Como o X burlou ordem do Supremo e voltou ao ar usando novo servidor
De acordo com especialista ouvido pela reportagem, é 'quase inconcebível' que gesto tenha ocorrido por acidente ou falha técnica
Suspenso no Brasil desde o dia 30 de agosto por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, o X, rede social do magnata Elon Musk, burlou a proibição e voltou a funcionar para milhares de usuários nesta quarta-feira, 18, usando um servidor chamado CloudFare, cujo bloqueio exige uma operação muito mais complexa e que pode derrubar outros serviços além da plataforma.
A rede social não está disponível para todos — apenas usuários de algumas localidades e provedores de internet conseguem entrar na plataforma, que opera com instabilidades. A Associação Brasileira dos Provedores de Internet (Abrint) divulgou uma nota nesta quarta (leia a íntegra abaixo) explicando que o X foi atualizado durante a madrugada, há cerca de 15 horas, e por isso os usuários que têm o aplicativo receberam a nova versão automaticamente.
Essa versão atualizada da plataforma usa o CloudFare, um servidor muito mais difícil de ser bloqueado. “Diferente do sistema anterior, que usava IPs específicos e passíveis de bloqueio, o novo sistema faz uso de IPs dinâmicos que mudam constantemente. Muitos desses IPs são compartilhados com outros serviços legítimos, como bancos e grandes plataformas de internet, tornando impossível bloquear um IP sem afetar outros serviços”, diz o comunicado do órgão.
De acordo com a associação, “bloquear o Cloudflare significaria bloquear não apenas o X, mas também uma série de outros serviços que dependem dessa infraestrutura, o que poderia afetar negativamente a internet como um todo”. Até o momento, a decisão de Moraes de 30 de agosto não foi modificada. Além dos recursos da Starlink — outra empresa de Musk —, a OAB e o partido Novo movem ações contra a medida.
“Gato e rato”
Para burlar o bloqueio imposto pelo STF, o X aposta em uma tecnologia conhecida como proxy reverso, oferecida pela empresa CloudFlare. O serviço permite “redirecionar” a conexão a um site para uma versão hospedada em outro computador, e é normalmente utilizado para melhorar a experiência de usuários que acessam um site fora de seu país de origem.
Na prática, a migração para o CloudFlare possibilita “mascarar” o endereço de uma página e furar o bloqueio — o processo é semelhante ao uso de uma VPN (rede virtual privada, na sigla em inglês), mas a identidade é alterada a partir do site de destino, e não do computador ou celular do usuário.
Segundo especialistas, a manobra dificulta que as operadoras de internet brasileiras mantenham o bloqueio ordenado pela Anatel a partir da ordem de Moraes, já que o CloudFlare altera automaticamente os endereços de um site quando uma conexão falha. “Funciona como um jogo de gato e rato, Em termos simples, o serviço torna praticamente impossível descobrir ‘onde está’ o X para restringir o acesso”, explica Sérgio Ribeiro, gerente de infraestrutura e segurança do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD).
Ainda de acordo com o pesquisador, embora o X não tenha comunicado oficialmente a migração do tráfego para as redes do CloudFlare, é quase inconcebível que a mudança tenha acontecido por acidente ou falha técnica.
Leia a nota oficial da Abrint
“A Abrint reforça que os provedores regionais, que representam mais de 53% do mercado de banda larga no Brasil, estão em uma posição delicada e, por isso, orienta que as empresas não tomem medidas individuais até que haja uma orientação oficial da Anatel. Um bloqueio inadequado poderia impactar negativamente empresas e serviços essenciais, prejudicando milhares de usuários.
A Abrint permanece em contato com a Anatel e aguarda as análises técnicas que estão sendo realizadas. A associação continuará informando seus associados e o público sobre qualquer atualização relevante que venha a ser divulgada.”