PL das Fake News tem de fugir de ‘extremos’, diz secretário do governo
João Brant, responsável por Políticas Digitais na Secretaria de Comunicação, avalia ser necessário equilíbrio ao atribuir responsabilidades às plataformas

Prestes a ser votado na Câmara dos Deputados, após três anos de tramitação na Casa, o projeto de lei 2.630/2020, que ficou conhecido como PL das Fake News, para regulamentar as redes sociais e o ambiente digital no país contou com alguns impulsos para enfim deslanchar e ir à pauta dos deputados, como mostra a reportagem de capa de VEJA desta semana.
A mudança do viés do governo, de Jair Bolsonaro, contrário à regulação, a Luiz Inácio Lula da Silva, favorável, se somou a acontecimentos importantes e que tiveram nas redes sociais pontos decisivos: o quebra-quebra golpista de 8 de janeiro em Brasília e os recentes ataques dentro de ambientes escolares. A simpatia do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pelo texto também foi estratégica, de modo que ele atuou ativamente pela aprovação da urgência ao projeto, que permitiu ao texto “cortar caminho” na Casa e ir direto ao plenário, na próxima terça, 2.
O apoio do governo Lula ao texto do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto, foi traduzido por meio de uma minuta com sugestões de medidas, coordenada pela Casa Civil, com participações da Secretaria de Comunicação e os ministérios da Justiça, Cultura, Direitos Humanos e Ciência e Tecnologia. Secretário de Políticas Digitais da Secom, João Brant avalia que, apesar da gritaria das big techs e da oposição, em especial a bolsonarista, o atual contexto e os acontecimentos recentes evidenciaram à sociedade a necessidade de que “as regras do mundo offline sejam válidas e bem aplicadas no mundo online”.
“É preciso garantir que haja uma maior responsabilidade das plataformas. Não podemos ter um regime em que o incentivo é que elas não façam nada. Sabemos que elas atuam em moderação, alguns processos de proteção de direitos, mas achamos que elas podem ir além”, disse Brant a VEJA. “Temos que fugir de dois extremos: um é o da não-responsabilidade das plataformas sobre o conteúdo, que ocorre hoje; o outro é o da responsabilidade total, que geraria uma remoção em massa de conteúdo”, completa o secretário da pasta comandada pelo ministro Paulo Pimenta.
Um dos pontos mais criticados pela oposição, incluído entre as sugestões do governo ao relator e mantido por ele no texto, é o chamado “dever de cuidado”, por meio do qual os provedores devem atuar, quando notificados, a respeito de conteúdos potencialmente ilegais, a exemplo de crimes contra a democracia, atos de terrorismo, instigação ao suicídio e delitos contra crianças e adolescentes. Na ótica da oposição, o dispositivo levaria à censura prévia.
Para Brant, trata-se de incluir caráter preventivo na atuação das plataformas. “Quando colocamos o dever de que conteúdos que são ilegais offline sejam tratados como ilegais online, tentamos garantir que o ordenamento jurídico brasileiro permaneça no ambiente digital também. Não vejo risco de censura”, avalia.
Outra medida polêmica sugerida pelo governo, a de criar uma “entidade autônoma de supervisão”, que fiscalizaria o cumprimento da lei pelas plataformas — e não os conteúdos veiculados nelas –, também amplamente criticada pela oposição, acabou ficando de fora do texto final de Orlando Silva, por falta de apoio dos líderes na Câmara.
Diante dos avanços da regulação do meio digital no exterior, sobretudo na União Europeia, onde desde novembro está em vigor o Digital Services Act, o secretário de Políticas Digitais diz que o caminho do Brasil ficou facilitado. “A aprovação de um marco de referência na Europa facilita muito a conversa, aponta um rumo e nos coloca em condição de avançar no sentido de que, se as empresas podem seguir as regras por lá, podem seguir aqui também”.