EUA: republicanos e democratas divergem sobre ‘censura’ no Brasil
Assistido por deputados bolsonaristas, Chris Smith falou de ‘graves violações’; Susan Wild rebateu dizendo que brasileiros têm ‘democracia vibrante e forte’
Uma comitiva de parlamentares bolsonaristas brasileiros participou nesta terça-feira, 7, de uma audiência no Congresso Americano, em Washington, para discutir o que classificam de “ataques contra a liberdade de expressão no Brasil”. Entre os integrantes, estavam os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Nikolas Ferreira (PL-MG), Gustavo Gayer (PL-GO), Bia Kicis (PL-DF) e Filipe Barros (PL-PR).
O encontro, sediado em um dos subcomitês da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, vem na esteira do relatório divulgado em abril pela ala republicana da Comissão Judiciária da Câmara de Representantes dos Estados Unidos. O documento reuniu uma série de decisões sigilosas do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes para derrubar ou suspender perfis no X (antigo Twitter). Com 540 páginas, a publicação reuniu manifestações de deputados que classificaram Moraes como “ditador”, mencionando a investigação determinada pelo ministro contra Elon Musk, dono do X, e elogiando a postura do bilionário por “se recusar a acatar os pedidos de censura do STF. A sessão também se dá um dia após a Câmara dos Estados Unidos ter enviado à Organização dos Estados Americanos (OEA) um pedido de informações sobre denúncias a respeito de “censura”, “violação à liberdade de expressão” e “abusos de autoridade” no Brasil (Leia no final da matéria).
A audiência desta terça-feira, 7, foi presidida pelo deputado republicano Chris Smith, presidente do comitê e um dos mais antigos congressistas americanos — ele está em seu 21º mandato pelo estado de Nova Jersey. Smith é um dos principais porta-vozes do bolsonarismo junto à direita americana. Em março, ele já havia tentado realizar uma audiência para tratar do mesmo tema — o “cerceamento” da liberdade de expressão no Brasil –, desta vez na Comissão Tom Lantos de Direitos Humanos, mas o encontro acabou sendo postergado após a intervenção de um parlamentar democrata. Na ocasião, Smith organizou uma coletiva de imprensa com parlamentares brasileiros, entre eles Eduardo Bolsonaro, para denunciar a medida.
Veja alguns dos depoentes:
- Michael Shellenberger, jornalista responsável pelo chamado ‘Twitter Files’
- Chris Pavlovski, CEO do Rumble (concorrente do YouTube)
- Fabio de Sá e Silva, jornalista brasileiro
- Paulo Figueiredo, jornalista brasileiro, neto do ditador João Figueiredo, último presidente da ditadura militar
https://x.com/BolsonaroSP/status/1787873293283823906
https://x.com/filipebarrost/status/1787850603642695789
O que foi dito
O deputado Chris Smith abriu os trabalhos da audiência dizendo que, desde o final de 2022, os brasileiros têm sido alvo de “graves violações de direitos humanos cometidas por autoridades brasileiras em larga escala”.
“As violações incluem o abuso político de procedimentos legais para perseguir a oposição política, incluindo a prisão de figuras da oposição sob acusações espúrias, violações da liberdade de expressão e da liberdade dos meios de comunicação, perseguição de jornalistas, silenciamento da mídia de oposição, banindo indivíduos das redes sociais, leis de censura veladas alegando o combate à desinformação e muitas violações do Estado de Direito”, declarou.
O congressista disse, ainda, que as supostas violações foram realizadas com o auxílio do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que atua como um “Ministério da Verdade” — em alusão à distopia 1984, de George Orwell –, numa pretensa tentativa de combater a desinformação. “De fato, a repressão é em grande parte feita por um homem, o ministro Alexandre de Moraes”, disse Smith.
CEO do Rumble, Chris Pavlovski afirmou que os direitos fundamentais de liberdade de expressão estão “sob risco” e que a plataforma recebeu pedidos do governo brasileiro para remoção de perfis que não infringiam as normas da plataforma. O Rumble deixou o Brasil em dezembro do ano passado, após discordâncias com a Justiça brasileira
“Por anos, nós vimos plataformas fazerem o shadowban [‘banimento fantasma’] de ideias com as quais não concordavam, em uma supressão sutil de opiniões que não estavam na norma. Hoje, a censura que vemos é muito mais perversa”, afirmou. “Governos estão pedindo abertamente que plataformas censurem e derrubem conteúdos que não são favoráveis (…). O Rumble tem guidelines de conteúdo. Recebemos pedidos do governo brasileiro para bloquear certos criadores de nossa plataforma e novamente o conteúdo não violava nossos termos e condições, mas eram de opiniões não populares no Brasil na época”, declarou.
Oposição democrata
Apesar da ofensiva republicana, parlamentares democratas que também integram o comitê que sediou a audiência se posicionaram contra o objeto do encontro, o qual classificaram como uma forma de “minar a democracia brasileira”. “A audiência que acredito que deveríamos ter deveria ser focada na relação bilateral EUA-Brasil, focada nas áreas de cooperação em trabalho, clima, em proteger a Amazônia, em combater a fome e em expandir o crescimento econômico sustentável, a estabilidade, a segurança e a paz pelo hemisfério”, declarou a deputada democrata Susan Wild.
“Ao invés de fortalecer nossa relação, uma audiência como essa só serve para minar essa relação. O Brasil é uma democracia vibrante e forte, com uma sociedade civil robusta e mídia robusta. E um sistema eleitoral que é considerado um dos mais seguros e rápidos do mundo”, afirmou, assinalando que debates sobre questões constitucionais e legais deveriam ser decididas pelo povo brasileiro e seus representantes eleitos, bem como o Judiciário. “O Congresso dos Estados Unidos não é o foro para isso”, disse.
Pedido à OEA
A Câmara dos Estados Unidos enviou na última segunda-feira, 6, um pedido de informações à Organização dos Estados Americanos (OEA) a respeito de “censura”, “violação à liberdade de expressão” e “abusos de autoridade” no Brasil. O documento foi assinado pelo deputado republicano Chris Smith e teve como motivação as decisões de Alexandre de Moraes que ordenaram o bloqueio e suspensão de perfis em redes sociais mantidos por acusados de envolvimento nos atos do 8 de janeiro de 2023, nas sedes dos Três Poderes, em Brasília.