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‘Romances de mistério são subestimados’, diz herdeira literária de Agatha Christie

A escritora britânica Sophie Hannah (Foto: Ben Pruchnie/Getty Images) Meire Kusumoto Autora de poesias e livros de mistério, a britânica Sophie Hannah ganhou os holofotes ao se tornar a primeira – e por enquanto a única – convidada pela família de Agatha Christie a escrever um novo romance protagonizado pelo detetive belga Hercule Poirot, que […]

Por Meire Kusumoto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 5 jun 2024, 00h10 - Publicado em 6 jul 2015, 09h55
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A escritora britânica Sophie Hannah (Foto: Ben Pruchnie/Getty Images)

Meire Kusumoto

Autora de poesias e livros de mistério, a britânica Sophie Hannah ganhou os holofotes ao se tornar a primeira – e por enquanto a única – convidada pela família de Agatha Christie a escrever um novo romance protagonizado pelo detetive belga Hercule Poirot, que fez sua estreia no livro O Misterioso Caso de Styles, de 1920. Apesar da honraria, a autora que participou neste domingo da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) afirma que ainda existe uma grande parcela da crítica que torce o nariz para a literatura de mistério. “Há uma visão esnobe sobre o gênero porque é divertido e muitas pessoas gostam. Alguns críticos literários não consideram que um bom livro de mistério pode ser um trabalho sério de literatura. Mas não me sinto ofendida com isso, acho apenas que essas pessoas são bobas”, diz Sophie ao blog VEJA Meus Livros.

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A escritora conta que escrever um livro novo de Poirot, Os Crimes do Monograma (tradução de Alyne Azuma, Nova Fronteira, 288 páginas, 29,90 reais), lançado no Brasil no ano passado, foi divertido e também assustador. “Foi uma honra ter sido escolhida para um livro tão importante. Ao mesmo tempo, eu sabia que o mundo inteiro estaria prestando atenção por se tratar de um romance que levaria na capa também o nome de Agatha Christie”, afirma. A história deixa transparecer que Sophie não só é uma grande fã da chamada “rainha do crime”, mas foi uma atenta observadora dos trejeitos e manias de Poirot, um personagem quase mítico da literatura detetivesca.

ebc90ebd-65a7-41a7-8b88-6b0712ed67e9Apaixonada por esse tipo de livro desde criança, a britânica se dedicou a escrever romances de resolução de crimes e de mistério e conquistou certa base de fãs no Reino Unido antes de lançar sua “parceria” com Agatha. Junto com o reconhecimento por ter trazido de volta um personagem tão querido, veio a oportunidade de levar seu trabalho anterior a outros lugares do mundo. Foi o caso do Brasil, que recebeu, em junho, o romance A Vítima Perfeita (tradução Alexandre Martins, Rocco, 432 páginas, 39,50 reais). Em seus livros, porém, Sophie dá um tom diferente ao que deu à nova aventura de Poirot: são thrillers psicológicos, com tipos obscuros e, por vezes, depressivos.

Confira a entrevista de Sophie Hannah ao VEJA Meus Livros:

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Antes de escrever romances de detetives a senhora publicou coletâneas de poemas. Vê algo de semelhante entre poesia e mistério? Sempre me interessei em escrever os dois gêneros, escrevi dois ou três romances de mistério antes de publicar o meu primeiro livro de poesia. São estilos diferentes, mas eles têm em comum a importância da estrutura. Gosto de poesia formal, com métrica e rima, e de romances de mistério com pistas arranjadas. Os dois precisam ter uma estrutura correta, com cada elemento em seu lugar. Em ficção literária ou outros gêneros isso não acontece, necessariamente. Sou obcecada com estrutura, por isso me interesso pelos dois gêneros. Gosto das coisas com uma forma definida.

Tem preferência por um dos dois? No momento o meu favorito é o romance de detetive. Eu ainda amo poesia e ainda me considero uma poeta, mas, desde 2006, quando comecei a publicar esses livros, estou focada nisso. Por enquanto, minha energia criativa está voltada para o mistério.

Como e quando a senhora recebeu o convite para escrever uma nova aventura de Hercule Poirot? Tudo aconteceu por acaso. Meu agente literário estava no escritório da editora Harper Collins, que publica Agatha Christie, e ele sabia que eles eram a casa editorial responsável pela obra dela. Ele disse, sem pensar e de forma abrupta: “Sabe o que vocês deveriam fazer? Deveria chamar a minha autora, Sophie Hannah, para escrever um novo romance de Agatha Christie”. E, por total acaso, os herdeiros de Agatha estavam, naquele mesmo momento, pensando em lançar um novo romance de Poirot. Fiquei muito feliz com a notícia, foi uma honra ter sido escolhida para escrever um livro tão importante. Ao mesmo tempo, foi um pouco assustador, por se tratar de um livro de Agatha Christie eu sabia que o mundo inteiro estaria prestando atenção nele e eu estaria meio que sob um microscópio. Mas, principalmente, senti que seria um desafio animador.

