Planos de saúde viram alvos de pedidos de CPI por cancelarem contratos
Somente a Amil notificou cerca de 30 mil beneficiários sobre decisão que afeta autistas e idosos, mas nega que decisão tenha relação com demandas médicas
As operadoras de planos de saúde entraram na mira de deputados, que pediram a criação de CPIs (Comissões Parlamentares de Inquéritos) por conta dos cancelamentos de milhares de contratos coletivos por adesão que atendiam, entre outros beneficiários, crianças autistas, idosos e pessoas com doenças raras. A movimentação foi impulsionada na esteira da decisão da Amil, quarta maior operadora de saúde do Brasil, com mais de 3,1 milhões de clientes, de cancelar cerca de 30 mil contratos desse tipo.
Com o apoio de 53 dos 94 parlamentares, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) recebeu um pedido de instalação de CPI na noite de terça-feira, 21. A autora é a deputada estadual Andrea Werner (PSB), que tem um filho autista e teve o mesmo diagnóstico de forma tardia no ano passado. O projeto de resolução apresentado tem como objetivo investigar eventuais irregularidades no cancelamento unilateral de planos de saúde de pessoas em tratamento, especialmente idosos e pessoas com deficiência.
Desde abril do ano passado, o gabinete da parlamentar, que preside a Comissão de Direitos das Pessoas com Deficiência da Alesp, já recebeu mais de 937 denúncias relativas a violações praticadas por operadoras de planos de saúde contra cidadãos paulistas e seus familiares. Nas últimas semanas, reclamações recebidas apontam o cancelamento de cerca de 200 cancelamentos de planos somente pela Amil. Elas se referem a idosos, crianças e adolescentes em tratamento. Até mesmo famílias atingidas pelas enchentes no Rio Grande do Sul estão sendo comunicadas sobre o fim de seus planos, segundo a deputada. “Como as famílias vão procurar advogado e recorrer a tempo enquanto estão em abrigos”, questiona Andrea.
Em paralelo ao pedido de CPI, a Comissão da Pessoa com Deficiência da Alesp aprovou por unanimidade convite para que o presidente da Amil, José Seripieri Filho, seja ouvido no dia 28, às 15h. Ele comprou a empresa em dezembro do ano passado por cerca de 11 bilhões de reais, assumindo uma dívida aproximada de 9 bilhões. O empresário, no entanto, deve enviar um representante.
Câmara
Já na Câmara dos Deputados, a iniciativa de propor uma investigação sobre as operadoras de planos de saúde que têm cancelado contratos de forma unilateral é do deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ). O parlamentar também afirma ser necessário apurar como tem se dado a fiscalização da saúde suplementar pela ANS, responsável pelo serviço. “Essas pessoas que estão perdendo seus planos vão recorrer à rede pública”, ressalta, defendendo que a Câmara tome posição sobre o tema. Para que a comissão seja instalada ao menos 171 deputados devem assinar o pedido.
A partir do ano passado, houve um salto no número de queixas por cancelamento unilateral registradas na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Segundo o órgão, entre janeiro e abril deste ano, foram feitas 5.888 reclamações, um crescimento de 30,9% em relação ao mesmo período do ano passado. Em todo o ano de 2023, foram contabilizadas 15.279 reclamações. Em 2022, foram 11.096.
Liminar
Na noite de terça, 21, uma liminar judicial obtida em ação movida pelo deputado distrital Eduardo Pedrosa (União Brasil-DF), em conjunto com o Movimento Orgulho Autista Brasil (MOAB) e o Instituto Pedro Araujo dos Santos (Instituto PAS), passa a impedir o cancelamento dos planos de saúde de pessoas autistas, com doenças raras e paralisia cerebral, com exceção apenas de casos comprovados de inadimplência. O descumprimento acarretará multa diária de 59.000 reais às operadoras.
“Essa decisão é marco na luta pela garantia dos direitos e da dignidade das pessoas com TEA (Transtorno do Espectro Autista) e suas famílias. A liminar será válida em todo Brasil e restabelece o direito de muitas pessoas que foram injustiçadas pelos planos de saúde”, comemora o deputado.
Outro lado
Em nota, a Amil lamenta os transtornos causados pelos cancelamentos, mas afirma que eles “correspondem a apenas 1% dos beneficiários cobertos” e que se justificam pelo desequilíbrio extremo entre receita e despesa que representam. “Enfatizamos que a medida não tem nenhuma relação com demandas médicas ou quaisquer tratamentos específicos, uma vez que mais de 98% das pessoas envolvidas não estão internadas ou submetidas a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física”, declarou a Amil, que diz atender 10 mil pessoas do espectro autista.