Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Imagem Blog

Matheus Leitão

Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
Continua após publicidade

Por que o STJ não tem a cara do povo brasileiro

'Tradição' inconstitucional reforça racismo e sexismo institucionais no Superior Tribunal de Justiça, que não se envergonha de perpetuar desigualdades

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 20 jun 2024, 13h42 - Publicado em 20 jun 2024, 13h03

O Superior Tribunal de Justiça, um dos mais importantes órgãos do Poder Judiciário brasileiro, tem como principal função garantir uniformidade à interpretação da legislação federal. Instituída pela Constituição de 1988, a corte também é conhecida como “Tribunal da Cidadania”. Apesar do simbólico apelido, o STJ está longe de ter a cara do povo brasileiro.

Ao longo dos seus 35 anos de existência, dos 103 ministros e ministras que passaram pelo tribunal, apenas nove foram mulheres (brancas) e duas, pessoas negras (homens). Assim como no Supremo Tribunal Federal, nunca tivemos uma mulher negra no STJ.

Ainda que mais evidente nas instâncias superiores, a falta de representatividade negra e feminina no sistema de justiça é uma realidade incontestável no Brasil. Segundo dados do 2º Censo do Poder Judiciário (2023), publicados pelo Conselho Nacional de Justiça, apenas 15% da magistratura brasileira é formada por pessoas negras que, em contrapartida, compõem a maioria absoluta da população brasileira (55,5%). Mulheres negras não chegam a 6% do Poder Judiciário, embora representem o maior segmento social do país (28%).

Se depender da histórica postura do Superior Tribunal de Justiça, seu retrato branco e masculino permanecerá intacto. É o que aponta o Coletivo MP Transforma no manifesto “Por representatividade negra e feminina no STJ”, cujo teor foi remetido por meio de ofícios a todos/as os/as Ministros/as da corte superior.

A composição do STJ é estabelecida pelo artigo 104 da Constituição Federal, segundo o qual o tribunal é composto de, no mínimo, 33 ministros, que são nomeados pelo presidente da República entre brasileiros com mais de 35 anos e menos de 70 anos, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. Um terço das vagas é atribuído, em partes iguais, a advogados e membros do Ministério Público, alternadamente, indicados na forma do artigo 94 da Constituição, que, por sua vez, estabelece como requisitos mais de dez anos de carreira (para membros do MP) e reputação ilibada, notório saber jurídico e mais de dez anos de efetiva atividade profissional (para advogados/as).

O rol de requisitos estabelecidos pela Constituição Federal é, portanto, taxativo, o que torna a exigência de qualquer outro requisito inconstitucional. Ainda assim, a corte jamais indicou para compor sua lista tríplice membros do Ministério Público do primeiro grau (Procuradores/as da República ou Promotores/as de Justiça). Os próprios ministros e ministras  do STJ afirmam explicitamente que não escolhem para formar a lista tríplice membros do Ministério Público que não atuem no segundo grau de jurisdição.

Continua após a publicidade

Além de inconstitucional, o mencionado “acordo de cavalheiros” reproduz racismo e sexismo institucionais, reduzindo significativamente o número de mulheres e de pessoas negras na disputa. Estudos realizados pelo Conselho Nacional do Ministério Público demonstram que o MP brasileiro possui em sua composição 40,54% de mulheres e apenas 15,8% de pessoas negras. Destas, somente 5,4% são mulheres negras. Na segunda instância, a representatividade negra e feminina, em especial de mulheres negras, reduz-se drasticamente.

Essa informação é confirmada pelo próprio perfil dos candidatos e candidatas que compõem a lista do Ministério Público – cujos nomes já foram aprovados por suas instituições por preencherem todos os requisitos constitucionais. Das 41 pessoas inscritas, 13 são mulheres, sendo oito atuantes no primeiro grau; três são pessoas negras, todas atuando no primeiro grau; dentre estas últimas, há apenas uma mulher negra. Ou seja, se mantido o inconstitucional apego à hierarquia, todas as poucas pessoas negras candidatas serão terminantemente excluídas da lista, sem qualquer análise sobre suas trajetórias profissionais e acadêmicas e possíveis contribuições para o aprimoramento da justiça brasileira.

A infundada exigência ainda cria desigualdade entre membros do Ministério Público e advogados, já que para a advocacia a corte tem observado rigorosamente os requisitos elencados na Constituição, mesmo porque para essa categoria não há divisão da atuação em instâncias de primeiro e segundo grau.

