Uma boa notícia para o mundo: acordo sobre Gaza é o melhor possível
O ótimo é inimigo do bom, e o cessar-fogo tem muitos defeitos, mas a suspensão da guerra e a libertação dos reféns trazem alívio para todos

Foi Donald Trump quem fez? Muitos israelenses acham que sim. Se ele não tivesse estabelecido a sua posse como data-limite para a libertação dos reféns, sob pena de “soltar as fúrias do inferno”, é possível que o impasse continuasse, com negociações inconclusivas.
O mais pressionado, sob esse ponto de vista, foi Benjamin Netanyahu, mestre da sobrevivência política e suficientemente astuto para ver que não dava para continuar enrolando. Duas fontes árabes disseram ao site The Times of Israel que, numa reunião “tensa” durante o fim de semana, o enviado especial de Trump, Steve Witkoff, conseguiu arrancar mais cooperação do primeiro-ministro israelense do que todos os emissários de Joe Biden durante um ano.
Netanyahu e uma parte da direita israelense acham que ceder e suspender fogo, num processo que implica no fim da guerra, é praticamente uma premiação aos maus. É fato que o Hamas vai se recompor — aliás, já o fez, segundo o secretário de Estado Antony Blinken — e que a chocante tomada de reféns foi uma tática que obrigou Israel a fazer concessões.
Com base nisso, o primeiro-ministro prorrogou um acordo durante meses. Do ponto de vista bélico, sua análise está certa. Do ponto de vista humano, é insuportável para a opinião pública israelense aceitar que há cidadãos judeus submetidos aos maiores tormentos nos túneis, fechados com portas blindadas, aos quais os militares só podem ter acesso depois que os cativos são executados.
Quem ganha mais com o acordo, Israel ou o Hamas? Nas circunstâncias atuais, ganhar e perder estão misturados.
O Hamas sobrevive e não vai deixar de atacar, quando e como puder, mesmo ao custo — que demonstrou desprezar — de ter o território de Gaza totalmente arrasado.
Netanyahu também sobrevive, contra tantos prognósticos negativos, e a liberação a conta-gotas, ao longo de 42 dias, de 33 reféns, dentre os quais todas as mulheres, depois os homens acima de 50 anos e em seguida os doentes, traz um consolo importante para o país.
A população de Gaza vai poder, em movimentos controlados, retornar às áreas originais em que vivia, embora muitas vezes não existam mais suas casas.
O que vai acontecer depois? Quem vai assumir a administração de Gaza? Quais são os passos para levar a um futuro acordo mais abrangente, envolvendo a Arábia Saudita e outros países interessados nas vantagens da pacificação, e não no discurso propagandístico da extinção de Israel?
São etapas de tirar o fôlego pelas dificuldades envolvidas, mas é melhor quebrar a cabeça por um acordo do que manter eternamente uma guerra com preço duro, altos prejuízos à imagem de Israel e a angústia de imaginar as condições dantescas em que os reféns são mantidos.