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Recebeu alguma orientação dos herdeiros de Agatha Christie? Alguém te incentivou ou proibiu de escrever alguma coisa? Quando foi decidido que existiria um novo livro, tivemos uma reunião sobre o que gostaríamos que acontecesse. Mathew Prichard, o neto de Agatha, me perguntou se eu gostaria de mudar o personagem de alguma forma, talvez trazê-lo para o século XXI, dar uma namorada a ele, ou mudar algum outro detalhe qualquer. Eu não havia pensado nisso naquele momento, mas, uma vez que eu parei para refletir, cheguei à conclusão de que não, não gostaria de mudar nada. Gostaria apenas de um novo mistério do Poirot de sempre. Se você muda qualquer coisa no Poirot, ou em qualquer personagem de Agatha Christie, você acaba perdendo uma espécie de ingrediente mágico. Eu tinha certeza de que queria que o meu Poirot fosse o mesmo da Agatha. E, quando a família ouviu isso, eles ficaram aliviados, porque imagino que era o que eles queriam também.

Como se preparou para escrever? Releu os livros? Sim, eu reli todos os livros do Poirot, foi minha lição de casa. Foi muito divertido, porque Agatha Christie é minha escritora de romances de detetive favorita. Então senti que estava escrevendo sobre uma pessoa que eu conhecia muito bem. Levei cerca de dez meses desde o começo até o final, três ou quatro desses meses eu passei fazendo o primeiro rascunho. Depois editei e fiz pequenas mudanças.

A morte de Poirot chocou muitos fãs em 1975. Você ainda era muito nova quando isso aconteceu. Porém, quando ficou sabendo, mais tarde, que o personagem morria, o que sentiu? Eu tinha quatro anos quando ele morreu e quando fiquei mais velha não li Cai o Pano, o livro em que isso acontece. Eu sabia que era o último, não queria ler a história em que ele morreria. Foi o único do Poirot que eu não li. Mas meu livro não o traz de volta, não queria desfazer nada que a Agatha tinha feito. Eu fiz a história se passar em 1929, porque houve uma época, entre 1928 e 1932, que a Agatha não escreveu nenhum livro do Poirot. Então foi um período muito conveniente para se estabelecer o romance.

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Como Os Crimes do Monograma foi recebido pelos fãs de Agatha Christie? Ouviu reclamações? Sempre vai haver o fã que acha que é um sacrilégio passar um personagem para outro autor. Há um rapaz chamado Troy, de Minnesota, Estados Unidos, que constantemente fala no Twitter comigo, dizendo que é um absurdo, questionando como eu fui capaz de fazer isso. Mas, no geral, eu diria que 90% dos fãs que me deram um retorno estão felizes com o fato de haver um novo livro de Poirot. Muitas pessoas dizem que elas amaram, as críticas nos jornais foram generosas e o que mais importa pra mim é que alguns me escreveram para dizer que ficaram preocupadas quando souberam que haveria um novo romance, mas, depois que leram, amaram o livro.

Os seus romances de detetive já foram comparados aos de Patricia Highsmith e, mais recentemente, aos de Gillian Flynn. O que acha dessa comparação? Concordo no sentido de que nós escrevemos thrillers psicológicos que são meio obscuros. Mas diria que as duas são muito diferentes entre si e eu sou muito diferente delas. Acho que escrevemos dentro do mesmo gênero, mas não livros parecidos. É muito difícil para autores serem objetivos sobre seus próprios livros, então vou falar o que acho diferente entre os romances de Patricia e Gillian. Sinto que a segunda tem enredos muito mais intrincados e com reviravoltas e mistérios, enquanto os enredos de Patricia têm menos viradas chocantes, ela está mais interessada na psicologia, o desenvolvimento de seus romances é mais natural. No trabalho de Gillian dá para ver que ela é uma grande fã de Agatha Christie, o que não acontece no de Patricia.

Acha que o romance de detetive e de mistério é subestimado por críticos? Definitivamente sim. Há uma visão esnobe sobre o gênero porque é divertido e muitas pessoas gostam. Vende bem, então é visto como um gênero comercial. Diversos críticos literários não consideram que um bom livro de mistério e crime pode ser um trabalho sério de literatura. Mas não me sinto ofendida com isso, acho apenas que essas pessoas são bobas. Seria muito louco ficar ofendida cada vez que alguém tem uma ideia estúpida, porque a maior parte das pessoas têm ideias estúpidas o tempo todo (risos). É melhor deixar pra lá.

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Há outro romance de Poirot planejado? Quais são seus próximos projetos? Um novo romance de Poirot está em discussão no momento. Acho muito provável que tenha outro, sim, mas nada foi anunciado ainda. Por enquanto estou terminando o 10º livro da minha série de romances, que em inglês deve se chamar The Narrow Bed. Na Inglaterra está previsto para ser publicado em fevereiro de 2016.

 

 

 

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