Uma prioridade para o Brasil
Em esperado retorno à coluna, Davi Lago mostra que soberania nacional significa também domínio sobre o ciclo científico e tecnológico
As nações na ponta da inovação experimentam um novo salto tecnológico que inclui áreas como inteligência artificial, big data, robótica, biotecnologia, nanorrobótica, novas fontes de energia e computação quântica. Enquanto isso, o Brasil permanece aquém de seu potencial de inovação e progresso tecnológico. Infelizmente, os esforços brasileiros de modernização no século passado não priorizaram a inovação, mas o preenchimento de lacunas na infraestrutura nacional e nas cadeias produtivas da indústria. Isso significa que as dificuldades brasileiras no setor da inovação vão além das recorrentes crises econômicas e de investimentos. Há uma falta de visão, convicção e foco nos mecanismos de inovação tecnológicos para a construção do país. Neste início de século 21, a inércia e displicência das lideranças brasileiras em reposicionar e sintonizar a nação com a corrida tecnológica global poderá custar muito caro às novas gerações.
Mas o Brasil tem plenas condições de mudar este cenário. Ciência e tecnologia são baseadas na descoberta e na produção de conhecimento, movidas por criatividade, pesquisa e muito trabalho. Deste modo, o Brasil precisa fazer seus deveres de casa, ou seja, implementar ações exaustivamente apontadas pelos estudiosos do tema como, por exemplo: agilizar a concessão de propriedade intelectual, ampliar a internacionalização de empresas e universidades, intensificar a formação de profissionais qualificados, diversificar sua economia superando sua dependência dos produtos padronizados, incentivar a formação de novas indústrias e setores econômicos. Por fim, no longo prazo, concordamos com o tripé estratégico apresentado pelo Prof. Glauco Arbix do Observatório de Inovação da USP: agropecuária, energia e biodiversidade. O Brasil precisa adicionar muita tecnologia nas redes de agricultura e agropecuária, afinal, disputamos o posto de maior produtor mundial de alimentos; em seguida, o país tem condições de se tornar uma potência energética global: possuímos enorme mapa solar e eólico, reservas de petróleo que podem patrocinar a transição para uma economia de baixo carbono, e a competitividade do etanol; tanto os alimentos, como a energia, podem ser potencializados pela biodiversidade presente na Amazônia.
Não é difícil verificar que as linhas centrais de ação para o desenvolvimento tecnológico brasileiro são amplamente conhecidas. Infelizmente, ainda drenamos tempo e energia do debate público brasileiro em questões inócuas. Precisamos parar de tropeçar em nós mesmos. Nossos baixos indicadores de inovação demonstram que podemos perder, mais uma vez, uma oportunidade histórica, como ocorreu com a onda da microeletrônica nos anos 1970-80. Devido ao seu papel estratégico nas sociedades contemporâneas, ciência, tecnologia e inovação, ao lado da educação, são áreas de atenção prioritárias para o desenvolvimento socioeconômico do país, como orienta a própria Constituição Federal de 1988. Sem ciência não há inovação, sem inovação não há desenvolvimento. Soberania nacional significa também domínio sobre o ciclo científico e tecnológico.
*Davi Lago é professor, coordenador de pesquisa no LABÔ/PUC-SP e doutorando em Filosofia e Teoria do Direito pela Faculdade de Direito da USP – Largo do São Francisco