Após avanço de caso Mariana, agora peruanos processam Repsol na Holanda
Ação segue estratégia usada no Reino Unido, onde mais de 620 mil brasileiros afetados pelo desastre de Mariana processam a mineradora BHP

O Tribunal Distrital de Haia, na Holanda, realizou no último dia 9 uma audiência para decidir se tem jurisdição para julgar uma ação contra a petroleira Repsol, acusada de causar o maior desastre ambiental da história recente do Peru. A decisão, que deve sair nas próximas seis semanas, pode abrir caminho para um novo julgamento internacional de grandes proporções, nos moldes do processo movido por vítimas do rompimento da barragem de Mariana (MG) no Reino Unido.
No centro da disputa está o vazamento de até 12 mil barris de petróleo no Oceano Pacífico, em janeiro de 2022, durante o descarregamento de um navio-tanque na refinaria La Pampilla, operada pela Repsol em Ventanilla, no Peru. O acidente contaminou 106 quilômetros de litoral, afetou 21 praias e matou milhares de animais marinhos. Cerca de 50 mil vítimas exigem US$ 1 bilhão em indenizações.
A ação judicial é movida pelos escritórios Pogust Goodhead, que também atua no caso Mariana, e Lemstra Van der Korst (LVDK), da Holanda. Os advogados usam estratégia baseada nas diretrizes da União Europeia que permitem responsabilizar empresas-mãe por falhas de suas subsidiárias.
Durante a audiência, a SEFR (Stichting Environmental and Fundamental Rights), uma fundação holandesa sem fins lucrativos que representa as vítimas argumentou que a Repsol NL exercia controle direto sobre as operações da refinaria onde ocorreu o derramamento. Eles alegaram que a Repsol NL sabia, ou deveria saber, sobre as falhas que causaram o desastre.
A Repsol atribuiu inicialmente o derramamento a ondas anômalas provocadas pela erupção do vulcão Hunga Tonga, em Tonga. Depois, jogou a responsabilidade sobre o navio-tanque. O governo peruano declarou emergência ambiental, aplicou multas — contestadas pela Repsol — e criticou a lentidão na resposta à crise.
Do Brasil ao Peru: mesma luta por justiça
O CEO do Pogust Goodhead, Tom Goodhead, afirmou que semelhanças entre o caso peruano e o brasileiro. “Assim como em Mariana, estamos diante de um desastre socioambiental devastador que permanece sem a devida reparação. Os danos continuam e, em muitos casos, se agravam com o tempo. As comunidades afetadas estão pagando um preço altíssimo por falhas corporativas”, declarou.
A maioria das vítimas peruanas, segundo a ação, ainda não recebeu compensações justas. As poucas indenizações pagas teriam sido feitas sob pressão e cobrem apenas uma fração das perdas. A Repsol diz ter reservado US$ 270 milhões para ações de compensação e afirma que “a maioria das vítimas foi indenizada”, mas os advogados contestam a versão e afirmam que há um número crescente de atingidos em situação de vulnerabilidade.
Entre os prejudicados estão pescadores artesanais, comerciantes, trabalhadores de turismo e banhistas, muitos dos quais perderam sua fonte de renda de forma abrupta. Aproximadamente 34 mil pessoas aderiram à ação em 2023, e outras 15 mil se juntaram em 2024, com base em danos contínuos.
Já o caso Mariana, maior desastre ambiental do Brasil, transformou-se em um dos maiores litigíos da história da corte inglesa e está em fase de decisão sobre a responsabilidade da mineradora BHP pelo desastre. O veredito deve sair em meados deste ano. “O julgamento de Mariana pode criar um importante precedente internacional na busca por justiça aos atingidos, além de mandar um recado para multinacionais que cometem más-práticas ao redor do mundo: ficou para trás o tempo em que era possível se esconder atrás de intrincadas estruturas corporativas para evitar a devida responsabilização”, afirma Goodhead.