Por que aliados de Lula veem Pacheco como ‘contenção’ ao ‘trator’ Lira
Presidente tem sido estimulado a se aproximar ainda mais do presidente do Senado, aliado estratégico em contraponto ao chefe da Câmara

Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), têm perfis de atuação política notoriamente muito distintos. Enquanto Lira não raro é descrito por aliados e adversários como um “trator”, Pacheco é adepto da “política à mineira” e os seus preceitos de conciliação e discrição. Como mostra reportagem de VEJA desta semana, as diferenças entre eles transbordam, consequentemente, às relações de cada um com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Neste sentido, não se ouve de Pacheco críticas públicas à recorrentemente desancada — não só por Lira — articulação de Lula com o Congresso. O mineiro tampouco tem histórico de proximidade com o bolsonarismo como Arthur Lira, que foi o grande fiador do governo anterior e, literalmente, vestiu a camisa do ex-presidente na campanha de 2022. Os posicionamentos fazem Pacheco ser visto no entorno de Lula como um aliado valioso, de quem o presidente deve se aproximar mais para criar um freio a Lira. “É a oportunidade de o presidente fazer uma contenção no Senado”, diz um cacique da Casa.
O presidente deve ao mineiro uma boa parte do ambiente que tem no Senado. Na última semana, o advogado Cristiano Zanin Martins, que defendeu Lula nos processos da Lava-Jato, percorreu os corredores do Senado em busca de apoio para ser confirmado ministro do Supremo Tribunal Federal. Foi bem recebido por praticamente todos os partidos e tem a aprovação dada como quase certa. O “beija-mão” oficial começou na segunda-feira 12, com uma visita a Pacheco, que o recebeu ao lado de Davi Alcolumbre (União-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, órgão a quem compete inquirir os indicados ao STF. Conseguiu de imediato a confirmação da sua sabatina para o dia 21 de junho. Comparados aos quatro meses que teve de esperar o ministro André Mendonça, apoiado por Jair Bolsonaro, os onze dias entre a indicação e o anúncio da data da arguição dão a medida da boa vontade que o Senado tem com Lula — e esse nem foi um caso isolado.
Antes, Pacheco atuou em sincronia com o governo em relação à CPMI dos atos golpistas, destravando a sua instalação só depois que o Planalto passou a admiti-la e atuando para que o colegiado tivesse maioria governista. Mais recentemente, as votações da medida provisória que definiu a estrutura de ministérios escancaram mais ainda diferenças com Lira. Na noite de 31 de maio, com a MP prestes a caducar, o presidente da Câmara disse que os deputados não poderiam ser responsabilizados caso o texto fosse rejeitado ou nem levado à votação. A culpa, declarou, recairia sobre a falta de articulação política do Executivo. “Vamos conversar e sentir se a Câmara dará mais uma vez o crédito ao governo”, afirmou. A MP foi aprovada horas depois, já na madrugada de 1º de junho, dia em que perderia a validade.
Na Casa vizinha, o clima foi outro. Diante das incertezas, Pacheco se aprontou: suspendeu a sessão, ficou à espera da votação dos deputados e mostrou estar disposto a seguir noite adentro para garantir a Lula aquilo que, nas suas palavras, “é o DNA, é a essência do atual governo”. Sem sobressaltos, o texto foi aprovado pelos senadores no início da tarde de quinta, mesmo dia em que, com votações rápidas, chancelaram as MPs do Bolsa Família e do projeto de Lula que equipara salários de homens e mulheres em funções iguais.
Interesses do governo no Senado
Nas próximas semanas, a aliança com Pacheco, Alcolumbre e outros caciques do Senado vai ser colocada novamente à prova. Além da indicação de Zanin, serão analisados os decretos de Lula que alteraram o marco do saneamento básico (e que foram derrubados pela Câmara), o novo marco fiscal (já aprovado pelos deputados) e a indicação do secretário–executivo da Fazenda, Gabriel Galípolo, para a diretoria do Banco Central.
Outro tema espinhoso e de interesse do Planalto é o marco temporal para demarcações de terras indígenas, aprovado na Câmara em maio. Alvo de pressões da bancada ruralista e de governadores como Jorginho Mello (PL), de Santa Catarina, que foi a Pacheco pedir celeridade, o marco também está sob análise do STF. Por essa razão, e em acordo com lideranças governistas, Pacheco defendeu que o tema seja debatido pelos senadores sem “açodamento”.