O novo fogo amigo no governo Lula, agora na Cultura
Depois da Casa Civil, ministério da Fazenda, ministério da Justiça e ministério do Meio Ambiente, problemas "entre aliados" atingem outra pasta
O ministério da Cultura foi uma das pastas que mais sofreu no governo Bolsonaro. Isso não é negado por ninguém. O líder da extrema-direita brasileira extinguiu o ministério em um de seus primeiros atos como presidente, e cortou verbas que fomentavam a cultura Brasil afora. A terra arrasada se concretizou quando o secretário indicado pelo ex-presidente fez pronunciamentos com trechos de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda Nazista de Adolf Hitler.
Agora, com a tentativa de reconstrução do ministério liderada por Margareth Menezes – respeitada artista do meio cultural – há muito o que ser feito e todos no setor concordam.
O que não há concordância é na forma de se fazer as coisas, mesmo oito meses após a posse de Lula – especialmente no que diz respeito à atuação de parlamentares da base governista no Congresso.
Segundo a coluna apurou, há um “ataque sistemático” vindo da Câmara contra a ministra, sem um motivo aparente. Parte da classe artística anda incomodada, por exemplo, com a postura de algumas lideranças de esquerda com histórico de atuação no segmento. Uma delas é a deputada Jandira Feghali.
Há reclamações de que a parlamentar esteja minando os esforços de Margareth, que tem avançado em temas caros ao setor nessa retomada de ações estruturantes do Ministério da Cultura.
Na lista das ações que desagradaram está a atuação de Feghali em Projetos de Lei enviados pelo governo ou propostas por colegas do próprio Congresso (Leia ao final da coluna o que diz a deputada sobre as informações).
O PL 4172/2023, por exemplo, foi enviado pela Casa Civil – no âmbito do PAC – com importantes ganhos para a Cultura, caso dos Centro de Artes e Esportes Unificados e do Programa Cultura Viva.
Consultada antes do envio do projeto ao Congresso, a deputada concordou com a estrutura geral do PL. Depois, com ele já no parlamento, pediu alterações e, para surpresa do Palácio, criticou – em grupos reservados – a atuação do Ministério da Cultura.
Imputou à pasta toda a responsabilidade na construção do texto sem levar em conta que as medidas passaram pela Presidência.
Outro movimento considerado ruim surgiu durante a tramitação do PL 3696/2023 que trata das “cotas de telas” – mecanismo que obriga a exibição de um mínimo de obras nacionais na televisão e no cinema.
De autoria do senador Randolfe Rodrigues, o PL originalmente propunha a renovação da cota nas TVs pagas e a recriação da mesma ferramenta cultural para os filmes, esta vencida desde o governo Bolsonaro.
O imbróglio, ainda não resolvido, exige paciência.
O governo fez um acordo para primeiro equacionar a questão das TVs pagas, já que elas também podem vencer este mês. Mas Jandira causou novo desconforto após assumir a relatoria do PL na Câmara.
Segundo informações repassadas à coluna, a deputada anunciou ao grupo das 11 maiores associações de produtores independentes do país que vai retomar a cota no cinema em seu relatório. Isso consequentemente fará com que o projeto seja rediscutido no Senado.
Também anunciou – ao mesmo grupo de produtores – que vai criar um grupo de trabalho dentro do governo, envolvendo três pastas, mas sem fazer a questão da participação do ministério da Cultura. Se a ideia é tratar do audiovisual como indústria, não faz muito sentido alijar a principal pasta. Como a coluna mostrou, o setor tem ajudado cada vez mais o crescimento do PIB.
Há outras reclamações contra a parlamentar listadas a este espaço.
Preocupada e atenta, a classe artística tem se mobilizado agora para tentar dirimir as arestas e renovar o apoio a Margareth, em meio a essas bolas divididas com o parlamento, vistas como “fogo amigo”.
A ministra, inclusive, pretende soltar um vídeo institucional no qual lista os avanços de sua gestão, como resposta a esses movimentos contrários de quem ela não esperava.
Uma área tão importante – e que foi massacrada recentemente – dificilmente será reorganizada com desunião. Os agentes da cultura como um todo precisam focar apenas na reconstrução do setor após os retrocessos dos últimos anos.
(Atualização: A coluna procurou a deputada Jandira Feghali. Ela afirmou que “Nunca houve de sua parte nenhum ataque ao Ministério da Cultura. Ao contrário, só houve apoio até aqui, só apoio orçamentário, político e de sustentação”. A parlamentar ainda acrescentou que, “de fato, houve uma discordância do texto que foi encaminhado ao congresso, em relação aos 30% da Lei Aldir Blanc 2”. “Estou conversando com a relatora e com o próprio governo sobre a reconstrução do texto para poder favorecer uma política correta para a sociedade brasileira e para a cultura brasileira. No áudio visual, não há nenhum problema comigo. Eu fui encaminhada a fazer um relatório acordado com a presença da SAV [Secretaria do Audio Visual do Ministério], junto com todas as entidades do setor para poder retomar a cota de tela nos cinemas. Mas já estou tentando fazer as duas coisas de forma simultânea para não atrasar o alongamento do prazo na TV paga”, disse.)