri-las. São nuvens carregadas de sonhos, promessas, dívidas e dificuldades fiscais.
A potencial consequência do momento e das decisões problemáticas é o crescimento de incertezas, o que afeta o comportamento dos agentes econômicos, que, no fim das contas, investem, empregam e pagam impostos. Alguns já começaram a ficar desconfiados.
Em uma conta de padeiro, as promessas da campanha somam mais de 200 bilhões de reais e incluem, entre outros itens, prorrogação do Auxílio Brasil, reajuste do salário mínimo, isenção de impostos e investimentos diversos. Devemos observar também a pressão por reajustes salariais por parte de categorias de funcionários públicos que estão há tempos sem correção.
“O Brasil é um país onde até os profissionais cometem erros graves. Imaginem os amadores”
Obviamente, não há dinheiro para pagar a conta das promessas e das demandas represadas. O que fazer? Em política, promessa só vale se pode ser cumprida. Sem condições, não há o que fazer. Não é uma situação fácil. Por um lado, existe a armadilha das soluções criativas que propõem o aumento do endividamento para fazer frente aos gastos, em uma espécie de banco imobiliário em que o banqueiro cobre o custo da dívida e estimula o endividamento.
Por outro lado, existe o caminho duro do pragmatismo: escalonar a execução das promessas, cortar despesas e reequilibrar a carga tributária. Tudo o que um governo eleito não gostaria de fazer. Infelizmente, as promessas não cabem na realidade econômica e fiscal do país sem a implantação de uma reforma administrativa e de uma reforma tributária. Para complicar, o mundo em 2023 terá focos de tensão importantes que testarão a nossa resiliência quanto à economia e exigirão perícia de nossa diplomacia. A agenda internacional do país será importante.
Assim, as forças produtivas devem estar atentas aos passos iniciais do novo governo. E, é evidente, à tentação de aumentar impostos sem equacionar a carga impositiva. O melhor cenário envolveria uma equipe econômica forte e com credibilidade, a contenção das iniciativas populistas e a predominância do pragmatismo nas decisões. Talvez seja esperar muito. Um cenário intermediário pode ser uma alternativa.
Nesse sentido, devemos analisar a reação do mercado aos primeiros passos do time econômico, bem como a credibilidade técnica de sua composição. O Brasil é um país onde até os profissionais cometem erros graves. Imaginem os amadores. Colocar amadores para tocar o transatlântico da nossa economia é brincar com o destino de todos. Em especial, dos que mais precisam do Estado e da sociedade.
Publicado em VEJA de 16 de novembro de 2022, edição nº 2815