O Brasil ainda vive a pré-história do capitalismo. Como parte desse atraso, existem tanto a debilidade do mercado em si quanto a incompreensão do que ele seja ou o que significa para o desenvolvimento econômico e social. Para tentar esclarecer um pouco, começamos pelos conceitos. Mercado é definido como a soma de todos os vendedores e compradores em uma determinada área. Já o mercado financeiro é o sistema que oferece a vendedores e compradores instrumentos para que sejam viabilizadas as transações comerciais e financeiras. De modo simples, o mercado financeiro permite a interação entre os que tem capital para oferecer e os que necessitam de capital para investir, além de oferecer instrumentos para viabilizar as transações.
O Brasil tem um mercado acionário relativamente pequeno frente à população. Mas vem crescendo. Em termos comparativos, em 2002 existiam cerca de 120 000 investidores em ações da Petrobras. Hoje são mais de 1,4 milhão. Quando Lula se elegeu presidente pela primeira vez, tínhamos 400 000 investidores na Bolsa de Valores e hoje estamos próximos de 5 milhões. Some-se a isso mais de 2 milhões de investidores em Tesouro Direto. O mercado financeiro não é formado apenas por indivíduos abastados ou rentistas preguiçosos que vivem da aplicação do dinheiro. Existem fundos de pensão de funcionários públicos cujo pagamento de aposentadorias está garantido pelas aplicações em ações. Operações imobiliárias são lastreadas por investidores pessoais e empresariais. O agronegócio tem no financiamento público e privado importante alavancagem.
“O mercado financeiro não é formado apenas por indivíduos abastados ou rentistas preguiçosos que vivem da aplicação do dinheiro”
As nossas robustas reservas internacionais — outro dado positivo do mercado — que dão tranquilidade ao país resultam da combinação da produção, de mecanismos de financiamento e da boa gestão dos saldos positivos. As boas regras no mercado de capitais também colaboram com a vinda de investimentos diretos, que também estão inseridos no que chamamos mercado. Em termos de pessoas físicas, tínhamos, no fim de 2020, 134 milhões de cartões de crédito e 167 milhões de cartões de débito. No fim de 2021, o número de brasileiros considerados “bancarizados” chegou a 182,2 milhões em dezembro, de acordo com o Banco Central. Novamente, é o mercado funcionando.
Os instrumentos ofertados por esse sistema permitem financiar carros, caminhões, motocicletas e tratores, incluindo o seguro desses bens. E, se o carro não for pago, o crédito podre pode ser adquirido por investidores. Os instrumentos de mercado também envolvem hipotecas e compra de imóveis. Em 2021, o volume de crédito imobiliário atingiu 255 bilhões de reais. Mais de 1,2 milhão de imóveis foram financiados. Tudo faz parte desse “desconhecido” mercado.
Os números robustos revelam a presença do mercado no dia a dia dos brasileiros. Mas, obviamente, isso não é suficiente. A desigualdade econômica e social é imensa e impede o pleno acesso de brasileiros a um padrão digno de renda. Para enfrentar o desafio da desigualdade e promover a inclusão econômica, por meio de maior renda, precisamos ter um mercado maior e mais robusto, com regras claras que promovam credibilidade e previsibilidade. É o caminho da prosperidade.
Publicado em VEJA de 11 de janeiro de 2023, edição nº 2823