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Fim de um homem maligno não mudaria, infelizmente, rumo da guerra

Nasrallah, líder de uma facção obcecada com a destruição de Israel, tem uma grande linha de sucessores para continuar o conflito

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 27 set 2024, 19h55 - Publicado em 27 set 2024, 17h55

Nem um bunker enterrado abaixo do solo, atingido por explosões que destruíram seis edifícios acima dela, escapou do devastador ataque apresentado por fontes israelenses como o fim de Hassan Nasrallah, um homem que só fez o mal durante sua vida, inclusive ao convencer muitos de seus seguidores de que fazia o bem.

Entrar nos subterrâneos de Dahiyeh, bairro no sul do Líbano dominado pelo Hezbollah, era uma espécie de descida a algum círculo obscuro, com segurança extrema e uma tensão permanente amparada num fato de conhecimento de todos: Israel sempre soube, o tempo todo, onde estavam os líderes da organização multidisciplinar – terror e administração, guerra e serviços sociais, repressão e medo em todas as instâncias.

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Só tinha que escolher quando atacar, como está fazendo nos últimos dias, ao dizimar seguidamente os mais importantes comandantes do Hezbollah. O objetivo, declarado, é decapitar a organização que hoje domina não apenas o sul do Líbano, mas as principais instituições do país. Todas essas operações foram preparadas e treinadas durante anos.

Para o Hezbollah, perder as lideranças, depois de ficar com as comunicações arruinadas pelo ataque em massa dos pagers explosivos, é um golpe enorme. Como toda organização militar, a organização terrorista funciona com um sistema de hierarquia rígida. Ao contrário das Forças Armadas comuns, tem também que manter um alto nível de sigilo em suas operações, sabendo que os serviços de inteligência de Israel são altamente efetivos. 

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Nessas condições, a eliminação da hierarquia atingida pelos bombardeios cirúrgicos de Israel é uma perda maior ainda: um alto nível de sigilo significa que poucos têm ideia do quadro geral e podem tomar decisões estratégicas.

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CEM DÓLARES 

Mas não significa que o Hezbollah está desarticulado. Nem que a guerra, ainda em estágio de bombardeios e ataques de artilharia mútuos, vá mudar de rumo. O Hezbollah, ou Partido de Deus, conta com grande – embora não absoluto – apoio entre os libaneses xiitas, moradores da região sul do país. 

Está profundamente enraizado nessa área e cooptou simpatizantes em outras partes do país. 

O fanatismo religioso extremo foi arquitetado, incentivado e financiado pelo Irã, não existia originalmente entre os xiitas libaneses. 

No início desse processo, clérigos iranianos chegavam ao ponto de pagar cem dólares às libanesas xiitas que usassem os trajes exigidos pelos fundamentalistas: negro da cabeça aos pés, com o rosto espremido por um pano preso com alfinete logo abaixo do queixo. Hoje, não existem praticamente mulheres sem “cobertura total” no sul do Líbano.

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A estratégia da radicalização rendeu enormes frutos. O maior deles é que o Hezbollah e seus seguidores entre a população comum abraçam completamente a causa da destruição de Israel simplesmente por existir em território que consideram “consagrado” ao Islã. 

As invasões ao Líbano, todas em reação a ataques contra israelenses, também solidificaram a imagem da “resistência”, embora seja uma situação completamente da dos palestinos, em Gaza ou nos territórios com autonomia relativa. O próprio filho mais velho de Nasrallah, Hadi, foi morto num ataque a forças israelenses em 1997.

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CUMPLICIDADE VOLUNTÁRIA

O Hezbollah não tem nenhum “direito sagrado” a se levantar em armas já que não existe nenhum israelense em território libanês. É movido pelo fundamentalismo islâmico, que aspira a um grande espaço muçulmano unificado  sob liderança religiosa e as leis da sharia. Para os xiitas, isso jamais acontecerá. São minoritários entre os seguidores da religião muçulmana – cerca de 10% do total mundial, ou entre 150 e 200 milhões. Mas são a maioria absoluta no Irã, maioria relativa no Iraque, no Iêmen e numa parte do Líbano. Esse é o espaço dominado pelo Irã, com a participação ativa e cumplicidade voluntária do Hezbollah.

É por isso que não faltarão substitutos para Hassan Nasrallah, caso sua morte seja confirmada. A eliminação de múltiplos dirigentes do Hezbollah é um grande trunfo para Israel, inclusive por significar que não existem mais linhas vermelhas, ninguém mais está relativamente seguro pelo desejo israelense de não escalar os conflitos.

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Os conflitos já estão no nível máximo, excluindo-se uma invasão por terra. Caem os líderes, outros assumem  seu lugar. Todos provavelmente com similar inteligência para o mal e astúcia da mesma natureza – só de Nasrallah ter sobrevivido tanto tempo já mostra suas qualidades como um operador atilado, conhecedor dos pontos fortes e fracos de Israel, inclusive a decisão de deixá-lo vivo, por interesses estratégicos.

Efetivos e substitutos, todos têm o mesmo objetivo e podem arrastar o Líbano para uma guerra total, imposta ao restante da população que não segue os mandatos do Irã. Se usassem seus dons para o bem, não para uma guerra insana e o culto à morte, o Líbano poderia progredir, não regredir e ser levado à destruição.

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