O tal critério tácito de atuação no segundo grau– que não está escrito em nenhuma norma constitucional, legal ou regimental – não passa de mera tradição, sem qualquer fundamento no ordenamento jurídico, e mantém o caráter elitista e conservador do tribunal. Desse modo, o STJ, como boa parte dos tribunais superiores no Brasil,mmantém-se como espaço hegemônico de homens brancos. Atualmente, a corte superior conta com 31 integrantes, sendo apenas cinco mulheres e dois homens negros.

Continua após a publicidade

No momento, há duas vagas a serem preenchidas a partir da formação de listas tríplices: uma para candidatos/as oriundos/as de TRFs e outra, do MP. Em reunião realizada nesta semana, os ministros e ministras do STJ definiram que a votação será eletrônica, mas ainda não há data prevista para a respectiva sessão.

A coluna e parte do país espera que, por ocasião da votação, o STJ assuma postura condizente com o compromisso pela igualdade e diversidade da nossa “Constituição Cidadã” – principal símbolo do processo de redemocratização nacional –, avançando na necessária política de paridade de raça e gênero em sua composição. Se todo poder emana do povo, que a justiça brasileira seja espaço representativo de todo o povo brasileiro e não apenas de uma elite branca e masculina.

O QUE NÃO DISSE O STJ

O leitor assíduo da coluna deve estar estranhando o intertítulo, mas este espaço procurou o Superior Tribunal de Justiça com cinco perguntas sobre o tema tratado acima. Após 48 horas de espera, não obteve respostas. A corte ignorou todas elas. Leia abaixo os questionamentos enviados à corte, que STJ negou responder à imprensa, à sociedade brasileira e ao país.

A composição do STJ é estabelecida pelo artigo 104 da Constituição Federal, segundo o qual o tribunal é composto de, no mínimo, 33 Ministros, que são nomeados pelo Presidente da República entre brasileiros com mais de 35 anos e menos de 70 anos, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. Um terço das vagas é atribuído, em partes iguais, a advogados e membros do Ministério Público, alternadamente, indicados na forma do artigo 94 da Constituição, que, por sua vez, estabelece como requisitos mais de 10 anos de carreira (para membros do MP) e reputação ilibada, notório saber jurídico e mais de 10 anos de efetiva atividade profissional (para advogados). 

Continua após a publicidade

O rol de requisitos estabelecidos pela Constituição Federal é, portanto, taxativo, o que torna a exigência de qualquer outro requisito inconstitucional. Ainda assim, o STJ jamais indicou para compor a lista tríplice membros do Ministério Público do primeiro grau (Procurador/a da República ou Promotor/a de Justiça). Os/as próprios/as Ministros/as do STJ afirmam explicitamente que não escolhem para formar a lista tríplice membros do Ministério Público que não atuem no segundo grau de jurisdição.

1) Por que o Superior Tribunal de Justiça – importante guardião das normas constitucionais – mantém essa exigência, agregando um requisito que não está previsto quer na Constituição quer em qualquer outro ato normativo? Qual o fundamento jurídico para a manutenção dessa “tradição”?

2) Segundo dados do Conselho Nacional do Ministério Público, mulheres representam 39,1% do Ministério Público Brasileiro e pessoas negras apenas 15,8%. No segundo grau de jurisdição, esses números caem. Desse modo, esse tipo de norma tácita para escolha de membros do MP para a lista tríplice, além de violar a Constituição, não se configura como uma espécie de cláusula que perpetua racismo e sexismo institucionais?

3) Quantas mulheres já compuseram o Superior Tribunal de Justiça em toda a existência da corte? Quantas mulheres são Ministras do STJ atualmente? Quantas delas foram/são negras?

Continua após a publicidade

4) Quantas pessoas negras já compuseram o Superior Tribunal de Justiça em toda a existência da corte? Quantas pessoas negras são Ministros/as do STJ atualmente?

5) O Conselho Nacional de Justiça tem adotado a diversidade como importante questão institucional, aprovando protocolos de julgamento com perspectiva de raça e gênero e políticas de ações afirmativas para mulheres e pessoas negras. Como o Superior Tribunal de Justiça tem atuado para avançar na necessária paridade de raça e gênero na sua composição?

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

Apenas 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

a partir de 35,60/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.